Em tempos de pandemia, ir a votos não é tarefa necessariamente impossível — esta quarta-feira, a Coreia do Sul vai eleger os 300 deputados da sua Assembleia Nacional. O surto de pandemia estará presente de forma implícita, podendo influenciar quer a taxa de afluência às urnas quer o resultado do Partido Democrático da Coreia (centro-esquerda), no poder, pela forma como respondeu à crise.
Certo é que já levou à introdução de alterações na forma como o escrutínio habitualmente decorre. Segundo o jornal “The Korea Times”, nas 14.330 assembleias de voto espalhadas por todo o país, haverá medidas especiais para impedir a proliferação do vírus: “verificação da temperatura corporal, fornecimento de luvas plásticas descartáveis e uma cabine separada para eleitores que apresentem altas temperaturas [acima dos 37.5ºC] ou sintomas respiratórios”.
Quem estiver em situação de quarentena voluntária, sem sintomas de covid-19, poderá votar em assembleias montadas em centros especiais a partir das 18h, ou seja, após o encerramento das urnas para os eleitores sem problemas (que abrem às 8h da manhã).
Votar por antecipação para escapar à confusão
Para evitar multidões, cerca de 11 milhões de eleitores (26,69%) — num total de 43,9 milhões — jogaram pelo seguro e recorreram ao voto antecipado, sexta-feira e sábado pasasdos, reduzindo a exposição ao risco de contágio no dia das eleições, que se prevê concorrido. Segundo uma sondagem solicitada pela Comissão Nacional de Eleições, 79% dos inquiridos deu certezas de que iria votar e 15,1% disse que “possivelmente” o faria.
À reportagem da CNN em Seul, Lee Chang-Hoe, de 53 anos, diz: “Não estou muito preocupado com a hipótese de apanhar o vírus na assembleia de voto, desde que tenhamos em mente a necessidade de manter a distância social. Tal como um rio congelado no inverno, apesar de haver uma camada espessa de gelo à superfície, a água tem de correr por baixo. Penso que acontece o mesmo com as eleições, mesmo durante o surto de coronavírus, as eleições devem continuar”.
No início da pandemia, a Coreia do Sul chegou a ser o país mais afetado pelo coronavírus a seguir à China. Abdicou de medidas rigorosas de confinamento e apostou fortemente na realização de testes. Hoje, tem o surto controlado, tendo reportado, esta terça-feira, 27 novos casos, o que contribui para um total 10.564 casos positivos. Morreram 222 pessoas.
Seul tem, no entanto, uma preocupação persistente — os casos de reinfeção, que já ascendem a 116. O primeiro data de 28 de fevereiro, numa mulher de 70 anos, seis dias após ter sido dada como recuperada.
Eleições em tempos de guerra
Ainda que a CNN considere “chocante” observar “grandes reuniões públicas” em tempos de pandemia como as que decorrem das ações de campanha, a história diz que a Coreia do Sul nunca adiou um ato eleitoral, nem mesmo durante a guerra entre as duas Coreias (1950-53). A 5 de agosto de 1952, realizaram-se eleições presidenciais com uma taxa de participação de 88%.
Neste capítulo, a Coreia do Sul não é caso único, já que, por exemplo, os Estados Unidos realizaram eleições presidenciais em 1864, durante a guerra civil. E em 1918, durante o surto de febre espanhola que matou cerca de 675 mi pessoas no país, decorreram eleições para o Congresso.
Ao contrário da Coreia do Sul, pelo menos 47 países — em fases diferentes do surto — cederam ao vírus e adiaram consultas populares que tinham agendadas: eleições locais no Reino Unido e França, primárias do Partido Democrata nos Estados Unidos, legislativas no Sri Lanka e na Bolívia, referendos na Rússia e na Polónia, são alguns exemplos.
Em Portugal, o único ato eleitoral previsto para este ano acontecerá no outono. Ainda sem dia marcado, servirá para eleger a Assembleia Legislativa Regional dos Açores.