Não é fácil contar o que “Emilia Pérez” tem, tal é desmedida a sua ambição. Mais fácil é falar do que lhe falta. É que Jacques Audiard, o autor de “Nos Meus Lábios”, “De Tanto Bater o Meu Coração Quase Parou” e “Um Profeta”, meteu desta vez as castas todas no blend, atirou-se ao teclado inteiro do piano num filme em montanha-russa, a deixar meia-plateia com a boca aberta de espanto – o que é isto, afinal? - e não há quem não o pergunte. Ópera pop com luta de classes em pano de fundo? Visto. Thriller de cartel de droga (é quase um subgénero...) alimentado por história de identidade de género? Visto. Produção maioritariamente francesa para filme falado em inglês e espanhol? Visto. Por fim, “Emilia Pérez” também é o que é naquilo em que mais se faz ouvir: um musical, estridente, por vezes quase no limite do audível, coisa voluntariamente acavalada, até porque a realidade que rodeia as personagens não é pera doce. Um musical – e o seu problema maior vem daqui. Não um daqueles com sonhos clássicos de Fred Astaire e Cyd Charisse, mas uma coisa puxada a ferros, pesadamente coreografada, a pensar talvez em certas óperas rock dos anos 70 e 80 - não é preciso ir tão longe, mas já houve quem lhe chamasse publicidade para marca de automóveis.
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O que é que "Emilia Pérez", um dos grandes vencedores dos Globos de Ouro, tem?
Premiado com quatro Globos de Ouro, incluindo os de Melhor Comédia/Musical e Melhor Atriz Secundária (Zoe Saldaña), "Emilia Pérez", do francês Jacques Audiard, é muita coisa ao mesmo tempo. Ópera pop com luta de classes, thriller de cartel de droga alimentado por história de identidade de género e um musical estridente, por vezes no limite do audível. Mas, apesar da performance fantástica de Karla Sofía Gascón, esgota-se na sua própria aura de grandeza