Sociedade

Histórico do MPLA admite uma ‘Comissão de Verdade’ sobre o golpe de 27 de Maio

Numa entrevista repleta de revelações, Lopo do Nascimento considera que o golpe de 27 de maio, liderado por Nito Alves, “contou com o apoio do KGB”, os serviços secretos da então União Soviética, “ou de elementos do KGB em Angola”

José Carlos Carvalho

“Uma ferida não sarada, que não se vê mas dói interiormente” – é como Lopo do Nascimento se refere ao golpe de 27 de Maio de 1977, a maior tragédia da história do MPLA, que poderá ter custado 30 mil mortos. O ex-primeiro-ministro de Angola considera este número “exagerado”, mas reconhece que “foi morta muita gente” – “não morreu, foi morta!” Deixa como sugestão a abertura “de um debate” sobre aqueles acontecimentos dramáticos que enlutaram a sociedade angolana, mediante a criação de uma “Comissão de Verdade, como houve na África do Sul”, para fazer o balanço e apaziguar os crimes do apartheid.

Numa entrevista repleta de revelações, concedida ao Expresso em Lisboa a propósito dos 40 anos da independência de Angola, Nascimento considera que o golpe, liderado por Nito Alves, “contou com o apoio do KGB”, os serviços secretos da então União Soviética, “ou de elementos do KGB em Angola”. Ele próprio, na qualidade de primeiro-ministro, deslocou-se a seguir a Moscovo, tendo apresentado ao líder soviético Leonid Brejnev “uma lista de membros do KGB que estavam metidos no golpe”, para serem retirados de Angola, o que aconteceu.

“Uma limpeza interna” feita pela DISA

Na interpretação deste quadro histórico do MPLA, o golpe foi aproveitado para efectuar uma “limpeza interna”, efectuada pela temível DISA, a Direcção de Informação e Segurança de Angola. Nascimento revela que ele próprio foi procurado em sua casa pela segurança do regime, por suspeita de “ligação aos fraccionistas”. Valeu-lhe a sua equipa de guarda-costas, chefiada por militares cubanos, que ameaçaram disparar sobre os homens da DISA. A seguir refugiou-se em casa do próprio Presidente da República, Agostinho Neto, no Futungo.

À data da independência, 11 de Novembro de 1975, Lopo do Nascimento era primeiro-ministro do Governo de Transição, tendo permanecido no cargo no primeiro governo do MPLA, até finais de 1978. Apesar de estar à frente do governo aquando do golpe, ignora o número de vítimas mortais. “Não sei. Nem ninguém sabe.” Foi depois ministro de várias pastas, governador da Huíla durante a guerra civil, secretário-geral do MPLA e deputado. Com 73 anos, empresário privado, Lopo do Nascimento retirou-se da vida política em 2012. “Gosto de sair pelos meus pés”, explicou.

Leia a entrevista com Lopo do Nascimento na Revista E da edição do Expresso de 7 de Novembro