Lembra uma planície de mantas. Extensa, sereno relevo, paleta vívida e quietude. Na Gare do Oriente, àquela hora tardia, já madrugada em Lisboa, amontoam-se centenas de pessoas em condição de sem-abrigo, mas apesar de tudo com ordem, metro por metro distribuídas, até não haver mais espaço, sobre as camas de betão que logo ao raiar da manhã vão novamente ser bancos de estação. Dorme a maior parte, coberta por inteiro, pés e mãos e corpo e rosto, indiferente ao calor e indiferente ao ruído. O piso é aspirado, industrialmente, ruidosamente, por um trabalhador de limpezas, mas ninguém desperta. Despertam quando chegam voluntários que lhes vão distribuir alimentos, uma sandes por cada um, e bebidas, leite ou chá frio.