Coronavírus

Covid-19. Há mais dois lugares em parte incerta para proteger as vítimas de violência doméstica

A APAV chama-lhe uma “tranquilidade aparente”, que ao longo das próximas semanas pode fazer disparar os pedidos de informação e até os números de denúncias por violência doméstica. Com as vítimas fechadas em casa com os agressores devido à covid-19, o Governo, em parceria com várias organizações, aumentou a resposta para apoiar as vítimas e estão agora disponíveis mais 100 vagas em centros de acolhimento de emergência durante o período de pandemia

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Onde é? Isso não lhe podemos contar. Aliás, nem isso nos disseram. O segredo deve-se unicamente à necessidade de proteção das vítimas que nos próximos dias podem ser integradas no Centro Temporário de Acolhimento de Emergência da Associação de Apoio à Vítimas (APAV), que esta segunda-feira abre portas. O local em lugar em incerto faz parte da resposta do Governo, que durante o período de pandemia da covid-19 decidiu criar dois novos centros de receção de vítimas de violência doméstica, criando 100 novas vagas.

“Neste momento estamos numa situação de prevenção, que é fundamental”, começa por explicar Daniel Cotrim, responsável pelo centro de acolhimento da APAV, recorrendo aos exemplos da China, “onde ao fim de dois meses de confinamento, na província de Hubei, aumentaram em 90% as denúncias de violência doméstica comparativamente com igual período do ano passado”, e de Espanha e do Reino Unido, onde na última semana se soube que aumentaram em 12% e 25%, respectivamente, os pedidos de informação junto de organizações de apoio a vítimas de violência doméstica. “Em Espanha, por exemplo, as visualizações dos sites destas organizações aumentaram em 55%”, sublinha.

Em Portugal, o caso parece ser diferente: os dados mais recentes da PSP mostram que, em março, as denúncias diminuíram em 15%, comparativamente com igual período do ano passado. No entanto, diz Daniel Cotrim, esta é “uma tranquilidade aparente” com potencial para fazer surgir ao longo dos próximos dias ou semanas vários novos pedidos de informação e até denúncias por parte das vítimas de violência doméstica.

“Temos de considerar que no confinamento a possibilidade de controlo, domínio e aumento da violência é uma realidade. Não sabemos o que se está a passar e, no sentido de prevenir e não remediar, constitui-se já um conjunto de respostas”, defende o psicólogo. E continua: “As pessoas ainda estão num período de habituação, de preocupação sobre como vão gerir o tempo, a família, as pessoas em casa e até os constrangimentos económicos. Acreditamos que estas questões estão a empurrar os casos de violência doméstica para uma situação de segundo ou terceiro plano. É preocupante mas não é uma preocupação primária das pessoas”. Daniel Cotrim admite que “dentro de uma ou duas semanas” a situação possa mudar.

O centro de acolhimento temporário de emergência da APAV tem 35 lugares, com quartos que tanto podem receber vítimas sozinhas ou quem tenha filhos menores de 18 anos. Para este lugar vão ser encaminhados casos em risco da zona metropolitana de Lisboa e do sul do país. A vítima pode contactar os números de emergência, sendo posteriormente referenciadas pela Rede Nacional de Apoio à Vítimas de Violência Doméstica.

Devido à situação de emergência, uma vez chegadas ao centro de acolhimento, todas as vítimas vão ter de passar pelo centro de rastreio disponibilizado pelo Ministério da Saúde. Se o teste à covid-19 for positivo, ficam em isolamento e são acompanhadas por uma equipa médica.

“Muito do trabalho que aqui vamos fazer é, num primeiro momento, de estabilização emocional. Cada caso é diferente e agora acresce mais uma: além da fuga do agressor, há também a ansiedade que é provocada por toda a situação da covid-19”, sublinha Daniel Cotrim. E deixa um apelo: “Da mesma forma que é pedido que se tome conta uns dos outros para conter a doença - e temos sido capazes disso mesmo - também temos de ser capazes de conter o avanço da violência doméstica e não ficarmos calados”.

Contactos

Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica
Tel.: 800 202 148 (gratuito, 24 horas, todos os dias)
Linha SMS: 3060 (gratuito, 24 horas, todos os dias)
Email: violencia.covid@cig.gov.pt

APAV
116 006 (gratuito, 09h-21h, todos os dias)
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