O derramamento de 26 toneladas de bolas de polímero sintético na costa da Galiza provocou uma “maré de plástico”. Mais de duas décadas depois do desastre ambiental com o navio Prestige, a poluição marítima levou o Parlamento Europeu (PE) a agendar um debate de emergência para esta quinta-feira sobre uma proposta relativa a este microplástico, o terceiro mais comum, depois dos pneus e das tintas, segundo a Agência Europeia das Substâncias Químicas.
“É impossível não ficar sensibilizado por aquele acontecimento, ainda por cima, 21 anos depois do ‘Prestige’, portanto, os galegos estão a ver isto de uma forma um pouco quase pós-traumática”, descreve João Albuquerque, eurodeputado do PS e relator principal da proposta do PE sobre este tema.
Em 2002, o navio Prestige, que transportava 77 mil toneladas de combustível, sofreu um rombo no casco, o que provocou o naufrágio ao largo da costa galega. Derramou mais de 63 mil toneladas de combustível ao longo de três mil quilómetros da costa espanhola, portuguesa e francesa. O setor da pesca na Galiza sofreu perdas de mais de 22 milhões de euros e cerca de 115 mil aves marinhas faleceram.
Agora a enfrentar um novo desastre ambiental, esta situação na Galiza demonstra que “todos os esforços que temos de fazer, neste momento, para tratar do problema das ‘pellets’ têm que ser colocados na prevenção”, diz o eurodeputado. O objetivo é o de alterar as práticas dos operadores, produtores e transportadores relativamente a este material, com um a cinco milímetros de diâmetro.
A prevenção deverá acontecer no início da cadeia de produção com a implementação da certificação dos procedimentos das empresas por uma entidade externa para garantir que não existem perdas durante as diferentes fases do processo de produção. Também se pretende incentivar a formação dos operadores das empresas para assegurar que estão “conscientes dos riscos daquilo que implica estar a operar ou a transportar este tipo de materiais”, explica o eurodeputado.
Outro ponto crucial é relativo ao transporte destes microplásticos, normalmente efetuado em sacos de rafia, um material propenso a sofrer rasgos. É preciso garantir que “todas as embalagens e todos os contentores são à prova de fuga", assim como o acondicionamento apropriado.
“No relatório preliminar já tínhamos aberto a porta ao alargamento ao transporte marítimo, que a Comissão não tinha previsto, e agora reforçámos com novas propostas”, diz João Albuquerque. O transporte marítimo é regulado pela Organização Internacional Marítima, mas o eurodeputado mostrou-se “satisfeito com a abertura que a Comissão demonstrou para poder introduzir normas para o transporte marítimo dentro de águas da União Europeia”.
Pressionar as empresas para assumirem responsabilidade na poluição através dos microplásticos é também uma das estratégias contempladas. “Os ‘pellets’ têm um custo económico de produção muito reduzido”, por isso, o “impacto económico que uma perda tem, normalmente, não é de uma importância muito considerável para as empresas”, refere o redator da proposta. Está contemplada uma penalização de 4% da receita das empresas no Estado Membro onde opera, em caso de acidente significativo.
A responsabilidade também será assumida a nível ambiental com a obrigatoriedade de as empresas limparem o local, onde ocorram derrames, e também de recuperar ecossistemas, caso estivesse previamente degradado. Estas duas normas são, para o deputado, “fatores suficientemente dissuasores para as empresas”.
O acidente ambiental na Galiza impulsionou o avanço no debate da proposta do Parlamento Europeu, mas João Albuquerque espera ainda que haja outra “consequência útil”: a sensibilização nos partidos da direita para o tema. “Nenhum destes partidos, nem destes grupos políticos, marcou presença no debate na Comissão de Ambiente, nem a própria responsável do PPE [Partido Popular Europeu] esteve presente no debate, foi representada por outra colega”, afirma o deputado.
“Estou convicto de que a posição do Parlamento ficará fechada no último plenário de abril, mas o trabalho terá de ser continuado na próxima legislatura”, assegura João Albuquerque. A esperança é que, na próxima legislatura, comecem as negociações entre o Parlamento e a Comissão.
Texto de Eunice Parreira, editado por João Cândido da Silva