Legislativas 2024

Estudo indica que eleitores do Chega são os que mais demonstram nostalgia e saudades do Salazar e do Estado Novo

Inquérito tentou medir nostalgia do antigo regime entre eleitores dos vários partidos. E concluiu que os simpatizantes do Chega são os que mais consideram que até 1974 Portugal estava melhor, que Salazar foi um dos melhores líderes da história, que os políticos portugueses deviam seguir os ideais de Salazar e que havia mais liberdade antes dos 25 de abril. “Com o tempo, a ‘vacinação’ contra legados autoritários acaba”, alerta o autor do estudo

As respostas a um estudo com nove perguntas concluiu que os eleitores do partido Chega são aqueles que mais demonstram nostalgia e saudades do Salazar e do Estado Novo. O inquérito envolveu 1500 pessoas e concluiu que aqueles que votam no partido de André Ventura concordam que Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa.

“Deus, Pátria e Família”, era assim a Trilogia de Salazar. André Ventura acrescentou-lhe o “Trabalho”. Já aí se viam semelhanças, mas agora há dados que o indicam. “O eleitorado do Chega tem uma imagem muito mais nostálgica do passado autoritário”, explica, ao Expresso, Luca Manucci, que lidera o projeto exploratório POLAR (Back to the future? Populism and the Legacies of Authoritarian Regimes), financiado pela FCT.

No total, o inquérito recolheu a opinião de 1500 pessoas e, para já, é possível concluir-se que há uma relação entre o partido em que dizem votar e a concordância com algumas frases. De forma qualitativa, percebe-se que os eleitores do Chega são os que mais demonstram nostalgia e saudades do Salazar e do Estado Novo. Vejamos, então, alguns exemplos.

“Até 1974, Portugal estava melhor porque se apoiava numa identidade nacional e em valores tradicionais”.

É à direita que se tende a concordar mais com a afirmação. Entre os que responderam que “concordam” e “concordam totalmente”, 62,18% são pessoas que dizem ir votar num partido de direita nas próximas eleições. No entanto, se fizermos uma avaliação partido a partido, o valor aumenta quando se trata de eleitores do Chega, quase 39%. Na mesma pergunta, os eleitores de centro (PS e PSD) representam 41% dos que responderam “discordo” e “discordo totalmente”.

Estes valores refletem-se quando é feita a média de respostas por partidos. O Chega é o único partido mais perto de concordar (3,34), notando-se uma clara diferença entre os partidos que se sentam à direita no parlamento e aqueles que se sentam à esquerda. A CDU e o BE são aqueles cujo eleitorado menos concordam com a informação.



“Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa”

Quando questionados se “Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa”, são os eleitores do Chega que voltam a concordar mais, 35% dos que respondem afirmativamente. Seguem-se simpatizantes do PSD (19%) e do PS (13%). Mais uma vez, quando calculada a média, o Chega é o único partido com um valor acima de 3 numa escala de 1 a 5. Voltando os partidos de esquerda a serem aqueles que menos concordam.


“Se os políticos portugueses seguissem os ideais de Salazar, Portugal reconquistaria a sua posição na arena internacional”

Outra pergunta que mostra a relação entre votar no Chega e ter uma nostalgia pelo antigo regime é a resposta a esta outra pergunta. No total, 115 eleitores do partido liderado por André Ventura escolheram a opção de “concordar” e “concordar fortemente” com esta frase.


“Apesar de vivermos atualmente num regime democrático liberal, perdemos algumas liberdades que eram permitidas durante o Estado Novo.”

Os eleitores do Chega são quem considera haver menos liberdade depois do 25 de abril. Para Luca Manuci este é um dado curioso: era algo de que já se estava à espera em Espanha – local onde também se está a fazer a mesma análise — , mas em Portugal não era bem assim. “Em Espanha há o conhecido franquismo sociológico e há a ideia de que havia coisas permitidas, como fumar, que já não o são”, explica.

Considerando que um total de 337 inquiridos concordam com a afirmação, 34% dos mesmos são eleitores do Chega. Seguindo-se os do PSD (18%) e do PS (12%). Já dentro daqueles que discordam (644 inquiridos), o destaque vai para o PS (25%).

Porque é que Portugal demorou mais do que o resto da Europa a assistir ao crescimento da extrema-direita?

Essencialmente pela memória e por uma democracia ainda “jovem”. “Há outros países europeus que acabaram com a ditadura em 1945, como a Itália. E foi possível ver que depois de um certo período a direita radical volta a subir”, explica Luca.

“Com o tempo, a ‘vacinação’ contra legados autoritários acaba”, conclui. É também com esta observação que Luca explica os próximos passos do projeto: verificar a tendência de respostas não só por partidos, mas por idades. “A minha hipótese é que esta avaliação positiva do passado autoritário não seja muito uma questão de pessoas velhas socializadas durante o salazarismo, mas mais uma questão de jovens que não têm esta estigmatização do passado autoritário”, refere.


Porquê o Chega e não outro partido autoritário e de direita radical?

O Chega não foi o primeiro partido autoritário a surgir em Portugal. Porque é que, por exemplo, o partido Ergue-te (antigo PNR) não teve o sucesso do Chega? A resposta pode estar nas “mais notícias” e “notícias positivas” nos média. O projeto fez “uma análise do discurso dos media em relação à direita radical”. Para o caso de estudo português foram considerados o jornal Público, o Correio da Manhã e o Jornal de Notícias.

“O êxito do Chega está ligado a dois assuntos”, diz. Primeiramente, e os dados preliminares mostram isso, “os média normalizaram o discurso do partido”. O partido Chega teve uma “ascensão nos média que não é comparável aos outros partidos de direita radical”. Mas Luca realça: “Não foi só em quantidade. É importante falar do tipo de artigos, são artigos muito mais positivos”, diz,