Daniel Sloss é reconhecido como um dos jovens humoristas mais talentosos da atualidade. Começou a fazer stand-up comedy com apenas 17 anos. Alcançou sucesso mundial, em 2018, com o lançamento na Netflix dos espetáculos “Dark” e “Jigsaw” - que levou mais de 300 mil casais a separarem-se. Atuou pela primeira vez em Portugal, em 2017, no Palco Comédia do NOS Alive. Regressou com “Hubris”, em 2021, esgotando cinco sessões no Tivoli, em Lisboa. Agora é a vez de “Can’t”, que vai apresentar nos Coliseus do Porto e de Lisboa, respetivamente nos dia 31 de agosto e 1 de setembro. Em conversa com Gustavo Carvalho, no podcast Humor À Primeira Vista, considera Ricardo Araújo Pereira melhor comediante do que si mesmo e destaca o jovem humorista português André de Freitas, declara-se ao público português, desvenda o tema do próximo espetáculo e explica porque a responsabilidade do comediante é atacar todos os lados do espetro político.
Na tua segunda atuação em Portugal, com "Hubris", pareceu-me que gostaste muito de estar cá. Há uma foto épica com alguns dos melhores comediantes portugueses, contigo e com o Kai Humphries (opening act). Ricardo Araújo Pereira, Bruno Nogueira, Salvador Martinha, Miguel Góis. E também com a Dona Custódia, uma cadela muito feliz do Ricardo Araújo Pereira. Como é que aconteceu essa ligação a comediantes portugueses?
Eu e o Kai adoramos o meio britânico, é muito forte, há comediantes brilhantes, mas metade deles são otários. Há muita competição e pode tornar-se complicado, com muita inveja à mistura. E não estou a dizer que não sou responsável por isso, também contribuo claramente. Mas para nós é sempre interessante visitar países onde a stand-up comedy é algo recente. Gosto de conhecer outros comediantes em geral, mas adoro conhecer comediantes de outros meios para poder comparar. Em que fase é que estão no vosso meio? Que tipo de comédia é que fazem? É sátira política? É clown? É stand-up puro e duro? E se é stand-up há alguma diferença na forma como os portugueses o fazem? De um ponto de vista linguístico, a comédia tem de ser diferente consoante a língua. A forma como se estruturam frases em alemão é muito diferente da do inglês. O revelar da piada pode ser mais difícil de concretizar numa certa língua. Posso falar sobre comédia durante horas e horas. Adoro falar sobre o meu trabalho e da ciência e da química de fazer piadas.
Ficas com uma ideia sobre o que está a acontecer em Portugal em termos de comédia.
Sim, fico a conhecer quem são os grandes comediantes, os mais famosos, os melhores. Alguém nos falou do Ricardo [Araújo Pereira]. Porque eu perguntei quem era o maior comediante português e disseram-me que era ele. E disse que adorava conhecê-lo, mesmo que fosse só um bocado nos bastidores. E obviamente, porque ele e a família são as pessoas mais gentis do mundo, receberam-nos para uma refeição incrível na sua linda casa. Ele adora charutos. Eu gosto de charutos, mas não assim tanto. Ele traz-me charutos super caros e eu disse-lhe: “Epá, não gastes os teus charutos bons em mim, de todo”. Ofereceu-me um livro incrível, acho que estou a três quartos do livro ainda, sobre o poeta português Pessoa.
Sim, Fernando Pessoa.
Li bastante do livro, porque foi um presente e estou muito grato por isso. E passámos o dia a beber e a conversar. A única coisa que tenho a dizer sobre o Ricardo é que ele sabia perfeitamente que eu tinha um espetáculo nessa noite e não foi tímido em continuar a oferecer-me vinho, independentemente da quantidade de álcool. “Tens de experimentar este licor” E eu dizia: “Ok, tens sorte que eu sou alcoólico, de outra forma seria algo muito pouco profissional”. Já passei tantas noites da minha vida bêbado em palco. Sei que outros comediantes têm medo e acham intimidante atuar assim, mas eu gosto de estar solto. E foi incrível, conhecemos a família. A comédia de outros países fascina-me. Uma das questões que mais me fazem é: “Viajas pelo mundo a atuar, quão diferente é o público de país para país?” E a resposta é: quase nada. Como estou numa fase da minha carreira em que onde quer que vá encontro sempre o meu público, porque tive a exposição da Netflix, da HBO, do Conan, acho que há mais diferença entre o público de segunda e de sábado, do que entre o público português e o russo, por exemplo.
Tens alguma piada de outro comediante que gostavas de ter escrito?
O bit do Jim Jefferies sobre o controlo de armas. Ou um que vi recentemente, do Shane Gillis. É um texto sobre o Donald Trump ser o presidente mais divertido para assassinar, só pelo som que ele faria quando levasse um tiro. Ia estar a discursar: “Tu és gay! Tu não prestas! Tu não vales nada.” O assassino ia na direção dele: “Reparem neste, não é uma boa pessoa.” E o assassino disparava e ele fazia: “Uhhh”. E o Shane faz este som tão engraçado e é uma imitação tão boa do Trump. E depois, acho que algo crucial na comédia é que tens de insultar os dois lados do espetro político. Podes ser de esquerda, de direita, ou de centro. A tua responsabilidade como comediante é atacar tudo, todos os lados. E portanto, no final desta piada ele diz: “E o Joe Biden acho que é o único presidente que podíamos assassinar com um murro.” Vais ter com ele e dizes: “Como é que está senhor presidente?” e “Bammm”.
Isso é muito bom.
Vi esta piada no outro dia, e o Dave Chappelle obrigou o Shane Gillis a subir a palco e contar essa piada no Comedy Cellar. O que deve ser um dos melhores sentimentos de sempre.
Oiça a versão em Inglês:
Gustavo Carvalho faz perguntas sobre comédia. O convidado responde. Sorriem… é humor à primeira vista. Oiça aqui mais episódios: