As respostas a um estudo com nove perguntas concluiu que os eleitores do partido Chega são aqueles que mais demonstram nostalgia e saudades do Salazar e do Estado Novo. O inquérito envolveu 1500 pessoas e concluiu que aqueles que votam no partido de André Ventura concordam que Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa.
“Deus, Pátria e Família”, era assim a Trilogia de Salazar. André Ventura acrescentou-lhe o “Trabalho”. Já aí se viam semelhanças, mas agora há dados que o indicam. “O eleitorado do Chega tem uma imagem muito mais nostálgica do passado autoritário”, explica, ao Expresso, Luca Manucci, que lidera o projeto exploratório POLAR (Back to the future? Populism and the Legacies of Authoritarian Regimes), financiado pela FCT.
No total, o inquérito recolheu a opinião de 1500 pessoas e, para já, é possível concluir-se que há uma relação entre o partido em que dizem votar e a concordância com algumas frases. De forma qualitativa, percebe-se que os eleitores do Chega são os que mais demonstram nostalgia e saudades do Salazar e do Estado Novo. Vejamos, então, alguns exemplos.
“Até 1974, Portugal estava melhor porque se apoiava numa identidade nacional e em valores tradicionais”.
É à direita que se tende a concordar mais com a afirmação. Entre os que responderam que “concordam” e “concordam totalmente”, 62,18% são pessoas que dizem ir votar num partido de direita nas próximas eleições. No entanto, se fizermos uma avaliação partido a partido, o valor aumenta quando se trata de eleitores do Chega, quase 39%. Na mesma pergunta, os eleitores de centro (PS e PSD) representam 41% dos que responderam “discordo” e “discordo totalmente”.
Estes valores refletem-se quando é feita a média de respostas por partidos. O Chega é o único partido mais perto de concordar (3,34), notando-se uma clara diferença entre os partidos que se sentam à direita no parlamento e aqueles que se sentam à esquerda. A CDU e o BE são aqueles cujo eleitorado menos concordam com a informação.
“Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa”
Quando questionados se “Salazar foi um dos melhores líderes políticos da história portuguesa”, são os eleitores do Chega que voltam a concordar mais, 35% dos que respondem afirmativamente. Seguem-se simpatizantes do PSD (19%) e do PS (13%). Mais uma vez, quando calculada a média, o Chega é o único partido com um valor acima de 3 numa escala de 1 a 5. Voltando os partidos de esquerda a serem aqueles que menos concordam.
“Se os políticos portugueses seguissem os ideais de Salazar, Portugal reconquistaria a sua posição na arena internacional”
Outra pergunta que mostra a relação entre votar no Chega e ter uma nostalgia pelo antigo regime é a resposta a esta outra pergunta. No total, 115 eleitores do partido liderado por André Ventura escolheram a opção de “concordar” e “concordar fortemente” com esta frase.
“Apesar de vivermos atualmente num regime democrático liberal, perdemos algumas liberdades que eram permitidas durante o Estado Novo.”
Os eleitores do Chega são quem considera haver menos liberdade depois do 25 de abril. Para Luca Manuci este é um dado curioso: era algo de que já se estava à espera em Espanha – local onde também se está a fazer a mesma análise — , mas em Portugal não era bem assim. “Em Espanha há o conhecido franquismo sociológico e há a ideia de que havia coisas permitidas, como fumar, que já não o são”, explica.
Considerando que um total de 337 inquiridos concordam com a afirmação, 34% dos mesmos são eleitores do Chega. Seguindo-se os do PSD (18%) e do PS (12%). Já dentro daqueles que discordam (644 inquiridos), o destaque vai para o PS (25%).
Porque é que Portugal demorou mais do que o resto da Europa a assistir ao crescimento da extrema-direita?
Essencialmente pela memória e por uma democracia ainda “jovem”. “Há outros países europeus que acabaram com a ditadura em 1945, como a Itália. E foi possível ver que depois de um certo período a direita radical volta a subir”, explica Luca.
“Com o tempo, a ‘vacinação’ contra legados autoritários acaba”, conclui. É também com esta observação que Luca explica os próximos passos do projeto: verificar a tendência de respostas não só por partidos, mas por idades. “A minha hipótese é que esta avaliação positiva do passado autoritário não seja muito uma questão de pessoas velhas socializadas durante o salazarismo, mas mais uma questão de jovens que não têm esta estigmatização do passado autoritário”, refere.
Porquê o Chega e não outro partido autoritário e de direita radical?
O Chega não foi o primeiro partido autoritário a surgir em Portugal. Porque é que, por exemplo, o partido Ergue-te (antigo PNR) não teve o sucesso do Chega? A resposta pode estar nas “mais notícias” e “notícias positivas” nos média. O projeto fez “uma análise do discurso dos media em relação à direita radical”. Para o caso de estudo português foram considerados o jornal Público, o Correio da Manhã e o Jornal de Notícias.
“O êxito do Chega está ligado a dois assuntos”, diz. Primeiramente, e os dados preliminares mostram isso, “os média normalizaram o discurso do partido”. O partido Chega teve uma “ascensão nos média que não é comparável aos outros partidos de direita radical”. Mas Luca realça: “Não foi só em quantidade. É importante falar do tipo de artigos, são artigos muito mais positivos”, diz,