Se olhar para o gráfico em baixo, onde fazemos uma média dos valores dos últimos sete dias (o que atenua os efeitos de dias com picos anormais, sejam altos ou baixos), percebemos que a tendência decrescente do número de casos foi quebrada ainda antes do desconfinamento. Seguiram-se dias de alternância entre números mais positivos e menos positivos que nos levaram a um novo 'planalto'. No ponto mais baixo, a 15 de maio, o valor médio de novos casos diários era 188, atualmente é bastante superior. Para que a curva portuguesa possa retomar a tendência decrescente desejada, os números de novas contaminações terão obrigatoriamente de baixar.
E o desconfinamento nos outros países europeus? Dinamarca, Áustria, Finlândia, Irlanda, Grécia, assim como a grande maioria dos países europeus, têm valores médios de novos casos inferiores a 50. Itália, Espanha, Bélgica e Países Baixos, alguns dos países mais afectados pelo surto, baixaram as suas médias para níveis inferiores aos de Portugal. Alemanha e Reino Unido, com valores ainda altos, estão em declínio consistente. Todos estes países mostram que, até ao momento, o desconfinamento não afetou negativamente a evolução da doença na Europa.
França mostrou uma subida abrupta no final de maio. Segundo o Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças, esta inflexão na tendência decrescente da linha francesa coincide com um alargamento da cobertura laboratorial que permitiu a inclusão de casos diagnosticados retrospetivamente. A curva francesa entretanto baixou mas ainda não estabilizou nem se aproximou dos valores que teve antes da subida de 29 de maio.
A Rússia é o grande 'outlier' neste grupo de países: não consolidou uma tendência decrescente mas parece ter estabilizado os novos casos em valores entre os 8 mil e os 9 mil casos por dia. Também a Ucrânia e a Bielorrússia têm valores controlados em planaltos estáveis.
Já a Suécia deixou o longo planalto de 500 casos por dia onde estava desde o início de abril. A subida da linha de novos casos é justificada, em parte, pelo aumento de testes e por um maior rastreio feito às equipas de saúde. O valor registado esta quinta-feira foi dos mais altos: 1474 novas entradas em 24 horas. A maioria destes novos casos está em Götemburgo, na costa Oeste, na região de Västra Götaland.
Também a Polónia, que tem um acumulado inferior a Portugal, parece ter saído do planalto onde estava: o valor médio de novos casos passou de 275 para 450 no espaço de uma semana.
Se olharmos para o desenvolvimento do surto nos 26 países que chegaram ao 100.º caso há tanto ou mais tempo do que Portugal, percebemos que estamos a meio do grupo. Portugal mantém, desde cedo, um caminho controlado no ritmo de casos registados e logo após um mês a curva estava achatada. Nem somos 'bons alunos', como a Grécia, nem somos o 'aluno travesso' que, neste caso, parece ser os Estados Unidos. Os EUA destacaram-se desde cedo do grupo e, ainda que tenham mais população do que a maioria destes países, têm uma taxa de incidência já muito superior à portuguesa.
Portugal e Qatar reportaram o 100.º caso no mesmo dia, a 13 de março, mas seguiram trajetórias diferentes: Portugal achatou a curva, o Qatar não. Dois meses depois, a 16 de maio, estávamos sensivelmente no mesmo ponto mas o Qatar manteve uma subida acentuada e o número de casos disparou. O Qatar tem 2,8 milhões de habitantes, perto de 1/4 da população residente em Portugal. Dentro dos países mais afetados pelo surto é mesmo o 1.º em número de casos por habitante. Por outro lado, o Qatar tem uma taxa de letalidade muito baixa, o número de pessoas que perderam a vida com Covid-19 é indiscutivelmente residual face ao número de infetados.
Já quanto à linha que regista as mortes, também aqui começou a ser visível uma tendência de abrandamento do ritmo de crescimento da curva portuguesa, que mantém um distanciamento confortável das linhas que comparam o surto noutros países. Alemanha, Suécia, Estados Unidos e Canadá são alguns dos países que tinham uma situação mais positiva do que Portugal no início do surto mas não conseguiram controlar os números da mesma forma.