Marcelo “falou com quem tinha de falar” para anunciar o veto político ao pacote legislativo da Habitação, a grande bandeira do Governo para fazer face a uma das mais graves crises da atualidade. E como foi o Parlamento que votou a versão final das propostas de lei, apenas com os votos da maioria socialista (e com a abstenção do PAN e do Livre), com quem Marcelo tinha formalmente de falar era com o presidente da Assembleia da República, a quem telefonou, e não com o primeiro-ministro, com quem, garante, não falou mesmo. Eis o novo normal da coabitação: sucessivas “divergências políticas manifestas”, iniciadas depois da não demissão de João Galamba, que, com o aproximar dos calendários eleitorais, se tornarão cada vez mais assumidas.
É pelo menos essa a convicção em São Bento. A dias de terminar agosto e recomeçar a atividade política, o Governo já antecipa um arranque de ano político e orçamental com toda a oposição — e o PR à cabeça — a puxar pela contestação dos vários sectores, dos médicos aos professores, passando pelos defensores do alojamento local, em contraste com o previsível anúncio de “boas notícias” no Orçamento do Estado. Com o primeiro-ministro de férias e votado ao silêncio sobre o mais recente embate, a ordem no núcleo duro por estes dias foi para realçar dois ou três aspetos particulares: em primeiro lugar, o Presidente da República fez questão de sublinhar que o problema do diploma não era de inconstitucionalidade; depois que, mesmo chumbando uma parte do pacote (que inclui medidas polémicas como o arrendamento coercivo e limites ao alojamento local), dava como certo que o PS o iria reconfirmar e obrigá-lo a promulgar. “No próprio veto, o PR diz que a única solução é a reconfirmação, porque não há alternativa”, interpreta um dirigente socialista de topo. Além do mais, “a maioria não pode ser estigmatizada”. Foi democraticamente eleita, não foi “imposta” por ninguém, nota outra fonte.