O toque, o contacto físico, a descoberta do corpo do outro são das atividades mais sacrificadas com as imposições dos governos um pouco por todo o mundo na tentativa de conter um vírus que ainda não parou de crescer. E se esse contacto for entre desconhecidos, as dúvidas e os medos aumentam.
O Tinder, uma das aplicações de encontro mais utilizadas em Portugal, responde com a abertura de uma funcionalidade até aqui limitada a subscritores do Tinder Plus e Tinder Gold, que a pagam. Chama-se Tinder Passaporte e até 30 de abril é gratuita para qualquer utilizador. O recurso permite que um português pesquise uma cidade pelo mundo e coloque um “alfinete” no mapa que gostaria de explorar. Aí chegado, as regras são as de sempre: fazer “swipe” — dar “negas” — até que apareça alguém com quem fazer “match”, sinal de interesse mútuo a partir do qual se pode iniciar uma conversa. Agora sem fronteiras e que assumidamente nunca passará do mundo virtual.
“Neste momento desafiante, temos visto os membros do Tinder a encontrar novas formas de se conectar. À medida que uma área se torna mais afetada por medidas de isolamento físico, vemos novas conversas a acontecer e essas [conversas] duram mais”, diz a empresa, por e-mail, ao Expresso. Exemplo disso são as biografias com que cada utilizador se apresenta ao outro e que estão a ganhar novas formas. “Há mais pessoas a usar as biografias do Tinder para mostrar preocupação pelos outros (“como estão todos?”), em vez de [escreverem] um lema de vida.” E muitas outras, até aqui subscritores com assinatura paga, estão a recorrer ao ‘Passaporte’ “para mostrar solidariedade a ‘matches’ a milhares de quilómetros de distância”.
Foi por isso que a aplicação, detida pela empresa norte-americana Match Group, decidiu abrir a funcionalidade, mas também para que “cada membro possa transportar-se em autoquarentena para qualquer lugar do mundo, para ver uma pessoas na sua cidade natal ou na sua cidade universitária, que estão a passar pelas mesmas coisas”. E se de nada mais servir, “sempre podem aprender a dizer ‘olá’ noutra língua”.
A previsão é que a ferramenta esteja disponível a partir de dia 26 de março.
Coronavírus: o novo desbloqueador de conversa
Não há aplicação de encontros que escape. No OKCupid, do mesmo grupo de empresas que o Tinder, os utilizadores respondem a questionários, mais ou menos detalhados, deixando depois que seja a aplicação a encontrar o par perfeito (ou com as respostas mais próximas). Na app há agora uma nova pergunta: “O coronavírus afeta os seus encontros amorosos?”. Segundo o britânico “The Guardian”, a pergunta surgiu depois de a app ter percebido um aumento de 262% das referências à pandemia nos perfis dos britânicos entre janeiro e março.
Com bares e restaurantes fechados em muitas das cidades onde as aplicações de dating são mais populares, e com o receio de receber em casa um desconhecido e potencial portador do vírus, os utilizadores viram-se para a partilha através de mensagens de texto ou vídeo. “O que vemos no OkCupid é um desejo real de conexão”, cita a mesma reportagem do Guardian. “À medida que mais e mais pessoas estão a trabalhar em casa, a cancelar todos os planos sociais, a não viajar, algumas já se sentem sozinhas e um pouco isoladas”, conta Melissa Hobley, responsável de marketing da aplicação.
E isso só favorece as redes que vivem do desejo de conexão e, nalguns casos, da ideia de fuga ao isolamento. Nos números da empresa de análise de dados Sensor Tower, nos Estado Unidos não houve mudanças significativas no número de pessoas a fazer download destas aplicações. A diferença, conta à Reuters um utilizador do Grindr, outra aplicação de online dating, é que até aqui “costumava ser mais ‘ei, estou à procura de uma conexão’ e agora é ‘ei, talvez depois do coronavírus...’”. Ainda assim, mais do que qualquer outra coisa, a pandemia é agora um eficiente quebra-gelo.
Comum a todas as apps são ainda os avisos de segurança. Os encontros ainda podem acontecer, desde que de mãos lavadas. O OKCupid pediu para que os membros evitem encontros presenciais, trocando-os por chats de vídeo, pedido semelhante ao do Bumble. O Tinder, além de avisos, está a facilitar a ligação entre a aplicação e o site da Organização Mundial de Saúde, onde estão os conselhos práticos, e mais seguros, para lidar com a pandemia.