Joviana Benedito

A gíria de Quadrazais

Joviana Benedito

A gíria quadrazenha é um linguajar usado pelos habitantes de Quadrazais no concelho do Sabugal, sobretudo por contrabandistas e passadores, para iludir a guarda fiscal e os carabineiros.

Um contrabando furtivo e ilegal fazia-se ao longo de toda a fronteira com Espanha, mas em Quadrazais era uma actividade praticada por quase todos, era um modo de vida que rendia mais do que a terra seca e quase estéril, mesmo que muito trabalhada, que não dava sustento para famílias numerosas como era habitual nesse tempo. Os homens e algumas poucas mulheres enfrentavam os obstáculos naturais e mantinham-se alerta para evitar encontros com os guardas de cá ou de lá. Percorriam quilómetros por trilhos que mudavam frequentemente para desviar as atenções.

Levavam alguns produtos como ovos, sabão e café e traziam cortes de "pana" (bombazina) e de seda, fardos de bacalhau, boinas bascas, casacas, alpercatas, etc e mais tarde o tabaco.Para se entenderem entre si e não serem compreendidos pelos seus concorrentes e pela guarda desenvolveram um linguajar próprio, adequado à necessidade de sobreviver a negociar.

Exemplos da gíria quadrazenha:

Alâmpio - azeite; amatriz - amanhã; assuquir - comer; briol - vinho; calcantas - sapatos, pés; cambalache - negócio; cosco - tostão; esgueirante - ladrão; esquilona - hora; facho - guarda; fuganta - pistola; galhal - muito dinheiro; moienes - eu; vunhir - vir

"Amatriz meia choina maquinamos tótios Reta Francha. De galhal leva cada cinquenta chulos, artife, fugantes e baril chingato para andante". Que, é como quem diz: "Amanhã, à meia-noite, partimos todos para Espanha. Cada um leva cinquenta duros, pão, carne, pistolas e bom vinho para a viagem".

A experiência de escapar à guarda e os contactos com os do lado de lá fez de alguns contrabandistas passadores de emigrantes, actividade que também rendia muito. Foi uma diáspora dos necessitados que durou cerca de vinte anos que começou pelas zonas raianas e se estendeu a todo o país, "quem podia dava o salto" na esperança de encontrar uma vida melhor.

Nota: Há estudos sobre os dialectos da língua portugesa feitos por Leite de Vasconcelos, Paiva Boléo e Lindley Sintra.

Pinharanda Gomes, natural de Quadrazais também se debruçou sobre o falar da sua terra e existem também alguns trabalhos académicos sobre este tema. Na Net encontram-se blogues com contribuições para que esta gíria não morra.

GOMES, Pinharanda (1964), "A Gíria de Quadrazais" Sep. da Revista de Portugal.

Série A - Língua Portuguesa, XXIX. Lisboa.

MAIA, Clarinda de Azevedo tem vários trabalhos sobre os falares fronteiriços.

BRAGA, Franklim Costa, tese de licenciatura em fil românica com um cap sobre a gíria quadrazenha.

Joviana Benedito

Profª. aposentada do Ensino Sec. e autora