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Editorial

Deixar arder

Os incêndios constituem um crime no qual quase todos somos cúmplices. Ano após ano, habituámo-nos 
ao espetáculo das chamas

Resolver o problema dos incêndios pode ser bastante mais simples do que parece. “Basta”, depois da apreciação do cadastro dos milhões de propriedades, proceder a um reordenamento do território que estabeleça áreas de intervenção e que as divida da forma mais segura. A tarefa parece ainda mais simplificada devido ao abandono de grandes áreas do interior de Portugal, assim como pelo fim de vários negócios associados à floresta, como o da resina. Porém, ainda está para vir o Governo que meta mãos à obra. Tocar na propriedade privada — mesmo que para resolver uma questão que a todos aflige nos meses de verão — seria entendido por muitos como um crime de bradar aos céus. A esse crime junta-se um outro associado ao valor afetivo de pequenos e grandes proprietários, que também impedem que qualquer Executivo venha “mexer no seu queijo”. Assim sendo, o espetáculo das labaredas que povoa os canais de televisão, os jornais e, nos últimos tempos, as redes sociais continua e continuará por muitos anos. A falta de resolução para o problema dos milhares de hectares que todos os anos ardem faz de todos nós cúmplices: governantes, proprietários e demais eleitores. Todos sabem no seu íntimo que vigora e continuará a vigorar a política do “deixa arder”.