Sociedade

Ao contrário de outros países, Portugal não obriga os repatriados a quarentena. Quais os planos para casos de coronavírus?

Três hospitais portugueses estão de prevenção por causa do coronavírus. Curry Cabral reservou 14 quartos, totalmente isolados e mantidos a uma pressão negativa, para casos suspeitos ou confirmados de infeção, e preparou “circuitos de passagem” alternativos para doentes e pessoal médico

Pixabay

Ao contrário de vários países, nomeadamente europeus, Portugal não tem prevista uma quarentena automática para os cidadãos repatriados devido ao surto de coronavírus – o que aliás seria inconstitucional, porque só está previsto para casos do foro psiquiátrico. Na Alemanha, Espanha, França e Reino Unido a medida está prevista, se necessário durante 14 dias, o período de incubação da doença até ao aparecimento dos primeiros sintomas.

Em Espanha, por exemplo, o “El País” já avançou que a quarentena será cumprida no Hospital Central Gómez Ulla, em Madrid, onde está reservado um piso completo. No Reino Unido, Matt Hancock, o secretário da Saúde, já avisou: “A segurança pública é a nossa prioridade. Quem regresse de Wuhan será isolado durante 14 dias, com todos os cuidados médicos necessários”.

Apesar de não estar prevista a obrigatoriedade da quarentena, a ministra da Saúde afirmou esta quinta-feira que os portugueses a retirar da China serão rastreados antes de iniciarem a viagem e na chegada ao aeroporto. Marta Temido acrescentou que Portugal ainda estuda a hipótese de um espaço de confinamento, "seja no domicílio ou noutro tipo de espaço", o que depende da “condição clínica destas pessoas e do seu historial anterior".

Plano de contingência inclui equipamento de proteção e espaços específicos

O plano de contingência que está acionado em três hospitais portugueses implica equipamento de proteção individual, espaços e meios alocados e articulação com o INEM para a receção dos eventuais contaminados, apurou o Expresso junto das unidades de saúde.

Face à progressão da epidemia, foi já na semana passada que a Direção-Geral de Saúde designou os hospitais de São João, no Porto, e o Curry Cabral e o Estefânia, em Lisboa, como os destinos para potenciais infetados. A responsabilidade dos hospitais apenas se dá com a chegada dos doentes à unidade hospitalar.

“O transporte destes doentes (casos suspeitos ou confirmados) deverá ser feito pelo INEM, que dispõe dos meios adequados”, explica o Hospital de São João. Aliás, fonte da mesma unidade esclarece que apenas será dada resposta a “situações de doença aguda” e que não está previsto que os hospitais sejam um local designado para quarentena de possíveis pacientes.

“Apenas doentes serão admitidos no internamento do Centro Hospitalar Universitário de São João; não temos informação de que esteja previsto o repatriamento de qualquer cidadão português que se encontre doente”, informam.

Da parte do Curry Cabral, em Lisboa, a informação é a mesma. Ao Expresso, Fernando Maltez, diretor do Serviço de Doenças Infecciosas, reforça que o plano de contingência já elaborado será aplicado apenas a pessoas infetadas ou com suspeitas de infeção. Este plano “contempla o isolamento dessas pessoas em quartos próprios no serviço de doenças infecciosas”. Nesse sentido, foram disponibilizados “14 isolamentos respiratórios de pressão negativa”, utilizados para acolher pacientes com doenças infecciosas.

Mas como o plano de contingência foi “preparado para garantir a segurança quer dos doentes, quer dos profissionais de saúde”, estão previstas outras medidas, como a existência “de circuitos de passagem” distintos e a entrega de “equipamentos de proteção individual”, como “batas, luvas, máscaras, óculos e toucas”. Está tudo a postos, incluindo no que diz respeito às “terapêuticas e métodos de diagnóstico a implementar”, diz ainda Fernando Maltez.

Hospital de São João preparou “espaços físicos e meios” para dar resposta ao vírus

No caso do hospital de São João, no Porto, o plano de prevenção – que será atualizado “conforme conhecimento da evolução da epidemia” – contempla “espaços físicos e meios” específicos que são alocados a esta resposta. Isso inclui médicos, cujo número depende da quantidade de “casos suspeitos ou confirmados” que venham a ser encaminhados e das suas características,”nomeadamente se adultos ou crianças e grau de gravidade”.

À semelhança do que acontecerá no Hospital Curry Cabral, os profissionais de saúde do hospital no Porto que prestam cuidados a estes doentes terão de usar “equipamento de proteção individual apropriado ao tipo e risco de transmissão deste agente” que, “dependendo da atividade que se vai exercer”, irá passar pela utilização de “máscaras, batas, luvas e proteção ocular (óculos ou viseiras).

Apesar de o plano ser específico – por ser um novo vírus e, como tal, com “características próprias” –, o Hospital de São João admite que há pontos de contacto com doenças anteriores, como a gripe das aves ou a gripe A. “Há naturalmente semelhanças com anteriores doenças emergentes na forma como se transmite, como se tem dado a evolução da epidemia e nas implicações em termos de saúde pública e medidas de controlo”, admitem.

Fernando Maltez acrescenta que o Curry Cabral já “ativou vários planos de contingência para outras ameaças de doenças infecciosas” e que estes planos “vão sendo modificados e atualizados”, com alterações ao nível dos equipamentos de proteção individual, como aconteceu com o surto de ébola que teve origem na República Democrática do Congo, “que se transmite por contacto com qualquer fluido orgânico” e não “apenas por via respiratória”, como no caso do coronavírus.

Quanto às precauções a tomar, o especialista refere que são as mesmas que num caso de gripe, incluindo para as pessoas que convivam com os portugueses que vão ser retirados em breve de Wuhan – tudo indica que já esta sexta-feira – e colocados sob vigilância em casa por um período de 14 dias, mediante uma análise caso a caso.

“Estes cidadãos não precisam de permanecer sozinhos em casa, podendo conviver com familiares e amigos desde que usem máscara e lavem as mãos. Aqueles que convivem com eles também têm de fazer o mesmo”, ressalvou.

Os sintomas do coronavírus são parecidos aos de uma gripe, mas mais intensos: febre, dor, mal-estar geral e dificuldades respiratórias, incluindo falta de ar.