O evento: afinal a Justiça
Depois de 21 dias de detenção, os suspeitos da operação ainda sem nome na Madeira saíram em liberdade com a medida de coação mais suave de todas: termo de identidade e residência. O juiz de instrução, por sua vez, negou quaisquer indícios de corrupção na investigação que derrubou o governo regional da Madeira e o presidente da Câmara do Funchal.
Os efeitos políticos do acontecimento não se ficaram pela ilha, nem tão-pouco pelo PSD. Pedro Nuno Santos, que vinha recusando reagir a casos concretos na Justiça, cedeu à pressão do seu partido (Santos Silva, Ferro, Ana Catarina Mendes) e acabou por manifestar estupefação com o sucedido. O reconhecimento que há algo não-normal a acontecer já é transversal nos dois principais partidos. E a necessidade de um pacto de Justiça o mais transversal possível ‒ com partidos e players do sistema judicial ‒ é até reconhecida pela Iniciativa Liberal.
O PS, cujo secretário-geral evitou a tudo o custo trazer a operação que fez cair António Costa para a campanha, e o PSD, cujo líder nunca quis uma vitória devida a um processo judicial, vão acabar a conversar sobre o que menos queriam: a Justiça.
O protagonista: afinal um primeiro-ministro
Beneficiando das baixas expectativas ‒ e humildes sondagens do seu partido ‒, Luís Montenegro mostrou uma imagem de serenidade nos embates que travou da esquerda à direita. Com programa e pose, o líder do PSD afirmou-se visualmente como candidato a primeiro-ministro como antes ainda não conseguira. Se tal se reflete nas urnas, é ainda um mistério. Mas a capacidade de persistir numa estratégia de posicionamento ao centro sem deixar de trazer propostas para cima da mesa ficou patente. O ex-líder parlamentar cumpriu o que a sua antiga vocação já lhe proporcionara: é um bom debatente.
O inusitado: afinal um ativista
Das catacumbas da sua reforma política quem surgiu na pré-campanha ‒ não para apoiar o seu partido, mas para atacar a Justiça ‒ foi Rui Rio. Numa espampanante entrevista à RTP 2, o ex-líder dos sociais-democratas fez uma misturada do sistema judicial português, confundindo processos arquivados com absolvições e processos em curso ‒ e em segredo de Justiça ‒ com os demais. Exigir a demissão de uma Procuradora-Geral da República em ambiente eleitoral é uma irresponsabilidade institucional que só confirma a ausência de dimensão que Rio teima em manter. Felizmente, faz parte do passado da política nacional.
A sugestão: The Melody At Night, With You
Num momento de rebuliço generalizado, poucas coisas são tão reconfortantes quanto a música. The Melody At Night, With You é um álbum gravado em casa, no ano de 1999, que o pianista Keith Jarrett dedicou à mulher, então doente. É um dos discos mais tristes ‒ mas mais bonitos ‒ que já ouvi. E deixo-o aqui, consigo.
Pode ouvir aqui no Spotify e aqui no Youtube.
Até para a semana