Assinalam-se em 2019 os 50 anos sobre os motins no bar Stonewall, em Nova Iorque, que desencadearam acontecimentos desde a criação de movimentos associativos de luta pelos direitos das pessoas LGBTI a um conjunto de transformações que, longe de estarem ao alcance de todos em todo o mundo, promoveram mudanças nos comportamentos, abrindo caminho a um mapa de possibilidades que envolvem, entre várias realidades, o crescimento da oferta de turismo e a multiplicação de espaços de consumo e lazer. Há já alguns anos começaram a surgir em Portugal agregadores como o Lisbon e o Porto Gay Circuit, estando a Variações a trabalhar também a construção de uma rede de espaços que possam servir não apenas o público nacional como o turismo. “Embora o país tenha um ar um bocadinho conservador, a realidade LGBT construiu-se há muitos anos, estava a evoluir e crescer, mas não estava ainda estruturada”, conta Carlos Sanches Ruivo da Variações, associação de comércio e turismo LGBTI portuguesa. Um dos grandes objetivos desta e outras associações é, neste momento, a candidatura de Portugal ao Europride 2022 (a decisão será conhecida a 19 de setembro). Mas antes mesmo dessa decisão há já entre nós um mapa de oferta LGBTI nacional.
Com atitude LGBT friendly há restaurantes reconhecidos pelos dois guias acima referidos, alguns deles já associados também à Variações. A mais recente edição online do Lisbon Gay Circuit refere restaurantes como o Jardim dos Sentidos, Põe-te na Bicha, Mami, Muito Bey, Quermesse, Soul Kitchen & Bar, Wurst, Les Sources, Bistrot Edelweiss e Tantura, estes dois últimos tendo nascido entre casais gay estrangeiros que encontraram novas vidas em Portugal. A Casa da Praia, na Caparica, está referida nesta lista. O site Zomato lista ainda em Lisboa, como LGBT friendly, os restaurantes Steakhouse Bar — A Gayola e a Churrasqueira da Luz. O Porto Gay Circuit online dá como exemplos os restaurantes Arte da Baixa, Hard Rock Café Porto, Mão Travessa, The Lingerie Restaurant e World Kitchen. As versões impressas dos dois circuitos (há um PDF em cada um dos sites) acrescentam ainda mais referências, tanto nos restaurantes como na listagem de espaços para dormidas e até lojas.
Entre o panorama de oferta para dormidas, Lisboa tem uma guest house para homens gay como o seu público principal: o Late Birds. O Lisbon Gay Circuit refere ainda a Villa 3 na Caparica, a Buganvílias do Meco Guest House (Fetais — Aldeia do Meco) e a Boutique Guest House Lua Nua (São Teutónio — Zambujeira do Mar). O circuito portuense lista a Casa Alegria — Gay Guest House e também hotéis LGBTI friendly como o Hotel Cristal Porto, o Douro Palace Hotel Resort & Spa, o Douro Royal Hotel & Spa e o Royal Bridges Hotel Porto. Estes espaços “têm de mostrar que efetivamente têm alguma coisa para a comunidade LGBTI”, sublinha Carlos Sanches Ruivo, que acrescenta que uma das ideias da Variações é a proposta aos hoteleiros de Portugal de uma formação para que os seus profissionais saibam como devem lidar com pessoas LGBTI ou mesmo terem empregados LGBTI que se sintam à vontade”.
Uma consulta online dará imediata noção de uma concentração em Lisboa e no Porto, não sendo difícil encontrar uma lista variada de bares e locais de diversão noturna, alguns deles concentrados na zona do Príncipe Real e Bairro Alto (falando aqui de Lisboa).
O calendário de oferta cultural, além de eventos ocasionais de música (concertos e festas), inclui uma referência que corresponde ao mais antigo festival de cinema de Lisboa, também já com presença no Porto. O Queer Lisboa (20 a 28 de setembro) e o Queer Porto (16 a 20 de outubro) procuram “dar a conhecer uma cinematografia específica que tem pouca visibilidade fora do circuito dos festivais de cinema”, descreve o diretor artístico João Ferreira. Além de mostrar cinema, os festivais “pretendem colocar os filmes em diálogo com outras artes”. Por isso tem havido também uma aposta “numa vertente mais académica, com a publicação de livros de ensaios inéditos, exposições, performances”.
No plano da atividade desportiva, a Boys Just Wanna Have Fun Sports Club é uma associação que oferece as modalidades e atividades de voleibol, râguebi, natação, atletismo, futsal e tango argentino. As atividades decorrem em sítios fixos “e qualquer pessoa é bem-vinda”, como descreve o seu presidente, Ruben Coelho. Há “uma especial atenção para público LGBT no sentido em que se pretende criar um espaço seguro para a prática desportiva”. Entre a agenda de eventos está o 10º Pitch Beach, torneio internacional de râguebi, voleibol, natação e futebol, a realizar de 25 a 28 de julho entre o Inatel e as piscinas municipais de Campo de Ourique.
