Nos primeiros tempos da pandemia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) empenhou-se em eliminar qualquer associação entre o vírus e um país em concreto para que a referência à doença não criasse estigma. O “vírus da China” passou assim a ser chamado “novo coronavírus SARS-CoV-2” e a doença passou a ser identificada como covid-19.
Quando o vírus deu mostras de resistência e começaram a multiplicar-se variantes, esse exercício tornou-se impossível. Até ao momento, já foram noticiadas variantes do Reino Unido, indiana, da África do Sul e do Brasil (Manaus) e agora do Nepal, a mutação responsável pela retirada de Portugal da lista de países seguros do Reino Unido.
O último relatório de “Monitorização das linhas vermelhas para a covid-19”, elaborado pela Direção-Geral da Saúde (DGS) e pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), divulgado esta sexta-feira, revela que, em Portugal, a prevalência da variante associada ao Reino Unido é esmagadora (87,7%). Reconhece também que até 2 de junho foram identificados:
- 104 casos da variante associada à África do Sul
- 139 casos da variante do Brasil (Manaus)
- 83 casos da variante indiana, 74 de uma linhagem e 9 de outra. As três nacionalidades mais frequentemente identificadas nesta variante foram a portuguesa (47%), a nepalesa (27,7%) e a indiana (12%)
Até ao momento, a OMS não reconheceu a existência de uma “variante nepalesa”, continuando a referir-se à variante associada à Índia como “indiana” ou “Delta”. Mas o Governo britânico já a deu como confirmada em Portugal e usou-a para justificar parcialmente a retirada do país da “lista verde”.
91 casos no mundo, 12 em Portugal
Os receios de Londres alicerçam-se numa mutação do vírus — designada K417N — detetada no Nepal e não só. Terão sido identificados em todo o mundo 91 casos, entre os quais 36 no Reino Unido, 12 nos Estados Unidos, outros 12 em Portugal e quatro na Índia. A mutação foi também detetado por uma vez no Nepal — um país que faz pouca sequenciação do vírus — e 14 vezes no Japão (13 delas em viajantes que chegavam do Nepal).
Citado pela televisão britânica BBC, o secretário britânico das Comunidades, Robert Jenrick, disse que não é claro que os 12 casos sejam suficientes para serem considerados “prevalecentes em Portugal”.
“Se olharmos para a situação em Portugal, não só a positividade duplicou nas últimas semanas — e muito rápido — como eles também têm evidências dessa nova variante [do Nepal]. Acho que é muito importante termos cautela quando vemos novas variantes”, disse o governante.
“Ainda não sabemos quão transmissíveis elas são, quão virulentas serão e, o mais importante de tudo, se as nossas vacinas serão eficazes contra elas. Então tomamos uma medida de precaução para que os nossos cientistas tenham tempo para investigar.”
“Variantes de preocupação”
Para que uma mutação se transforme numa variante é necessário que as mudanças no vírus sejam drásticas e que um determinado conjunto de mudanças se espalhe e se torne um padrão.
Numa etapa posterior, as novas incarnações do SARS-CoV-2 podem eventualmente tornar-se “variantes de preocupação”, por se revelarem mais transmissíveis e mais resistentes à vacina, por exemplo. No mês passado, a OMS classificou a variante indiana como “variante de preocupação”. Sendo esta a mutação prevalecente no Reino Unido, tudo o que dela deriva é encarado pelos britânicos com cautelas redobradas.