Pedro Bello nunca leu tantos livros como naquele ano: foram 64. Leu sobretudo em português e francês enquanto esperava nos quartos de hospitais. Pegava num cadeirão e arrastava-o, virava-o de costas para a televisão, onde a mulher se sentava a olhar o ecrã. De todas as vezes que abriu um novo livro ou que chegou ao fim de um capítulo tinha a seu lado, deitada na cama, a filha Joana. Com 15 anos, tinha um cancro raro na cabeça. Aquele ano em que Pedro mais leu foi o último ano de vida da filha.
“Estivemos tantas horas nos hospitais que eu só lia para passar o tempo.” Foi Pedro que escolheu o local para a conversa com o Expresso: o estádio de Alvalade, em Lisboa. Joana gostava muito de futebol e foi com um tio que ganhou o amor ao Sporting. “Eu nem ligo a bola mas ela gostava muito. Creio que foi em maio de 2000, acho que quando foram campeões, ela e o tio foram para a rua festejar e, antes de saírem, disseram-me: só voltamos para casa quando a gasolina do carro acabar ou quando a buzina parar de funcionar.”