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Ventura defende conspiração que tem inspirado massacres

Chega importou teoria da grande substituição, que alega que europeus e americanos estão a ser substituídos por imigrantes não-brancos. É uma “falsidade” e resulta de “leitura enviesada”, diz demógrafa

Ventura recuperou, em maio, um vídeo com discurso proferido em outubro do ano passado
Ana Baião

É uma teoria conspirativa racista e xenófoba que tem servido de inspiração a vários assassínios em massa. É sucessivamente desacreditada, mas vai deixando lastro nos EUA e na Europa. E o Chega está apostado em que faça o seu caminho em Portugal. A teoria da grande substituição, designação usada pelo escritor francês Renaud Camus no livro “Le Grand Remplacement” (2011), alega que os europeus e americanos brancos estão a ser ativamente substituídos por imigrantes não-brancos. Em rigor, as raízes desta teoria contam mais de um século, tendo motivado políticas migratórias restritivas nos EUA e inspirado Hitler, mas é a Camus que a ultradireita mais tem recorrido, incluindo os recém-candidatos à presidência francesa Marine Le Pen e Éric Zemmour, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, e, por cá, André Ventura.

Em outubro, ainda deputado único do Chega, declarou no Parlamento existir “um problema estrutural” em Portugal e na União Europeia (UE): “a substituição demográfica”. Ventura pedia que não o apelidassem de “racista ou xenófobo” quando estava a defender uma teoria racista e xenófoba. (Camus já foi acusado de antissemitismo e chegou a ser condenado por incitamento ao ódio e à violência contra muçulmanos.) “A verdade é só uma: a UE, no seu conjunto, tem vindo a ser substituída demograficamente por filhos de imigrantes. Ninguém quererá que daqui a 20 anos a Europa seja composta maio­ritariamente por indivíduos vindos de outros continentes”, acrescentava Ventura. Acontece que a verdade que dizia ser “só uma” é, efetivamente, mentira. O vídeo destas declarações foi recuperado pelo próprio a 18 de maio, escassos quatro dias após o massacre de uma dezena de pessoas num supermercado de Buffalo, nos EUA. Antes, o atirador, de 18 anos, publicara um manifesto de 180 páginas em que se assumia supremacista branco e referia várias vezes a teoria da grande substituição.