O fim de semana são dois dias

Duas ou três histórias de vida para procurar na Feira do Livro de Lisboa

O Parque Eduardo VII recebe até 22 de junho a 95ª Feira do Livro de Lisboa
Matilde Fieschi

É uma romaria que se repete a cada ano, sem nunca cansar os amantes de livros: a Feira do Livro de Lisboa abriu portas ontem e pode ser visitada até 22 de junho, oferecendo, este ano, 350 pavilhões de best sellers e pérolas escondidas.

Ainda não pude deslocar-me até ao Parque Eduardo VII, mas gostaria de recomendar duas ou três obras – curiosamente, todas em bom português do Brasil – que fazem aquilo que mais me encanta: contar histórias com gente dentro.

Começo por “A Chave de Casa”, primeiro romance de Tatiana Salem Levy, agora reeditado pela Elsinore em Portugal, onde se encontrava esgotado. Em 2007, a autora apresentou-se ao mundo com este livro desenhado em vários planos: no primeiro, a morte da sua mãe, que a deixou num torpor apático; depois, e em alternância, as memórias de uma paixão avassaladora (e, mais tarde, tóxica), e uma viagem à Turquia, em busca dos seus antepassados, que duas gerações antes haviam rumado ao Brasil. Com alguns elementos biográficos, “A Chave de Casa” valeu a Tatiana Salem Levy importantes prémios e fascina pela forma como salta entre espaços, tempos e estados de espírito diferentes, sem perder identidade.

100% biográfico é “Estrela Solitária - Um Brasileiro Chamado Garrincha”, o épico de Ruy de Castro sobre a lenda do futebol verde e amarelo. Li-o há alguns anos e, mesmo não sendo a maior aficionada do desporto-rei, dei por mim viciada nestas mais de 500 páginas obsessivas, muitas vezes hilariantes e tantas outras trágicas. Além das respostas que dá, a biografia levanta várias questões: o que faz de alguém extraordinário numa área (e não raras vezes desastroso em todas as outras)? Poderia esta história ter acontecido noutro tempo, e não naquele em que jogadores da bola assinavam contratos em branco e de cruz? Editado em Portugal pela Tinta da China, "Estrela Solitária" é também uma mini-história do Brasil do século XX e um retrato alucinante da trajetória de duas figuras maiores do que a vida: Garrincha, que ganhou duas copas do mundo com as pernas tortas, mas também Elza Soares, cantora e amor da sua vida, apesar do triste desfecho da sua relação.

Termino o saltinho ao outro lado do Atlântico com “Dia Um”, primeiro romance de Thiago Camelo, que antes escrevera já três livros de poesia. Mais uma vez, esta é uma obra de inspiração biográfica, embora o autor recuse o rótulo de autoficção. Partindo do suicídio do seu irmão mais velho, o narrador analisa os ramos & a seiva da família que é a sua.

A ação passa-se no Rio de Janeiro e um pouquito em Lisboa, mas sobretudo na cabeça do narrador, numa viagem onde - como na mente de qualquer introvertido - há espaço para filosofia e psicologia, mas também idas à praia, pilates com velhotas e muito futebol.

“Dia Um”, do meu amigo Thiago Camelo, pode ser encomendado na Livraria da Travessa, em Lisboa.

Despeço-me com desejos de um fim de semana feliz e alguns concertos que valerá a pena espreitar, de norte a sul de Portugal: a cabo-verdiana Mayra Andrade na Casa da Música, no Porto, esta quinta-feira; o brasileiro Criolo no Encontro de Culturas de Serpa, na sexta; A Garota Não no Centro de Artes de Vale de Cambra, também na sexta, e Jorge Palma na Rádio Faneca, em Ílhavo, no sábado.

Continue a acompanhar-nos no Expresso, na Blitz e ainda no Expressinho e no SIC Explica-me, os dois projetos do Grupo Impresa pensados exclusivamente para crianças e jovens e que ajudam os mais novos a compreender as notícias, com artigos adaptados, que “despertam curiosidade e formam cidadãos informados”.

Até à próxima quinta-feira!

O fim de semana são dois dias