O Centro Comunitário LGBTI (Rua dos Fanqueiros, 40), gerido pela ILGA, é um dos pontos-chave do mapa de Lisboa. “Tem as portas abertas e uma programação mensal”, explica ao Expresso Nuno Pinto, atual presidente da direção da ILGA. Todas as quintas, às 19h, há encontros sobre livros moderados por Ana Vicente. Aos sábados, pelas 22h, há noites de karaoke. O programa cultural envolve tertúlias (dia 25, às 15h está agendada a tertúlia “Aliança Interseccional”), pequenos concertos, exposições, lançamentos de livros “que permitem criar comunidades”. Há grupos ligados a práticas de desporto, há o ILGA Pets “com pessoas que se juntam para passear os seus cães” e atividades artísticas (como é o caso do coro Colegas). O centro presta ainda uma série de serviços de apoio à comunidade “que são feitos com voluntariado”. Tem “um serviço de apoio a vítimas, um de integração social, aconselhamento psicológico feito com profissionais que fazem formação e que têm supervisão contínua, há apoio jurídico e também uma linha LGBT que serve em situações sociais mas também pode dar informação lúdica e apontar sítios seguros”. Neste caso a linha envolve “pessoas LGBTI que tiveram formação” na ILGA para ali poderem responder às chamadas.
Também em Lisboa o Checkpoint LX (Travessa do Monte do Carmo, 2) é um centro comunitário dirigido aos homens que têm sexo com homens que oferece um serviço de rastreio rápido, anónimo, confidencial e gratuito do VIH e outras doenças sexualmente transmissíveis, assim como faz aconselhamento e referenciação para cuidados de saúde.
Apesar de não ter espaços físicos fixos, a Rede Ex-Aequo é uma associação com trabalho em vários pontos do território nacional. Tavares, que preside à rede, explica ao Expresso que a associação utiliza espaços que são cedidos para as atividades dos núcleos que, neste momento, existem em Lisboa, Porto, Coimbra, Madeira e São Miguel (Açores). “Há reuniões temáticas, tertúlias com o objetivo de gerar momentos de discussão onde jovens LGBTI possam participar e estar em ambiente seguro”, descreve. Há depois programas ao ar livre “que puxam pela atividade física” e que servem “para promover o convívio”. Entre a agenda da associação encontramos a edição deste ano do Acampamento de Verão LGBTI, que vai decorrer de 17 a 25 de agosto na Figueira da Foz.
Os 50 anos dos motins de Stonewall fazem do calendário das marchas do orgulho LGBTI de 2019 uma ocasião especial. Há marchas agendadas para vários locais do país: Coimbra (17 de maio), Faro (8 de junho), Aveiro (15 de junho), Lisboa (29 de junho, havendo uma semana antes, no dia 22, o Arraial Lisboa Pride), Matosinhos (20 de julho) e Funchal (19 de outubro). A agenda vai incluir ainda marchas em Bragança, Porto, Viseu e Vila Real. De 29 de maio a 3 de junho, o bar Tr3s, na zona do Príncipe Real, organiza o Lisbon Bear Pride.
Dia 17 de maio, Dia Internacional da Luta contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia, vai realizar-se o Arco Iris no Jardim (do Príncipe Real, em Lisboa), uma jornada de atividades organizada em colaboração por várias associações LBGTI e a Junta da Freguesia da Misericórdia.
Um acompanhamento regular de todas estas atividades pode ser feito através do site de notícias e cultura LGBTI “Dezanove.pt” que, como explica o seu diretor Paulo Monteiro, “retrata a realidade portuguesa dando a conhecer tudo o que se passa no país, desde os eventos como as marchas aos protagonistas do ativismo, da política, dos negócios, da cultura”. O site procura informar os acontecimentos de cada cidade “em termos LGBTI, desde a exposição fotográfica ao bar que abre, à campanha ou marca gay friendly, às histórias de amor ou aos casos de discriminação”. Num inquérito aos hábitos de turismo e lazer em Portugal recentemente divulgado pela “Dezanove” ficou claro que “60,6 por cento dos inquiridos garantem que preferem marcas ou serviços que veiculem uma mensagem de respeito pela comunidade LGBTI”. O mesmo inquérito revelou que Lisboa é vista como “a cidade portuguesa mais atrativa para turistas LGBTI” (83,1 por cento dos inquiridos), enquanto o Porto “fica pelos oito por cento”.
Todos os circuitos, lugares, centros e associações referidos no artigo têm sites e/ou representação nas redes sociais