Coronavírus

Espanha. Longe do colapso, hospitais de Madrid já estão a sofrer segunda vaga da pandemia de covid-19

De 20 de agosto até esta quarta-feira, 9 de setembro, os doentes em Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) da capital espanhola passaram de 126 para 288, enquanto os doentes que ingressaram nos hospitais e que estavam infetados passaram de 9,4% para 19%. Espanha tem o crescimento mais preocupante de casos diários na Europa, uma tendência que começou a evidenciar-se em julho

Carlos Alvarez

Na semana que passou foram quase 50 mil os novos casos de covid-19. Espanha, o primeiro dos países da Europa Ocidental a atingir o meio milhão de casos, está outra vez a viver tempos em que a propagação do vírus parece imparável. Mais exatamente, foram identificadas 49.716 novas infeções na semana que passou, a que se juntaram 237 mortes. Ao todo são 534.513 casos confirmados, 29.594 mortes e 150.376 recuperados, segundo a Universidade Johns Hopkins.

De acordo com as autoridades de saúde, um terço do cenário descrito acima referente à semana que passou aconteceu em Madrid, uma comunidade cujo autarca admite um regresso ao confinamento. Sendo mais rigorosos, José Luis Martínez-Almeida já não o coloca de parte como o fez tão veementemente nas passadas semanas. Só na terça-feira, nuns dados que se referem às 24 horas anteriores, a capital espanhola registou 2921 novos casos, a que se juntaram 294 hospitalizações.

Espanha, um país onde já morreram 21 mil pessoas em lares e residências de repouso, tem o crescimento mais preocupante de casos diários na Europa, uma tendência que começou a evidenciar-se em julho, pode ler-se neste artigo do “Guardian”. Depois de se viver um apertado confinamento, assinala-se também agora o regresso às escolas de milhões de crianças e jovens, o que potenciará necessariamente a circulação do vírus, ainda mais difícil de detetar quando as crianças revelam poucos ou nenhuns sintomas.

Fernando Simón, diretor do Centro de Coordenação de Alertas e Emergências em Saúde, reconheceu o aumento de infeções e informou que 50% se trata de casos sem sintomas. Para além disso, disse, mais de metade foram detetados em pessoas com menos de 40 anos, o que pressupõe menor risco. Ou seja, estes casos não terão de desaguar nos hospitais, algo que voltaria a colocar em xeque os mesmos, como se observou em março, numa altura em que centenas de pessoas morriam por dia. Não havia camas, espaço nem médicos para cuidar de todos os infetados. Tal como em Bérgamo, o primeiro epicentro da pandemia na Europa, tiveram de ser feitas escolhas, deram-se prioridades.

O “Guardian” juntou ainda o depoimento de Ángela Hernández Puente, médica e secretária-geral adjunta da associação médica de Amtys, em Madrid, que confirmou essa versão. Embora haja preocupação, o cenário atual é em nada comparável ao que se viveu em março, defende, explicando ainda que o aumento dos testes permitiu captar casos leves e assintomáticos, evitando assim a propagação silenciosa, digamos assim. Mas, por observar comportamentos irresponsáveis da população e alguma falta de preparação de quem combate a doença, deixou um aviso sério à tripulação: “Se não conseguirmos parar de espalhar o vírus, vamos começar a ver o que vimos em março outra vez”.

Ainda longe do colapso, os hospitais de Madrid já estão a sofrer a segunda vaga, numa altura em que há férias e menos pessoal, escreve esta quarta-feira o diário “El País”. Há cirurgias suspensas (o que, como observou um médico ao mesmo jornal, se traduz em escolhas), transferência de doentes e, o que confirma a tese inicial, duplicaram os doentes covid-19 em menos de três semanas. Fontes do Ministério da Saúde espanhol disseram àquele jornal que a situação é “muito delicada”.

Os números madrilenos explicam-no. De 20 de agosto até esta quarta-feira, 9 de setembro, os doentes em Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) passaram de 126 para 288, enquanto os doentes que ingressaram nos hospitais e que estavam infetados passaram de 9,4% para 19%. Abrindo a lente para o panorama nacional: a média espanhola revela um aumento de 522 para 1051 doentes nas UCI.

Antonio Zapatero, vice-conselheiro do Ministério da Saúde, disse àquele diário espanhol que a situação está “controlada”, embora ressalve: “Isto não quer dizer que estejamos tranquilos. Mas agora ingressamos todas as pessoas com pneumonias, uma coisa que antes não se fazia. Cerca de 50% dos doentes nas UCI não estão entubados, por isso o internamento ali é menor”.

Os especialistas ouvidos pelo jornal “El País” acreditam que o ritmo desta segunda vaga é mais lento, pelo que haverá tempo para uma preparação e reação mais musculadas.

Radar Covid

Esta quarta-feira, no Congresso, a ministra dos Assuntos Exteriores de Espanha garantiu que, após a gestão da primeira onda de covid-19, a imagem de Espanha "se mantém estável" e que continua a ser um dos 20 Estados mais influentes do mundo.

Arancha González Laya, aqui citada pelo jornal "El Mundo", anunciou ainda a abertura de "corredores seguros" com outros países europeus, não tendo dado quaisquer pormenores sobre essa novidade.

Laya disse ainda que a União Europeia vai aprovar uma série de recomendações, entre elas algumas que "vão no sentido do que Espanha reclama", isto é, "territorializar" as restrições de viagem (ou seja, sinalizar zonas de risco ao invés de fechar o país todo) e abrir "corredores seguros". Espanha continua a tentar, desde o verão, levantar as restrições do Reino Unido para voar para as Baleares e Canárias, conta ainda aquele diário.

No sentido de detetar mais e melhor, alargando até os tentáculos além fronteiras, o Governo espanhol vai testar a interação da aplicação Radar Covid com outras existentes noutros países, noticia esta quarta-feira a agência EFE.

Nadia Calviño, a ministra dos Assuntos Económicos e Transformação Digital, disse esta quarta-feira de manhã que a aplicação estará brevemente ativa em todas as comunidades autonómicas do país e que servirá para ajudar a controlar a pandemia. Não está certo ainda se haverá conexão com a StayAway Covid, a aplicação usada em Portugal.