Exclusivo

Opinião

Épater le bourgeois, ou o grito pelo sangue

A credibilidade mora no sentido, não tanto no simples gesto. Reduzido a uma estratégia de entretenimento, o gesto esvai-se na banalidade. É o caso da polémica sobre se “devia ter havido sangue, devia ter havido mortos” na revolução do 25 de Abril. Vagamente inconsequente, não é?

A expressão épater le bourgeois, ou surpreender o burguês, terá sido utilizada por Charles Baudelaire, mas diversas fontes relacionam-na, de modo mais amplo, com uma atitude geracional, a de poetas malditos do final do século XIX, apelidados com ligeireza de decadentistas, como Arthur Rimbaud, ou mesmo Oscar Wilde. Precursores do dada ou do surrealismo, dizem-nos.

Se bem que a origem exata da frase seja obscura e, portanto, incerta, pode ter sido usada por Baudelaire para descrever a estratégia comercial dos artistas plásticos e das suas galerias, que teriam que exibir objetos surpreendentes para chamar a atenção dos eventuais compradores. Não basta mostrar um urinol, teria ele dito, é preciso ser ainda mais provocador.

Para combater o tédio, privilégio do dinheiro, a arte deveria chocar os aperaltados clientes das galerias. Devia fazer-se ouvir, mesmo que fosse, e até seria melhor se fosse pela rejeição pela sociedade bem pensante (desde que um generoso investidor apreciasse ser a exceção).