A pandemia da Covid-19 vai levar Espanha à maior mobilização de recursos de toda a sua história. Num gesto tão sem precedentes como o momento que se vive, o Governo decidiu, esta terça-feira, pôr em marcha um vasto plano de choque, com medidas económicas que visam evitar o colapso da atividade e neutralizar os efeitos da paralisia induzida pelo coronavírus entre os cidadãos mais diretamente afetados. As medidas adotadas pelo Executivo e contidas num decreto-lei de 45 páginas, que entra em vigor esta quarta-feira, implicam movimentar 200 mil milhões de euros procedentes tanto dos cofres do Estado como do sector privado.
Este montante representa cerca de 20% do PIB nacional. Metade dele, 100 mil milhões, destinar-se-ão, através de uma linha de crédito pública, a assegurar a liquidez das empresas (sobretudo pequenos e médios negócios), obrigadas a continuar a honrar os seus compromissos de pagamento enquanto têm a atividade suspensa. Outros 17 mil milhões serão canalizados diretamente para os sectores mais afetados pela pandemia, como a saúde pública, que receberá uma injeção imediata de cerca de mil milhões para comprar equipamentos e abastecimentos, e a investigação dirigida à rápida obtenção de uma vacina contra o vírus. O Governo calcula que aproximadamente outros 80 mil milhões de euros sejam mobilizados pela iniciativa privada.
Uma das decisões de maior impacto é o estabelecimento de uma moratória de dois meses para os mais prejudicados pelas consequências económicas da pandemia ou diretamente afetados pelo vírus pagarem as suas obrigações hipotecárias. Durante esse período, as empresas prestadoras de serviços básicos (água, luz, gás, comunicações) não poderão cortar esses fornecimentos por falta de pagamento dos utentes afetados.
Outro dos aspetos do plano de choque decretado em Espanha é de carácter social. Sánchez ordena a flexibilização total da legislação laboral, para facilitar às empresas e coletivos de trabalhadores a negociação de ERTE (Expedientes de Regulação Temporária de Emprego), que permitem encerrar a atividade laboral sem perda do posto de trabalho.
Evitar despedimentos em massa
Nos primeiros dias desta semana, cerca de 100 mil trabalhadores foram objeto de ERTE forçados, em empresas tão básicas como a Iberia, Seat, Volkswagen, Ford, Nissan, Airbus e Melià. Os lesados por este sistema receberão subsídio de desemprego, embora sem ter em conta o período de carência estipulado para estas situações em circunstâncias normais e mesmo que não tenham cumprido o período mínimo de contribuições para a Segurança Social. As pequenas e médias empresas que, apesar das dificuldades, mantenham o emprego poderão ver-se isentas de 100% das contribuições sociais durante um determinado prazo.
Estas medidas aplicar-se-ão também, em 75%, às demais empresas, sempre com base na manutenção dos quadros de pessoal. O Governo pediu expressamente aos patrões que, caso se vejam gravemente afetados pelo impacto da pandemia, optem pela fórmula do ERTE em vez do despedimento.
O plano económico de Sánchez contempla igualmente uma série de ferramentas contratuais para facilitar a conciliação laboral e familiar, o cuidado a prestar às pessoas mais vulneráveis por trabalhadores e a regulação dos direitos dos que se vejam obrigadas ao teletrabalho. “Ninguém vai ficar para trás”, repetiu várias vezes o primeiro-ministro socialista, para acentuar a dupla intenção do pacote de medidas: evitar a destruição do tecido produtivo e assegurar a proteção social dos coletivos mais desfavorecidos. “Agora temos de nos preparar para o passo seguinte do processo: a recuperação”, concluiu o governante.
Os mercados tiveram uma boa reação inicial ao plano de choque governamental. A Bolsa de Madrid, após perder em poucos dias mais de 30% do seu valor, em consonância com os restantes mercados financeiros europeus, registou uma subida de 6% a uma hora do fecho de transações.