José Sócrates é acusado de ter recebido, entre 2006 e 2009, um montante superior a 24 milhões de euros em luvas dos grupos Lena, Espírito Santo e Vale de Lobo, com vista a facilitar a autorização de negócios ou a concessão de financiamentos.
Na última edição, o Expresso revelou que o DCIAP ordenou o arresto de casas que são alegadamento do ex-primeiro-ministro. Na justificação do arresto que está exposta no despacho enviado para a Conservatória do registo Predial de Lisboa no âmbito da "Operação Marquês", o MP revelava que Sócrates recebeu "pelo menos, 32.029.925 euros em subornos".
O despacho colocava dois cenários: o arresto dos imóveis serve como garantia do "pagamento do valor de parte de 19.500.000 euros em sede de IRS e juros não entregues ao Estado" ou da "perda de vantagem do crime" no montante dos 32 milhões de euros.
Agora, de acordo com a acusação, a atuação de Sócrates, na qualidade de primeiro-ministro, e também depois de sair do Governo, permitiu que o Grupo Lena obtivesse benefícios comerciais. Carlos Santos Silva interveio como intermediário de Sócrates em todos os contactos com o Grupo Lena.
Em troca destes benefícios e em representação do Grupo Lena, Joaquim Barroca aceitou fazer pagamentos, primeiro para a esfera de Carlos Santos Silva mas que eram na verdade destinados a José Sócrates. Por outro lado, Joaquim Barroca veio ainda disponibilizar a utilização de contas bancárias abertas em seu nome na Suíça para movimentar fundos que se destinavam a Sócrates.
Ainda segundo a acusação, Carlos Santos Silva, tendo em vista receber outros motantes destinados a Sócrates, disponibilizou sociedades por si detidas para receber quantias do Grupo Lena, com base em pretensos contratos de prestação de serviços.
Os fundos acumulados na Suíça integravam também pagamentos determinados por Ricardo Salgado, com a mobilização de quantias de entidades offshore do Grupo Espírito Santo. "Tais pagamentos estavam relacionados com intervenções de José Sócrates, enquanto primeiro-ministro, em favor da estratégia definida por Ricardo Salgado para o grupo Portugal Telecom, do qual o BES era acionista".
Para essa finalidade, Salgado utilizou Hélder Bataglia "para fazer circular fundos por contas no estrangeiro" controladas por Bataglia. "Todos esses pagamentos eram justificados com contratos fictícios em que era interveniente Hélder Bataglia."
O documento refere ainda que José Sócrates "conluiado com Armando Vara", que era na altura administrador da Caixa Geral de Depósitos (CGD), também recebeu pagamentos com origem em receitas desviadas do grupo Vale de Lobo. Esses pagamentos, segundo o MP, foram determinados por administradores deste grupo, "tendo em vista facilitar a concessão de financiamentos por parte da CGD".
Das obras de arte ao livro de Sócrates
Os mais de 24 milhões de euros foram, num primeiro momento, recebido em contas controladas por José Paulo Pinto de Sousa e depois em contas de Carlos Santos Silva.
Este último veio depois transferir o dinheiro para Portugal, através de uma pretensa adesão ao RERT II (Regime Excecional de Regularização Tributária), visando a sua posterior colocação em contas por si tituladas mas para utilizadores no interesse do ex-primeiro-ministro.
Essa utilização passava por levantamentos e entregas de quantias em numerário a José Sócrates, feitas com a intervenção de Carlos Santos Silva, mas também de Inês do Rosário, João perna e Gonçalo Ferreira.
"Esses fundos foram, igualmente, utilizados para aquisição de imóveis, obras de arte, pagamento de viagens, aquisições de exemplares do livro de José Sócrates e para fazer chegar dinheiro a pessoas das relações deste arguido", lê-se no comunicado do Ministério Público.
Salgado, Bava e Granadeiro
Quanto a Ricardo Salgado, os procuradores sustentam que o banqueiro determinou que fossem feitos pagamentos a Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, na altura na administração da PT, agindo "em conformidade com interesses definidos por Ricardo Salgado para o BES enquanto acionista da PT".
Ainda com origem no GES, e por determinação de Ricardo Salgado, já em 2010 e 2011, Carlos Santos Silva terá "montado um esquema", em conjunto com Joaquim Barroca e Hélder Bataglia, com vista à atribuição "de nova quantia a favor de José Sócrates".
Este esquema passava pela produção de um contrato promessa de compra e venda de um edifício em Angola. "Através do incumprimento desse contrato promessa e consequentemente perda de sinal, foi justificada a transferência de uma quantia para as contas do grupo Lena que ficou com o encargo de devolver o mesmo montante a Carlos Santos Silva ou a sociedades do mesmo, para este, por sua vez, fazer chegar o dinheiro a José Sócrates."