Boa tarde.
No verão, como em tudo, há quem veja o copo meio cheio e meio vazio. Os primeiros congratulam-se, por estes dias, com as temperaturas escaldantes que não deixarão Portugal Continental tão cedo; os segundos angustiam-se com os dias minguantes, antecipando a chegada do outono, daqui a pouco mais de um mês.
Desta que vos escreve, e que na verdade aprecia a sensatez térmica da meia-estação, fica uma dica: enquanto o verão, ou outra temporada do vosso agrado, durar, o melhor é aproveitar.
Na música, verão é sinónimo de festivais, e no Alto Minho decorre por estes dias o festival mais verde do país. Ontem, os Vampire Weekend foram reis no Vodafone Paredes de Coura; hoje, a novata Lola Young e os ‘vizinhos’ Glockenwise, de Barcelos, deverão animar as hostes. Pelo anfiteatro natural que até sábado recebe concertos de Air, Franz Ferdinand ou Sharon Van Etten andam, também, os meus companheiros de redação, trazendo-lhe as melhores prosas e imagens do festival.
Este ano, fiquei em terra, mas com a memória bem viva de verões passados nas margens do rio Coura. Em 2018, por exemplo, por lá entrevistei Lucy Dacus, cantora-compositora que acabara de lançar o segundo álbum e me falou não só de música, como dos seus livros favoritos.
“Intenso, negro, estranho”: foi esta a descrição que a doce Lucy fez de “Her Body and Other Parties”, coleção de contos de Carmen Maria Machado que não tardei a querer ler. A estranheza confirma-se, mas o humor ilumina estas histórias em que está tudo bem, aparte aquele pormenor absurdo, aquele segredo que nunca se chega a contar por palavras, aquele trauma que é pessoal mas transmissível, por vezes a toda a sociedade.
Desses contos escritos em 2017, um ficou-me na memória. Chama-se “Real Women Have Bodies” e nele, mercê de uma epidemia apocalíptica, as mulheres estão a desaparecer. Literalmente. E apesar de outras mulheres, ainda visíveis nos seus contornos, as quererem ajudar, algumas não querem - não sabem? - voltar.
Para celebrar o corpo de forma mais convencional (e sensual), recomendo o disco mais recente de Zé Ibarra, músico brasileiro com quem falámos há meses e que em “Afim” - título mais sugestivo é difícil - abraça um som cheio, expansivo, quente. Era maio quando o carioca nos disse: “Nunca nos vamos livrar do nosso corpo. E o nosso corpo é um corpo animal, ainda. Um corpo que precisa de cheiro, toque, amor. Medo, risco”. Se procura uma porta de entrada no álbum, abra ‘Transe’ ou ‘Segredo’, versão da canção da jovem Sophia Chablau, sobre a qual Zé Ibarra confessou: “A música é sensual e fala de adultério. Eu nunca conseguiria escrever aquilo, não consigo. Mas ela consegue, e é lindo. Eu pego e faço daquilo uma coisa diferente, que ela não poderia fazer, mas eu também não poderia compor a canção.”
Para arrefecer (de medo), Rui Pedro Tendinha recomenda que vá ao cinema ver “Together - Juntos”, fenómeno do cinema de terror de autor, com ecos de Cronenberg na exploração - lá está - do corpo humano, no seu mais belo e grotesco. “Michael Shanks assume o registo do body horror, ao mesmo tempo que aborda as novas relações nos casais de millennials, da falta de atração às dinâmicas da responsabilidade”, pode ler-se no texto que também lhe mostra o trailer.
Por agora fico por aqui. Veja abaixo mais sugestões para os próximos dias, dos palcos aos museus, e tenha um excelente fim de semana!