Muito se tem escrito e falado nos últimos tempos sobre Comunicação no contexto da pandemia de covid-19. Sobretudo porque se pretende fazer desta área tão importante mais uma arma de arremesso à DGS e ao Ministério da Saúde.
Mas da mesma forma que vemos emergir uma série de proto especialistas no vírus e na forma de o combater, começa a ser infindável a lista de súbitos especialistas em Comunicacão em Saúde. Nada que surpreenda: afinal, de saúde e de comunicação todos achamos que sabemos um pouco.
Mas a confusão de conceitos em torno desta temática compele-me a escrever estas linhas. E começo por uma breve declaração de interesses: sou funcionário do Ministério da Saúde e desempenhei já vários cargos em instituições da saúde na área da Comunicação, o que não me impedirá de dizer aquilo que penso.
Não, a Comunicação em Saúde não tem sido “o problema” na gestão da pandemia. Existem hoje, felizmente, profissionais de comunicação muito capazes e competentes em várias instituições no universo da saúde, neste caso na DGS e no próprio Ministério da Saúde.
Conheço-os praticamente a todos e posso avalizar a sua capacidade profissional. Para atestar esta minha afirmação basta analisar desapaixonadamente as inúmeras iniciativas e materiais comunicacionais que têm sido produzidos a propósito deste coronavírus.
Foi dada uma resposta competente e atempada neste domínio, disponibilizando-se materiais informativos de qualidade (criados em função da evolução da situação pandémica) para uma utilização multicanal: seja em formato papel, no digital, nas tvs e nas rádios. Basta que entremos num qualquer estabelecimento aberto ao público para encontrarmos informação disponibilizada pelas instituições públicas com as medidas de autoproteção.
Ainda no anterior fim de semana se assistiu a uma presença massiva de anúncios na televisão, da autoria do Ministério da Saúde, sobre a covid-19, numa muito bem desenhada campanha que coincidiu com o primeiro fim de semana de recolher obrigatório. Só não os terá visto quem não quer.
Há a assinalar ainda o funcionamento em rede das várias instituições públicas na área da saúde - hospitais, Institutos públicos, entre outras - na difusão dos referidos materiais comunicacionais que têm sido produzidos. Estas mensagens chegaram, por esta via, a milhões de cidadãos, que estão hoje seguramente bem capacitados para lidar com este vírus.
Não tenho dúvidas que os cidadãos sabem hoje muito bem o que fazer no contexto de pandemia da covid-19: lavar regularmente as mãos, usar máscara e manter o distanciamento social. E o mesmo se aplica aos principais sinais e sintomas da doença.
Sendo esta uma sólida constatação, temos aqui uma forte evidência de que a mensagem chegou, efetivamente, às pessoas. Assim, uma vez que tal não terá acontecido por intervenção divina, o mérito vai inteiro para a estratégia que foi desenhada e concretizada pelos especialistas de Comunicação em Saúde.
Impõe-se também uma palavra para destacar a transparência que desde o início tem sido colocada na informação ao público. Nem todos os países têm seguido os passos de Portugal, que desde o primeiro dia dá a conhecer o número de casos, a sua localização geográfica, o número de doentes internados e o número de óbitos, só para nomear alguns dos indicadores divulgados. Não vi, até ao momento, ninguém colocar em causa a veracidade dessas informações. Também aqui se seguiu uma máxima da Comunicação em contexto de crise: a informação tem de ser rigorosa e credível.
Tal é uma prova irrefutável da responsabilidade e sentido de serviço público que têm sido tidos em conta na prática comunicacional neste domínio.
Responsáveis técnicos dos serviços públicos e a equipa política do Ministério da Saúde têm sido exemplares em dar a cara perante o público. Com especial destaque, na opinião de quem vos escreve estas linhas, para a serenidade e presença de espírito da ministra da Saúde.
Nenhum destes responsáveis se escondeu perante os problemas e as dificuldades. Também aqui, nada a apontar, antes pelo contrário.
Tudo correu bem então? Seguramente que perante um problema de tamanha magnitude como uma pandemia, há sempre coisas que podiam correr melhor.
Há seguramente muitas lições a aprender para o futuro e acredito que, com tempo, isso será feito. Esse é, no entanto, tema para um outro artigo.
Os ventos mudaram em poucos meses e até a atitude inicialmente cooperante dos media mudou. Também isso é perfeitamente natural perante o evoluir da situação pandémica.
A questão, neste momento, joga-se mais no domínio da gestão das expectativas ao nível político (perante os desafios económicos e sociais que se adivinham) do que ao nível da Comunicação em Saúde. À política o que é da política, não se a confunda com Comunicação em Saúde.
Neste último domínio, existe competência para continuar a comunicar de forma eficaz com os cidadãos. Deixem os especialistas (os da área e que percebem verdadeiramente do assunto) continuar a trabalhar a Comunicação e não será por isso que não venceremos o maior desafio coletivo das nossas vidas.
Mas enquanto se persistir no erro de confundir Comunicação em Saúde com Comunicação Política, continuaremos a confundir alhos com bugalhos. Mas, quando o objetivo é fazer crítica política, vale tudo...