Sociedade

Quem é Carlos Alexandre? Depende de quem responde: “batoteiro e manipulador” ou apenas “trabalhador”

O desembargador Jorge Antunes decide no dia 3 de maio quem são o juiz Carlos Alexandre e a escrivã Teresa Santos - e se acabarão julgados por crimes cometidos na distribuição da Operação Marquês. O debate instrutório ficou marcado por visões completamente antagónicas sobre o que se terá passado para o processo ter ido parar às mãos do superjuiz

PATRICIA DE MELO MOREIRA

O debate instrutório do caso da distribuição da Operação Marquês foi muitas vezes uma discussão sobre o caráter do juiz Carlos Alexandre: manipulador para o assistente José Sócrates e um bode expiatório para a defesa. "Só há problemas com o a distribuição nos casos do doutor Carlos Alexandre?", desesperava a advogada Fátima Esteves.

A cadeira estofada do salão nobre do Tribunal da Relação de Lisboa destinada aos arguidos ficou vazia e José Sócrates, que quer Carlos Alexandre julgado por abuso de poder, falsificação de funcionário e abuso de poder, também não esteve presente no velho edifício da baixa de Lisboa.

Por isso, o combate deu-se através dos advogados. Pedro Delille fez questão de "registar" que o superjuiz escolheu a mesma "advogada que a superjornalista, Felicia Cabrita". Fátima Esteves reclamou contra a "falta de urbanidade" e disse não estar ali para "fazer comunicações aos jornalistas".

No longo debate instrutório que se prolongou por cinco horas e foi dirigido com parcimónia pelo desembargador Jorge Antunes, os representantes dos quatro envolvidos concordaram num ponto essencial: o processo da Operação Marquês foi distribuído manualmente ao arguido Carlos Alexandre pela arguida Teresa Santos, e não por sorteio eletrónico como a lei determina.

As diferenças estiveram no porquê.

Para o Ministério Público, que arquivou o caso aberto depois das suspeitas levantadas pelo juiz Ivo Rosa (o magistrado que reduziu a Operação Marquês a cacos) , houve um "apagão" do sistema informático que impossibilitou um sorteio eletrónico. "Tudo o resto é ficcionado", atirou o procurador Moreira da Silva, que garantiu concordar com a decisão "irrepreensível" da colega que arquivou o processo por "convicção" e não por "corporativismo".

Segundo Pedro Delille, que fez questão de se sentar ao lado de Moreira da Silva, não "houve qualquer apagão". Aquela é uma "tese mentirosa" e o que aconteceu foi um "conluio" entre Teresa Santos e o juiz que, por "vaidade", queria ficar com os "processos mediáticos". E a prova disso é que no mesmo dia "ficou com o caso dos Vistos Gold". Para o advogado de Sócrates, "Carlos Alexandre não devia ter aceitado o processo" porque sabia que não havia qualquer apagão e que as regras não estavam a ser seguidas. "Fez batota" .

Fátima Esteves argumentou que "houve de facto problemas coma distribuição" e que o "sistema não estava a funcionar". Carlos Alexandre ficou com este e outros processos porque "gosta de trabalhar" e admitiu ter sugerido o nome de Teresa Santos para escrivã do tribunal porque "já estava habituada a distribuir processos".

Filipe Azoia, que defende a escrivã, garantiu que só quem "não conheça" Teresa Santos poderá achar que entregou "propositadamente" o processo a Carlos Alexandre, "porque" tem 41 anos de experiência e distribuiu manualmente os processos para "evitar pendências". "Experiência em aldrabar a distribuição", insistiu Pedro Delille, que considera este processo um "caso policial" e reclamou contra os colegas por insistirem na "tese do apagão". "É uma mentira", disse.

O desembargador Jorge Antunes comunicou aos arguidos uma alteração não substancial dos factos (os crimes mantêm-se) e marcou para 3 de maio o dia em que vai comunicar uma decisão histórica: irá Carlos Alexandre sentar se no poltrona estofada com vista para o teto do salão nobre da Relação onde está gravado: "A lei é igual para todos?"