A Provedora de Justiça recomendou a alteração da lei dos metadados (que se referem, por exemplo, a localização e duração de chamadas de suspeitos), em janeiro de 2019, uma vez que a mesma, numa análise em que alertava para dois acórdãos do Tribunal da Justiça da União Europeia (UE) de 2014 e 2016, apresentava inconstitucionalidades. No entanto, o Governo nada fez.
O “Observador” leu as cartas trocadas entre a provedora Maria Lúcia Amaral e Francisca van Dunem, que estão disponíveis no site da Provedoria da Justiça. A ministra defendeu a constitucionalidade da lei e acrescentou que “a decisão do Tribunal de Justiça da UE não deverá afetar as investigações nacionais”. Acontece que o acórdão do Tribunal Constitucional, que chumba as normas da lei que determinam a conservação dos dados de tráfego e localização das comunicações pelo período de um ano, visando a sua eventual utilização na investigação criminal, segue a mesma jurisprudência europeia defendida pela provedora Maria Lúcia Amaral em 2019.
A decisão põe em causa as investigações que já estão a correr em casos, por exemplo, de burlas na internet, em que é essencial a utilização dos metadados dos suspeitos como meio de prova, ou o seu uso em casos de tráfico de droga ou terrorismo, entre outros. A Procuradora-geral da República, Lucília Gago, já pediu a nulidade do acórdão.
A ministra Francisca Van Dunem justificou então a decisão: “Temo não ser possível que o Governo possa lograr apresentar ao Parlamento uma proposta de lei com essa aspiração”, devido ao “calendário legislativo” e à “complexidade de alteração legislativa” da lei dos metadados”.
A ministra referia-se então às eleições legislativas de 2019, que se iriam realizar dentro de meio ano, para não desencadear os procedimentos destinados à revisão. O Público questionou a ex-governante sobre a razão pela qual não tentou solucionar a questão no seu segundo mandato, que decorreu entre outubro de 2019 e março de 2022. Francisca Van Dunem alegou que a legislatura se revelou atípica devido à pandemia, que chegou a Portugal em março de 2020. No entanto, nota o diário, o Parlamento nunca cessou a sua actividade.