“A Flor do Buriti”, que o início do filme nos diz ser planta de cor vermelha, é um passo muito firme no percurso de Renée Nader Messora e João Salaviza, o trabalho mais consistente até à data do casal luso-brasileiro — e uma consequência direta do filme anterior da dupla, estreado em 2018, “Chuva É Cantoria na Aldeia dos Mortos”. Mas “A Flor...” vai mais longe e é mais completo a nível artístico e humano. Sente-se que houve uma sedimentação de ideias e um acumular natural de experiências de vida, fruto do tempo que João e Renée têm passado com o povo krahô. Renée trabalha com eles na terra indígena desde 2009, recorde-se. Salaviza receou estar a repetir-se depois do êxito internacional das curtas-metragens e da sua estreia na longa, “Montanha”. Nisto, já a paulista Renée lhe pegara na mão e o levara para Itacajá, no estado brasileiro de Tocantins, para junto dos krahôs, abrindo-lhe o horizonte naquele Brasil rural onde o casal passa, de resto, a maior parte do ano, com a filha de ambos, a pequena Mira. Deste lado do Atlântico, estacionam no apartamento da família em Cacilhas. Foi ali que com eles falámos, em maio do ano passado, em vésperas da partida para o Festival de Cannes onde o filme foi exibido em estreia, na competição da secção Un Certain Regard, vencendo na Croisette um Prix d'Ensemble que distinguiu o elenco. Tal como o anterior “Chuva...”, foi rodado em película 16 mm, apesar da logística complicada: é que já não existem laboratórios de revelação na América do Sul; à medida que filmavam, os cineastas iam enviando as latas de Itacajá para Palmas, depois São Paulo e viagem transatlântica a fazer escala em Lisboa, com destino aos laboratórios de Bucareste, na Roménia.
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“A Flor do Buriti” é a prova viva da resistência do povo indígena e um filme que merece ser descoberto
Focado em três períodos da existência dos krahô, no estado brasileiro de Tocantins, de 1940 até aos nossos dias, "A Flor do Buriti", o trabalho mais consistente até à data de Renée Nader Messora e João Salaviza, é uma elegia às múltiplas formas de resistência de todos os povos indígenas