Sociedade

Tribunal Europeu não aceita caso dos jovens portugueses que acusam 32 países de inação no combate às alterações climáticas

O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou “inadmissível” o processo apresentado em setembro passado, em Estrasburgo, por seis jovens portugueses, que acusaram 32 Estados europeus de não fazerem o suficiente para combater a crise climática e protegerem o seu direito humano a um ambiente saudável

Jovens portugueses durante a audiência no Palácio dos Direitos do Homem, em Estrasburgo, França, no âmbito da queixa contra 32 países por inação climática
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

André, Sofia, Cláudia, Mariana, Martim e Catarina viram esta terça-feira o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), considerar que “não há base na Convenção para a extensão extraterritorial” do caso apresentado há seis meses. Ou seja, o caso é considerado “inadmissível” na instância judicial de Estrasburgo, uma vez que, lê-se na decisão, “a competência territorial foi estabelecida em relação a Portugal, enquanto que nenhuma competência pode ser estabelecida em relação aos outros Estados requeridos”. O tribunal decreta que a decisão tomada não tem recurso nesta instância.

Os seis jovens acusavam 32 Estados europeus de não fazerem o suficiente para combater a crise climática e protegerem o seu direito humano a um ambiente saudável. O caso foi apoiado desde 2018 pela Rede Global de Ação Legal (GLAN), uma organização britânica sem fins lucrativos, que trabalha na área dos direitos humanos e da justiça económica, social e ambiental.

Quando apresentaram o caso em Estrasburgo em finais de Setembro de 2023, os seis jovens disseram ter o sentimento de “dever cumprido” ao colocar a sua ação sob os holofotes mediáticos internacionais. E esta manhã, em declarações à RTP diziam que só o facto de terem chegado ali já era “uma vitória”.

Perdemos por questões técnicas, mas abrimos enormes precedentes e fizemos uma enorme fenda numa parede que todos diziam impenetrável”, frisa ao Expresso o pai de André e Sofia Oliveira. Nuno Oliveira sublinha terem sido alcançadas “três vitórias conceptuais muito importantes: foi reconhecido pela primeira vez que existe uma relação entre os direitos humanos e o impacto das alterações climáticas; foi reconhecido que as alterações climáticas representam uma ameaça existencial e foi reforçada a importância da relação intergeracional neste tema”.

Para Nuno Oliveira, o resultado “não é uma derrota”, já que, sublinha, “faz valer os nossos direitos fundamentais junto do Estado, e sustenta o avanço de processos a nível da cada país”. O facto de não terem avançado primeiro com uma ação num tribunal português foi “uma das tecnicalidades que faz com que fossem marcados três golos, mas todos fora de jogo”, diz o biólogo.

Já no caso das “Avós do Clima”, o Tribunal deu razão às mais de duas mil idosas da Suíça e determinou que a Suíça violou o artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que obriga os Estados a tomarem medidas para combater as alterações climáticas. As Avós do Clima já tinham avançados em instância nacionais. Agora o governo suíço terá de tomar mais medidas para reduzir as emissões, ao encontro do objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a não mais de1,5ºC até 2030, por comparação à época pré-industrial.

Como tudo começou

A ideia de avançar com o processo no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos partiu da Rede Global de Ação Legal (GLAN), em 2018, que queria juntar jovens com um motivo de queixa relacionado com as alterações climáticas. A oportunidade surgiu numa conversa entre a jovem advogada portuguesa Rita Mota, que trabalhava então como voluntária na GLAN, com Nuno Gaspar Oliveira, biólogo e consultor na área da Economia Natural e adaptação às alterações climáticas.

Aos filhos de Nuno, André e Sofia, juntaram-se os primos de Rita, Cláudia, Martim e Mariana Agostinho, e uma amiga destes, Catarina Mota. Na base da ação estavam os trágicos incêndios em Portugal, em 2017 — como exemplo de eventos extremos associados à crise climática, com consequências na saúde dos jovens a nível respiratório e de ecoansiedade e o facto de considerarem que o Governo Português e dos outros 31 Estados pouco estavam a fazer para enfrentar a emergência climática.

O processo deu entrada no TEDH em finais de 2020, e foi por este considerado “prioritário” pela relevância dos factos e pela “urgência das questões levantadas”.

Após dois anos de argumentação e contra argumentação das partes, a primeira grande audiência aconteceu em finais de setembro. A representar os seis jovens esteve uma equipa de advogados liderada por Alison Macdonald, considerada uma “superestrela” da advocacia britânica, que nas alegações iniciais, em Setembro, sublinhou: “Este é um “caso sobre as pessoas que estão a pagar o preço do fracasso dos Estados em resolver a emergência climática”.

Governo diz-se “comprometido com a Ação Climática”

Tal como o Governo cessante, no novo Governo diz que “está profundamente comprometido com a Ação Climática e com o cumprimento das metas para a redução das emissões de gases com efeito de estufa”.

Em comunicado enviado às redações, após saber a decisão do Tribunal Europeu, a Ministra do Ambiente e da Energia, Maria da Graça Carvalho, afirma que “esta pronúncia não diminui a nossa ambição e a nossa responsabilidade para com a Ação Climática”. Lembrando o “esforço legislativo a nível europeu e a nível nacional, nesta área”, Maria da Graça Carvalho, diz que “Portugal tem objetivos ambiciosos para a redução das emissões de gases com efeito de estufa, ambicionando atingir a neutralidade carbónica até 2045, cinco antes das metas definidas pela UE”, corrigindo a meta indicada no programa eleitoral da Aliança que apontava este objetivo para 2050.

Na mesma notas são referidas como prioridades: “a realização de Conselhos de Ministros temáticos sobre a Ação Climática; a concretização do disposto na Lei de Bases do Clima; a operacionalização do Conselho de Ação Climática; a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030); entre outras”.

*artigo atualizado com informação do comunicado do Ministério do Ambiente e Energia