A Assembleia do Livre, que terminou na madrugada desta sexta-feira, decidiu retirar a confiança política a Joacine Katar Moreira, após uma reunião que demorou mais de nove horas. A informação foi avançada pelo Público e entretanto confirmada pelo Expresso.
A decisão foi tomada por larga maioria com 83% dos votos (34 a favor e sete contra) . A Assembleia recém-eleita decidiu assim manter a decisão do órgão anterior, na reunião que decorreu a 13 de janeiro, perdendo o Livre a representação parlamentar.
A deputada – que não esteve presente na reunião extraordinária – vai assim passar à condição de não inscrita na Assembleia da República, uma vez que deixou claro que não irá renunciar ao seu lugar enquanto deputada.
“Não fomos nós que nos divorciamos de Joacine”
O porta-voz da direção do Livre, Pedro Mendonça, admitiu ao final da manhã que hoje é um “dia triste” para o partido, mas garantiu que a retirada da confiança política à deputada única era inevitável.
“Hoje não é um dia feliz para o partido. Nesta madrugada decidiu-se a retirada da confiança política à deputada única. Não foi uma decisão fácil, precipitada ou pouco discutida”, afirmou Pedro Mendonça, em conferência de imprensa na sede do Livre, sublinhando que este é um “momento difícil”, mas “necessário.”
Lembrando as dificuldades de comunicação e de articulação com a deputada, o porta-voz do Grupo de Contacto garantiu que esta decisão resulta da irresponsabilidade de Joacine Katar Moreira. “Não fomos nós que nos divorciamos de Joacine. Foi a deputada que se divorciou de nós logo após as eleições”, reforçou, frisando que as divergências que levaram à rutura “não são pessoais, mas políticas.”
A perda da representação parlamentar é uma consequência “gravosa”, reconhece o porta-voz da direção do Livre, defendendo contudo que o partido tem que ser fiel ao seu espírito colaborativo e à sua matriz de esquerda, verde e europeísta. “Tínhamos que que fazer uma escolha (...) e entre o mandato e os nossos valores, optámos pelos nossos valores”, justificou.
Questionado pelos jornalistas, o representante do Grupo de Contacto disse que foram enviados mails (com recibo de leitura) para a deputada a dar conta da retirada da confiança política, após Joacine recusar atender chamadas telefónicas.
Pedido de reunião com Ferro Rodrigues
Admitindo que se trata de uma situação “inédita” na democracia portuguesa, Pedro Mendonça avançou que a direção irá solicitar uma reunião com o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, para discutir o processo da perda de representação parlamentar.
Em plena polémica sobre as declarações “xenófobas” do líder do Chega, Pedro Mendonça assegurou, contudo, que o Livre continuará a apoiar a deputada na luta contra o fascismo, o racismo e os novos populismos.“"A retirada da confiança política não significa que a deputada não seja defendida dos ataques vis e antidemocráticos. Uma coisa são divergências políticas, outra é a decência em relação dos Direitos Humanos”, insistiu.
Embora o Livre reconheça que o método de escolha dos candidatos deve ser melhorado, o porta-voz da direção garantiu que o partido não irá recuar face às primárias abertas. “As primárias abertas do Livre são ideológicas, não vamos prescindir delas, no entanto, sabemos que também podem ser melhoradas. E é esse processo que vamos começar a fazer”, avançou.
O partido espera agora conseguir recuperar a credibilidade e aumentar a implantação territorial, após perder a representação parlamentar. “O Livre já foi dado como morto variadíssimas vezes e essa sentença de morte era manifestamente exagerada. Quero acreditar que quem achava que o partido tinha propostas credíveis vai continuar connosco”, rematou.
Os problemas de comunicação entre a deputada e o partido voltaram aliás a estar evidentes na quarta-feira devido à convocatória da reunião. Fonte oficial do Livre disse ao Expresso que Joacine foi convocada por duas vezes para a reunião, mas o assessor no parlamento, Rafael Esteves Martins, negou que a deputada tenha recebido qualquer convocatória.
Na deliberação da anterior Assembleia, o órgão máximo entre Congressos lamentava o constante "confronto" e "polarização" da deputada, sublinhando que Joacine Katar Moreira não demonstrava "qualquer vontade em entender a gravidade da sua postura, nem intenção de a alterar".