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Coronavírus

Covid-19. O que é que está a correr mal na vacinação da Europa? Muita coisa

Está a correr mal: os números dizem que a UE está atrasada em relação a Israel e ao Reino Unido. A pressão da procura é elevada, a oferta é escassa, e a tendência é que tudo piore nas próximas semanas - a que se junta a “luta política” que Bruxelas está a travar com a AstraZeneca. Portugal não escapa: "A este ritmo, com o stock que temos, com a procura a aumentar, com os atrasos que se avizinham nas entregas… não chegaremos ao objetivo da primeira fase da vacinação nos próximos tempos”

Andriy Onufriyenko

A vacinação da covid-19 na União Europeia está em “crise”. A expressão foi usada esta quinta-feira pelo New York Times, antes de lembrar um facto que é sintomático da situação atual: Espanha tornou-se o primeiro país europeu a suspender parcialmente as administrações das vacinas devido à falta de doses, pelo menos durante duas semanas. As autoridades da região de Madrid explicaram porquê: "Não sabemos o que vai acontecer a partir da semana que vem. Esperamos que se restabeleça o fluxo de chegada habitual e que a chegada de doses aumente", disse o vice-presidente do governo regional, Ignacio Aguado. Ao mesmo tempo, a Catalunha avisou: está a ficar sem reservas e os atrasos na campanha de vacinação serão inevitáveis caso não cheguem mais doses nos próximos dias.

Ambas as regiões pediram ao Ministério da Saúde para conseguir mais vacinas: neste momento, foram administradas apenas uma média 2,90 doses por cada 100 habitantes espanhóis, ou seja, em cada 100 pessoas, apenas uma completou o processo de vacinação. Este dado parece baixo, mas no atual contexto nem sequer é dos piores: a Espanha é hoje o nono país europeu mais rápido a proteger a sua população contra a covid-19. Está à frente de Portugal, que os últimos dados dizem que só deu 2,73 doses por cada 100 habitantes.

Os números são débeis em praticamente todos os países da UE: depois da Islândia e de Malta (países com pouca população), o Estado-membro mais bem classificado é a Dinamarca, com 3,73 doses, bastante longe dos dois primeiros classificados neste campeonato pandémico: até esta quarta-feira (dia 27), Israel já tinha administrado quase 50 doses a cada 100 habitantes, e o recém-divorciado Reino Unido mais de 11. O que é que está a correr mal na UE? As explicações são técnicas mas também políticas.

“A coordenação [dentro da UE] está a funcionar, mas há uma certa desorganização no que toca à informação avançada ao público. Desde o início que os números que são anunciados depois não correspondem aos reais. Isso cria uma ideia errada, contribui para a falta de transparência. É sobretudo um problema de organização”, começa por dizer João Gonçalves, especialista no Instituto de Investigação do Medicamento da Universidade de Lisboa. “Inicialmente deveríamos ter dito que a quantidade de vacinas disponíveis talvez não fossem as anunciadas, e explicar porquê: devido à dimensão da operação, as dificuldades de abastecimento vão ser cada vez mais difíceis de controlar, porque as solicitações só vão crescer. [Haver] uma gestão de expectativas, para que ninguém pensasse que isto ia terminar no próximo mês”, aponta ao Expresso.