As estimativas do Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge (INSA) apontam para que Portugal possa chegar “dentro de alguns dias” aos três mil novos casos diários, adiantou há pouco a ministra da Saúde, Marta Temido. “As estimativas baseiam-se em modelos matemáticos, que não preveem alterações que decorrem das medidas que estamos a adotar, seja de serviços de saúde como de políticas globais.”
Portugal apresenta por esta altura uma taxa de 120 a 140 novos casos por 100 mil habitantes, “registando uma tendência crescente”, parecida com a de países como a Áustria e a Irlanda. “Há países com uma situação ainda mais desfavorável, acima dos 240 casos por 100 mil habitantes e uma tendência crescente”, contextualizou a ministra. É o caso de Espanha e Bélgica, opostos aos de Dinamarca e Estónia, que têm tendências decrescentes.
Por cá, a situação “tende a agravar-se nos próximos dias” e a sua “inversão depende das medidas que coletivamente possamos tomar, seja enquanto organizações, enquanto Governo ou enquanto indivíduos”.
As medidas anunciadas depois da reunião do Conselho de Ministros desta quarta-feira pretendem estancar a subida que se prevê que venha a acontecer, “se não tivermos a cautela, o cuidado necessário”.
Temido repetiu “um apelo” para o “comportamento individual”, sobretudo para as faixas etárias onde a pandemia mais cresce, entre os 20 e os 49 anos. “Apelo a todos aqueles que têm a aspiração de fazer as suas vidas regressar à normalidade. Só juntos poderemos enfrentar esta nova fase de crescimento da doença, em que vamos ser expostos a uma prova muito dura.”
Entre as medidas de “políticas públicas” adiantadas pelo Governo esta quarta-feira estão o limite de ajuntamentos a cinco pessoas ou a utilização de máscaras também no espaço público ao ar livre.
Quando às medidas nos serviços de saúde, foi a própria ministra a dar conta delas na conferência de imprensa, anunciando que será “hoje publicada uma nova estratégia de testes, com a inclusão de testes de antigénio”, além do “reforço da atividade de contact tracing, que se intensificará nos próximos dias”, sobretudo nas regiões onde tem sido menos utilizado.
Além dessas, Marta Temido destacou duas novidades e um regresso. Começando pelo fim, “no início da próxima semana, haverá um regresso ao que conheceram no passado, que é a prescrição de testes pela linha SNS 24”. Essa hipótese aplica-se a “doentes com indicação para vigilância clínica e isolamento nos domicílios”.
Também a partir da próxima semana, o remdesivir, medicamento que tem sido utilizado em doentes internados, passa a ter indicação para ser administrado “o mais precocemente possível”.
E, por fim, outra novidade acompanhada de um esclarecimento: a redução de 14 para 10 dias do tempo que um doente covid-19 deve ficar em isolamento. “Tem havido uma certa confusão entre a quarentena [que se aplica a quem não tem covid-19 ou aguarda resultado de testes] e a redução do período de tempo para alta clínica”, isto é, “o fim de medidas de isolamento para doentes covid-19”.
Foi esse isolamento, e não as quarentenas para casos suspeitos, que foi reduzido para 10 dias e apenas “em caso de doença ligeira ou moderada, desde que [o doente] esteja sem sintomas ou em melhoria significativa de eventuais sintomas há três dias consecutivos. Mas é sempre uma decisão médica”, reforçou a ministra.
A seu lado, a diretora-geral da Saúde garantiu que, mesmo num momento em que a doença avança em Portugal, há evidência científica suficiente para reduzir o isolamento destes doentes em recuperação. “Não é uma quebra de segurança, pelo contrário. À medida que aprendemos, vamos adaptando as nossas medidas. Por isso é que esperamos tanto tempo pela ciência.”
Cristiano Ronaldo e um inquérito epidemiológico à Seleção ainda por fazer
O tema Cristiano Ronaldo, infetado com covid-19, veio também à baila durante a conferência. “Aplica-se aos jogadores o que se aplica a qualquer cidadão”, garante Graça Freitas.
Questionada sobre a viagem dos jogadores portugueses infetados (CR viaja hoje para Itália, Anthony Lopes e José Fonte voltaram a França), a diretora-geral da Saúde respondeu que “o transporte em condições de segurança fica a cargo da pessoa doente, que tem de providenciar o seu transporte” e depois seguir todas as regras de segurança. Além disso, “assinam uma declaração de compromisso perante as autoridades de saúde de que vão cumprir o confinamento”.
Graça Freitas explicou que o inquérito epidemiológico aos jogadores da Seleção Nacional “ainda não terminou”, mas que o jogo desta noite não comporta riscos. “As regras definidas é que se antes do jogo todos estiverem assintomáticos e com testes negativos, a probabilidade de um [dos jogadores] se tornar sintomático e transmissor é infinitamente pequena”.
A responsável frisa, porém, que a situação muda de figura nos 14 dias seguintes, em que a probabilidade de algum jogador que tenha estado em contacto com os atletas infetados “desenvolver a doença é bastante maior”.
“O momento de o SNS mostrar aos portugueses que valeu a pena”
Marta Temido leu a carta que o atual e cinco antigos bastonários da Ordem dos Médicos lhe escreveram a apelar para uma mudança urgente na estratégia do Serviço Nacional de Saúde. Mas não se alongou em comentários. “Li com atenção e estou de acordo que é o momento de o SNS mostrar aos portugueses de que valeu a pena terem investido as suas escolhas, os seus impostos, o seu afeto naquele que é um serviço público.”
A ministra da Saúde avançou ainda que o Plano Outono-Inverno para os serviços de saúde foi “submetido a consulta do Conselho Económico e Social e do Conselho Nacional de Saúde”, que deram contributos, e que “será publicada a versão consolidada no decurso da próxima semana”.
Além da habitual atualização diária, que mostra que Portugal teve este 14 de outubro o pior dia em termos de novas infeções desde o início da pandemia, Marta Temido apresentou outros números. Congratulou o facto de haver agora “menos 410 mil consultas médicas do que no período homólogo” do ano passado, não por ser uma boa notícia per se, mas porque “é, no entanto, mais um passo no sentido da recuperação” da atividade não covid.
E deu um retrato da ocupação de camas para doentes covid-19 em internamento hospitalar. Em Lisboa e Vale do Tejo, das 6.330 camas disponíveis, estão ocupadas 419 com doentes covid-19, e das 301 que estão afetas a unidades de cuidados intensivos, há 64 ocupadas por estes pacientes. Na região Norte, a segunda mais afetada pela pandemia em Portugal, há 5.489 camas de enfermaria, 294 já a servir pacientes infetados, e 357 camas de cuidados intensivos. Dessas, “até ao final do dia de ontem”, 56 estavam ocupadas.