A lição de história serve-se ao balcão do café, entre duas taças de tinto e duas mínis. As primeiras são dos portugueses que chegaram aos Países Baixos há 50 anos, para trabalhar no aeroporto de Schiphol, em oficinas e limpezas de hotéis, na mesma altura em que muitos outros emigrantes rumaram para destinos mais comuns como França, Luxemburgo ou Alemanha. Trabalharam durante anos sem conhecer um fim de semana e, agora, já reformados, com filhos e netos neerlandeses, passam o tempo a jogar à sueca ou ao dominó, sem dispensarem um copo de vinho, na associação de emigrantes portugueses, a última a resistir em Amesterdão. Nos últimos anos, começaram a ver chegar ao balcão pessoas novas. Também portugueses, na casa dos 30, qualificados, muitos deles ligados às áreas tecnológicas. Aparecem ao final do dia de trabalho e estacionam as bicicletas à porta. Às vezes ligam antes a pedir um bitoque e acabam sempre por juntar-se à conversa. São deles, dos mais novos, as mínis pousadas no balcão.
Há fins de tarde na Associação Portuguesa de Amesterdão — ‘a APA’, para os clientes — que são uma espécie de espelho da substituição de gerações de portugueses nos Países Baixos. Isso acontece porque este é um dos destinos para onde a emigração mais tem crescido nos últimos tempos — e é maioritariamente jovem. Desde o início do século, o número de entradas no país quadruplicou, chegando às 4500 em 2022, segundo os dados do Observatório da Emigração. Nesse ano, pela primeira vez, houve mais portugueses a irem para os Países Baixos do que para o Luxemburgo. E em duas décadas a comunidade duplicou: vivem agora por todo o país 25 mil portugueses. Este salto deu-se com mais intensidade a partir do ‘Brexit’, em 2020, que provocou uma queda abrupta da emigração para o Reino Unido. “Os Países Baixos podem mesmo transformar-se no sucessor do Reino Unido”, resume Rui Pena Pires, coordenador científico do Observatório da Emigração.