A crescente consciencialização nos últimos anos para a importância de manter um estilo de vida saudável, assente na prática de exercício físico e numa alimentação mais equilibrada, contrasta com a elevada prevalência de condições como a diabetes e o colesterol em Portugal. O país, culturalmente apaixonado pela gastronomia rica em sal e gorduras, regista números preocupantes: por um lado, quase 70% dos portugueses apresenta níveis elevados de colesterol, enquanto, por outro, a taxa de incidência nacional da diabetes é de 9,9%, acima dos 6,4% da média da OCDE. Nesta última, a diferença explica-se, defende João Filipe Raposo, pela conjugação de vários fatores, como a estrutura etária da população, a organização dos cuidados de saúde e o modelo de desenvolvimento económico da sociedade.
Se a associação entre a doença e o envelhecimento justifica, em parte, estes números, o diretor clínico da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal (APDP) não tem dúvidas de que a falta de “investimento em modelos eficazes de prevenção” está na base do problema. João Filipe Raposo diz que “temos em Portugal, além dos números já elevados da população diagnosticada, cerca de 30% de pessoas com diabetes por diagnosticar”, uma situação que poderá originar o surgimento de complicações em doentes identificados tardiamente. Davide Carvalho, presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia Diabetes e Metabolismo (SPEDM), concorda e acrescenta a obesidade à equação. “Em dez anos [entre 2005 e 2015], a taxa de obesidade passou de 14% para 28%, uma das mais altas da Europa”, atesta, sublinhando a urgência de apostar em programas de prevenção para reduzir um dos principais fatores de risco da diabetes e do colesterol.
Além do número de diabéticos que Portugal regista (8%, de acordo com o Programa Nacional para o Combate à Diabetes) e de doentes não diagnosticados, as implicações que a doença tem na saúde pública são muitas e graves. Segundo a Direção Geral da Saúde (DGS), um terço dos internamentos por AVC e enfarte agudo do miocárdio têm origem na patologia, que é diretamente responsável por 3,8% das mortes em Portugal, um número que tem vindo a descer desde 2012. João Filipe Raposo alerta ainda para os efeitos indiretos que contribuem “em mais de 30% para a mortalidade associada a doença cardíaca, AVC e doença renal”, que ajudam a engrossar os números.
Consultor da Organização Mundial de Saúde (OMS), Francisco Goiana da Silva é perentório na atribuição de responsabilidades na incapacidade de reduzir drasticamente a incidência da diabetes. “Os dirigentes que estiveram ao leme das autoridades de saúde e da saúde pública ao longo das últimas décadas falharam na sua missão de prevenir as doenças de hoje”, critica, lembrando que o SNS é “excecional” no tratamento, mas coloca a prevenção em segundo plano atribuindo-lhe “menos de 1%” do orçamento da saúde. No campo da atuação precoce, os especialistas ouvidos pelo Expresso são unânimes: a resposta está na promoção da alimentação saudável e da prática de exercício físico. Cristina Gavina, cardiologista e diretora da Academia Cardiovascular, acrescenta a importância de apostar em “equipas dedicadas com psicólogos, nutricionistas e enfermeiros que apoiem na modificação de comportamentos e na manutenção de estilos de vida mais saudáveis”.
Esta e outras estratégias de combate à diabetes e ao colesterol estarão no centro da discussão do segundo debate do ciclo “Imunes”, promovido pelo Expresso com o apoio da MSD e transmitido em direto na página de Facebook do semanário, esta terça-feira, a partir das 18h. A conversa “Imunes: da alimentação ao colesterol e à diabetes”, moderada pela jornalista da SIC Notícias Rita Neves, contará com a participação de Cristina Gavina, cardiologista no Hospital de Matosinhos e diretora da Academia Cardiovascular; Francisco Goiana da Silva, professor da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior e consultor da Organização Mundial de Saúde; João Filipe Raposo, diretor clínico da Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal; e Davide Carvalho, presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia Diabetes e Metabolismo.