Coronavírus

Covid-19. Internamento de Boris Johnson sugere agravamento dos sintomas

Peritos ouvidos por jornais britânicos afirmam que hospitalização não faria sentido apenas para realizar testes de rotina. “Não é um internamento de emergência”, assegurou fonte governamental

Quando participou no aplauso nacional aos profissionais de saúde, a 2 de abril de 2020, a aparência do primeiro-ministro foi considerada pouco saudável
PIPPA FOWLES / DOWNING STREET

Horas depois da mensagem de esperança da rainha, o Reino Unido desperta preocupado com a hospitalização do primeiro-ministro. Na mesma noite em que Isabel II prometeu “Voltaremos a encontrar-nos”, Boris Johnson ingressou no hospital de St Thomas, em Londres (diante do Parlamento, do outro lado to Tamisa), dez dias após o diagnóstico de covid-19 e sem que os sintomas tenham desaparecido, nomeadamente a febre. “Não é um internamento de emergência”, assegurou fonte governamental.

Segundo o seu gabinete, o dirigente conservador foi internado por conselho médico, “como medida de precaução” e para fazer testes, devido à persistência dos sintomas. “The Guardian” explica que não se tratará de novo rastreio ao coronavírus. É provável que Johnson faça radiografias aos pulmões – para despistar pneumonia – e análises ao sangue, para precaver qualquer agravamento do seu estado de saúde. Quaisquer exames mais simples seriam feitos em casa, evitando deslocações que não fossem imprescindíveis.

O jornal ouviu Rupert Beale, diretor do laboratório de infeções do Instituto Francis Crick de Londres: “Os médicos deverão vigiar sinais vitais importantes, como saturação de oxigénio”. E anteviu: “Farão análises ao sangue para apreciar resposta imunitária ao vírus e avaliar as funções hepática e renal. Realizarão um eletrocardiograma para verificar o coração. Testes mais sofisticados podem incluir TAC ao peito, para ter uma imagem precisa dos pulmões.”

O chefe do Executivo anunciou que tinha covid-19 a 27 de março, há dez dias. Terá sido infetado, portanto, há duas semanas. “Dada a crescente pressão sobre os hospitais, é improvável que tivesse sido internado a não ser que os seus médicos estivessem realmente preocupados”, escreve o diário londrino. As diretrizes em vigor no Reino Unido recomendam consulta ao médico caso os sintomas (tosse, febre, fadiga) persistirem ao fim de uma semana.

O jornal cita os sintomas que podem justificar internamento, segundo o Instituto Nacional de Saúde e Excelência nos Cuidados: dificuldade respiratória ou falta de ar grave em repouso; tosse com sangue; lábios ou rosto azulados; sensação de frio e palidez; desmaio; confusão; prostração; redução do fluxo urinário.

Vigilância policial à porta do hospital St Thomas, onde Boris Johnson foi internado a 5 de abril.
SIMON DAWSON/reuters

Ministro e noiva de Johnson recuperados

A maioria dos afetados pela covid-19 recupera em sete dias, se ficar em casa e tomar paracetamol. Foi o que aconteceu ao ministro da Saúde, Matt Hancock. Muitos não chegam a saber que contraíram covid-19. A noiva de Johnson, Carrie Symonds, que está grávida, autoisolou-se após ter tido febre, sem fazer testes, e afirmou, sábado, estar “a ficar bem” após uma semana de cama.

É quando tal não acontece que a doença pode agravar-se, na segunda semana. A sobrecarga do sistema imunitário pode, no limite, causar falhas em órgãos vitais. O único fator de risco de Johnson, que tem 55 anos e nenhuma outra doença, é o excesso de peso, explica “The Daily Telegraph”.

Downing Street insistiu desde o início que os sintomas de Johnson eram ligeiros e que este continuaria a governar. Tem presidido ao Conselho de Ministros por videoconferência, e reuniu-se por esse meio com governantes do G20, não obstante a tosse e certa rouquidão. “Não tenham dúvidas de que posso continuar, graças à feitiçaria da tecnologia moderna, a comunicar com toda a minha equipa de topo e a encabeçar o combate nacional contra o coronavírus”, garantiu. O otimismo é um emblema seu.

O jornal, próximo dos conservadores, cita um deputado do partido de Johnson: “Infelizmente ele escreveu demasiados livros sobre Churchill e quer ser este último. Devia ser Boris Johnson e não tentar ser outra pessoa”. Domingo, fonte do seu entorno corroborava ao tabloide “Mail on Sunday”: “Não tem descansado que chegue. É óbvio que isso começa a atrasar a sua recuperação. Precisa de meter-se na cama”.

Em Downing Street as comunicações com edifícios adjacentes ao n.º11 (onde Johnson reside) foram cortadas. Refeições e documentos são deixados à porta do quarto do primeiro-ministro, que os recolhe pessoalmente, para proteger os trabalhadores da residência.

Johnson publicou vídeos nas redes sociais, aconselhando os cidadãos a ficarem em casa. “Embora esteja sequestrado, consigo estar em contacto permanente com os meus funcionários”, assegurou, para se declarar “absolutamente confiante” no êxito do combate à pandemia. Quinta-feira juntou-se ao pessoal da sua residência, à porta, num aplauso nacional aos profissionais de saúde. O seu aspeto era o de alguém ainda doente.

Ministro dos Negócios Estrangeiros é substituto designado

No dia seguinte, quando cumpria uma semana de autoisolamento, explicou que teria de prolongá-lo, sem deixar de encabeçar o Executivo. Domingo à noite foi levado para um hospital público de automóvel. Ficará “o tempo que for preciso”, indica o seu gabinete. Políticos de todos os quadrantes, britânicos e outros, desejaram-lhe as melhoras.

O substituto designado de Johnson, caso a sua saúde o impeça de governar, é o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab. Esta segunda-feira será ele a presidir à reunião diária do Executivo sobre a pandemia, embora o primeiro-ministro se mantenha em funções. Na linha hierárquica caso Raab (que já teve um teste negativo) venha a adoecer estão o ministro das Finanças, Rishi Sunak, a do Interior, Priti Patel, e o da Presidência, Michael Gove. “Não há uma cadeia fixa. Depende verdadeiramente do que Boris quiser”, disse fonte do Governo ao “Telegrpah”.

A imprensa britânica tem dado conta de divergências no Governo quanto ao momento certo para levantar as medidas de confinamento. A tensão é, como noutros países, entre saúde e economia. O novo líder do Partido Trabalhista, Keir Starmer, ofereceu toda a cooperação ao Executivo, mas quis saber quando e como este pensa aliviar as restrições aos movimentos. Neste ambiente de incerteza, a libra “acordou” na segunda feira em perda face ao dólar.