Opinião

Coesão territorial: um país com menos de 600 quilómetros de comprimento e que ainda assim desperdiça centenas

“Enquanto se discute avidamente a implementação de projetos de grande envergadura, como o TGV ao longo do litoral (sem desmérito dessa iniciativa) muitas vezes nos esquecemos de infraestruturas básicas necessárias para servir adequadamente as populações do interior”, critica o presidente do Conselho Nacional da Juventude

No dia 10 de março, serão eleitos novos representantes, espero que sejam eles quem forem, que reconheçam que Portugal é ainda um país com uma grande diversidade de realidades regionais, onde as disparidades entre litoral e interior são evidentes e impactantes. Essas disparidades permeiam todos os aspectos da vida, desde a mobilidade até às oportunidades de emprego, refletindo um desequilíbrio profundo que desfavorece o interior do país.

É importante não esquecermos que quando discutimos políticas públicas em Portugal, se na nossa capital o PIB per capita se situa nos 26.000€, nas nossas regiões mais pobres verificamos valores que rondam metade desse valor, curiosamente, todas elas interior do nosso território.

Enquanto se discute avidamente a implementação de projetos de grande envergadura, como o TGV ao longo do litoral (sem desmérito dessa iniciativa) muitas vezes nos esquecemos de infraestruturas básicas necessárias para servir adequadamente as populações do interior.

E como quem tenta apagar um incêndio com um copo de água, atira-se para cima da mesa a eliminação de portagens em estradas do interior do país. Não quero com isto dizer que não seria um passo relevante, aliás considero, lamentavelmente, que vem tarde e é sem dúvida uma ajuda para tornar o interior do nosso país mais acessível, em ambos os sentidos.

Contudo, a falta de investimento em transportes públicos eficientes no interior do país, e serviços básicos como saúde e educação continuarão a constituir o mais difícil obstáculo à vida das comunidades do interior. Além disso, a ausência de incentivos eficazes para o desenvolvimento de indústrias e empresas nestas regiões do país serve apenas para perpetuar o ciclo de estagnação económica que verificamos.

Por conseguinte, é essencial abordar de forma abrangente o tema das oportunidades para os residentes do interior. O papel do Estado Social assenta no reduzir das diferenças de oportunidade à nascença de cada indivíduo. Nesta circunstância, considero que não se pode apenas mitigar as discrepâncias entre as diferentes realidades de cada indivíduo, através de serviços públicos. Pese embora não tenhamos garantido sequer isso, como referi acima, o interior do nosso país precisa de mais do que isso, precisa de um sério estímulo para o crescimento e desenvolvimento e isso implica não apenas em políticas de redistribuição de recursos, mas também iniciativas concretas de desenvolvimento regional estratégico que promova a criação de emprego e a formação profissional.

A falta de acesso a oportunidades amplia desigualdades, visto que limita a exposição das pessoas a diversas experiências e oportunidades de crescimento pessoal. Neste contexto, é essencial que Portugal adote uma abordagem inclusiva, pensando estrategicamente em todas as regiões e comprometendo-se enquanto país a promover um avanço consistente na valorização do interior.

Para o crescimento de Portugal, referindo-me a todo o território que essa palavra engloba, é fundamental reconhecer e enfrentar as desigualdades que existem. Devemos comprometer-nos a construir um país mais equilibrado, onde todas as regiões tenham a oportunidade de se desenvolver e contribuir para o bem-estar da nossa população. O nosso país não pode nem deve, a custo do seu futuro desenvolvimento, permanecer refém de duas ou três regiões que absorvem a larga maioria do desenvolvimento económico e sobrecarregadas. É imperativo reconhecermos que precisamos de começar a pensar em lógicas de desenvolvimento socialmente sustentáveis, que não assentam na concentração da indústria ou tecido empresarial, com as duras consequências que isso trás, como é o caso da crise da habitação.

Portugal é um país com menos de 600 quilómetros de comprimento e ainda assim conseguimos desperdiçar centenas.

O futuro de Portugal só pode ser assegurado com uma discussão séria e efetiva sobre a regionalização, sobre a coesão territorial, como formas de contribuir para um desenvolvimento mais sustentável, inclusivo e que se agarre às oportunidades que o seu território oferece, garantindo a participação de toda a população, porque os crescimentos económicos anunciados só o são de facto quando são sentidos por todos.

Ao longo das próximas semanas, Rui Oliveira escreve sobre os temas que o Conselho Nacional da Juventude, enquanto órgão representante dos jovens, identifica como prioritários no pós-eleições. Depois dos Salários e Oportunidades, Habitação e este terceiro texto sobre Coesão Territorial, seguir-se-ão a Educação, e a Democracia.