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Sociedade

“Há um estereótipo de que as pessoas com deficiência são umas coitadas, que a nossa vida é grande infelicidade”: serás tu um capacitista?

Uma vez, num centro comercial, um homem começou a empurrar-lhe a cadeira de rodas sem avisar e sem perguntar se precisava de ajuda. “Estava a ajudá-la”, justificou-se. Isto é capacitismo, tal como também são os estereótipos associados à pessoa com deficiência. “A nossa presença [na sociedade] é normal, mas temos de naturalizar a nossa presença e não sermos constantemente um elefante no meio da sala”, defende em entrevista ao Expresso Catarina Oliveira, nutricionista, ativista e pessoa com deficiência motora

Catarina Oliveira
DR

Aos 27 anos, Catarina Oliveira adquiriu uma deficiência motora. Deixou de conseguir andar e ter sensibilidade na parte inferior do corpo devido a uma inflamação da medula espinal - uma mielite transversa. Esteve vários meses internada e, desde então, desloca-se em cadeira de rodas. Hoje, aos 34, sabe que dificilmente a sua realidade será outra. “Como houve esta mudança na minha vida, por um sem número de condicionantes, acabei por começar a trabalhar também na área da deficiência e, atualmente, não me consigo intitular como nada em específico: sou uma pessoa com deficiência motora adquirida e isso fez-me estar alerta para muitas questões. A vida encaminhou-me para trabalhar nesta aérea e ser, de alguma forma, ativista pelos direitos da pessoa com deficiência”, explica ao Expresso. É nutricionista e vive no Porto.

Antes de adquires a deficiência motora, já eras sensível à causa?
Acho que não. Acho que a coisa que não fazia mesmo era utilizar casas de banho para pessoas com deficiência, não me lembro de o ter feito, posso tê-lo feito, mas não me lembro mesmo. Também não me lembro de estacionar nos lugares para pessoas com deficiência. Aliás, trabalhei muitos anos na baixa do Porto, muitas vezes era um problema para arranjar lugar, e nunca estacionava naqueles lugares. São as duas únicas coisas que me lembro que não fazia ou para as quais estava, de alguma forma, alerta. Não me lembro de ter um amigo ou professor com deficiência, de ter contacto algum com a pessoa com deficiência - e isto faz-me refletir muito hoje em dia porque percebo de onde é que isso vem. Não lembro de estar alerta para as questões de acessibilidade, menos para questões que saem do escopo da acessibilidade física. Não me lembro de subir escadas e pensar em quem não as consegue subir.