Primeiro, o Governo colocou os hipertensos e diabéticos no diploma que alterou as medidas excecionais e temporárias relativas à pandemia da doença covid-19, o que possibilitava a estes doentes terem o direito a faltas ao trabalho justificadas quando as funções não podem ser desempenhadas de forma remota, como consta do decreto-lei n.º 20/2020, publicado a 1 de maio em Diário da República. Mas a decisão durou apenas quatro dias, já que numa retificação a este decreto, o Executivo retirou ambas a patologias do regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos.
Agora, Bloco de Esquerda (BE), PCP e PSD querem anular esta mudança e voltar a incluir os hipertensos e diabéticos nas medidas de proteção no âmbito da pandemia. O mesmo é pedido também pela Associação Protetora dos Diabéticos em Portugal (APDP) que aponta o dedo a uma “discriminação inadmissível”. Em comunicado, a APDP chama a atenção para o facto dos diabéticos serem considerados doentes de risco. “É com muita preocupação e espanto que a APDP vê retiradas do regime de proteção especial a menção às pessoas com diabetes”, e frisa que estes doentes, “nos casos em que o teletrabalho não seja possível, podem ver-se impedidos de solicitar declaração médica para se manterem em confinamento e terem as suas faltas justificadas”.
Na redação inicial do decreto publicado a 1 de maio, o Executivo estabeleceu que “os imunodeprimidos e os portadores de doença crónica que, de acordo com as orientações da autoridade de saúde, devam ser considerados de risco, designadamente os hipertensos, os diabéticos, os doentes cardiovasculares, os portadores de doença respiratória crónica, os doentes oncológicos e os portadores de insuficiência renal, podem justificar a falta ao trabalho mediante declaração médica, desde que não possam desempenhar a sua atividade em regime de teletrabalho ou através de outras formas de prestação de atividade”, que foi substituída por um novo artigo, numa retificação de 5 de maio, onde já não figuram os hipertensos, nem os diabéticos.
Diploma discutido no Parlamento
Entretanto, BE, PCP e PSD pediram para o diploma do Governo ser apreciado no Parlamento e apresentaram projetos de resolução, que serão discutidos amanhã, quinta-feira, que visam voltar a incluir os hipertensos e diabéticos nas medidas de proteção.
No documento submetido à Assembleia da República (AR), o BE refere que “esta exclusão de pessoas com fatores de risco causa estranheza até porque não tem nenhuma fundamentação científica ou qualquer propósito que se vislumbre do ponto de vista da saúde pública e do direito de proteção de pessoas especialmente vulneráveis ao SARS-CoV-2” e faz notar que, “pelo contrário, muitos dos casos mais graves de Covid-19 parecem ter uma relação com patologias preexistentes, entre elas a hipertensão e a diabetes”.
Por sua vez, o PCP frisa que o Governo está a “contrariar o entendimento e as orientações da Direção Geral da Saúde permitindo expor as pessoas com diabetes e hipertensão, que no caso de virem a adoecer com a covid-19, poderão estar confrontadas com quadros de maior gravidade e prognóstico muito desfavorável”.
Entendimento que é reiterado no projeto de resolução do PSD: “Importa não ignorar o inegável risco acrescido que as pessoas com diabetes ou hipertensão representam perante a covid-19, bem como o facto de tais doenças as tornarem mais vulneráveis ao desenvolvimento de complicações graves com a infeção da referida doença, incluindo o risco acrescido de morte”. O grupo parlamentar sustenta ainda que “incumbe aos médicos assistentes a avaliação de cada pessoa com diabetes ou hipertensão e, consequentemente, das respetivas condições individuais em trabalho, sendo esse o contexto para a correta tomada da decisão de proteção”.
Além disso, o PSD considera que esta mudança feita pelo Governo devia ter sido alvo da análise do Presidente da República porque "não se limita a operar uma mera correção jurídico-formal". Já que, segundo o partido, estamos perante "uma verdadeira alteração substancial relativamente ao âmbito de previsão legal de uma norma jurídica que, além do mais, por se conter num ato legislativo, ficou desse modo subtraída do pertinente e exigível controlo político do Presidente da República".