Ouvimos e não julgamos
O objetivo desta trend é ouvir os pecados polémicos de um amigo ou as opiniões pouco corretas de uma amiga, seja o que for. Assim, o interlocutor pode contar-nos algo socialmente censurável, tendo como segurança o compromisso inicial, “ouvimos e não julgamos”, e, por isso mesmo, não podemos julgar, reagir, manifestar qualquer tipo de opinião. É um joguinho com graça, sobretudo para auto humilhação. Felizmente, como sociedade e, sobretudo, enquanto Democracia, julgamos. Seja para absolver quem é inocente ou para condenar quem o deve ser.
Nas últimas horas e nas próximas - que, na verdade, vão ser dias, potencialmente, semanas, talvez meses - sentam-se nos bancos dos réus José Sócrates e Jair Bolsonaro. Além da letra inicial do nome próprio e da situação em que se encontram, de acusados, pouco mais os une. Estão em continentes diferentes, a cerca de seis mil quilómetros de distância, a serem julgados por sistemas judiciais com abordagens bem diferentes e, enquanto ao primeiro são imputados 22 crimes de corrupção, fraude e branqueamento, no caso do segundo são os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e o de golpe de Estado que o levam ao banco dos réus. Une-os só mais uma coisa: o mediatismo dos respetivos julgamentos, devido aos cargos públicos que ocuparam. Sócrates como primeiro-ministro português, Bolsonaro como presidente do Brasil.
Usemos o critério de proximidade e comecemos por José Sócrates. A sessão que marcou o reinício do julgamento da Operação Marquês, acompanhada pelos jornalistas Rui Gustavo e Nuno Fox, “não desiludiu quem gosta de previsibilidade: Sócrates acusou, foi repreendido, trouxe factos novos que o tribunal diz que estão na acusação e continua sem ser confrontado com provas de corrupção”. E à saída, o antigo primeiro-ministro rejubilou por ter demonstrado “o absurdo da acusação”. O melhor é ler sobre tudo o que aconteceu em mais uma audiência, e pode também espreitar aqui tudo o que foi acontecendo ao longo do dia dentro do tribunal, numa atualização ao minuto.
De Lisboa para Brasília, onde arrancou um julgamento inédito, com vários detalhes que prometem fazer história e marcar a justiça brasileira. O Supremo Tribunal Federal decide se Bolsonaro, e mais sete acusados, na maioria militares de alta patente, cometeram crimes de tentativa de golpe e destruição do Estado democrático. Pode compreender o caso, com muitas particularidades, explicadas aqui, ponto por ponto, num artigo assinado pela jornalista Christiana Martins.
Se tudo correr sem maiores incidentes, o processo pode ficar concluído ainda em 2025, como deseja o juiz-relator, Alexandre de Moraes, que não quer ver este julgamento a interferir nas eleições presidenciais de 2026. Mas entre jurados em desacordo ou pedidos de recurso, tudo pode acontecer.
OUTRAS NOTÍCIAS
⬆️ Propinas Desde 2020 que o valor máximo anual se mantinha inalterado nos €697 para licenciaturas e mestrados integrados.O Ministro anuncia agora o descongelamento, associando o aumento ao valor da inflação em 2025. Nos mestrados não haverá limites à subida, explica a Isabel Leiria neste texto. Verbas para a ação social vão aumentar 43%. Fernando Alexandre adianta ainda que recém-diplomados terão de optar entre IRS Jovem ou devolução das propinas.
🇦🇫 Afeganistão Em dois dias, dois sismos de grande intensidade atingiram o leste do país. As autoridades confirmaram já a morte de pelo menos 1400 pessoas e mais de três mil feridos. O epicentro de ambos os terramotos foi em Jalalabad, capital da província de Nangarhar.
🔍 Justiça A Polícia Judiciária está a acelerar a investigação ao caso Rui Rio, tendo havido um reforço de meios humanos e materiais para fechar o caso nos próximos meses, pode ler-se neste artigo assinado pelo Hugo Franco. Procuradora do Ministério Público considerou “graves” as suspeitas que levaram a PJ a realizar as buscas no verão de 2023 a casa do ex-presidente do PSD.
🏀 EuroBasket O quinto e último encontro de Portugal na fase de grupos do Europeu de basquetebol é esta quarta-feira (12h45, RTP2), contra a Estónia. A seleção nacional está obrigada a vencer para seguir na prova e Henri Drell, um dos melhores jogadores estonianos, admitiu que o público caseiro pode jogar contra eles. Entretanto, enquanto não há jogo, recorde aqui as crónicas dos jogos anteriores, assinadas pela Lídia Paralta Gomes e pelo Francisco Martins: contra a Letónia, Turquia e Sérvia.
FRASES
“EUA não podem ter, nas Caraíbas, um narco-Estado aliado da China, da Rússia e do Irão” - Fabián Calle, analista de política internacional, especializado em temas de Segurança e Defesa
“Os pacientes estão magros, os médicos que conheci em 2023 perderam 20 quilos” - François Jourdel, cirurgião ortopédico de 54 anos e veterano em cenários de guerra, está atualmente em Gaza
“Se, Deus me livre, houver uma tragédia terrível, não consigo pensar em melhor treino em funções do que o que recebi nos últimos 200 dias” - JD Vance, vice-presidente dos EUA, após os rumores de que Donald Trump tinha sofrido uma série de enfartes e, por isso, estivera vários dias sem agenda
PODCASTS
👨🏼🏫 Expresso da Manhã O ano letivo começa na próxima semana e, entre outras coisas, significa que o trânsito nas cidades e vilas, de norte a sul de Portugal, volta a ficar mais complicado. No Expresso da Manhã, Paulo Baldaia conversa com a jornalista Isabel Leiria, num episódio com a sonoplastia de Gustavo Carvalho.
🔁 “A História Repete-se” Kamikazes, harakiris e as bombas atómicas: a II Guerra Mundial no Pacífico e a capitulação do Japão (1941-1945). Neste episódio (com a sonoplastia de Gustavo Carvalho), Henrique Monteiro e Lourenço Pereira Coutinho convidam o jornalista Rui Cardoso, um estudioso da história militar da época da II Guerra Mundial, para conversar sobre a guerra no Pacífico, entre os Estados Unidos e o Japão.
💸 Contas Poupança Pedir fatura com número de contribuinte é uma das formas mais eficazes de aumentar o nosso reembolso do IRS ou de pagarmos menos impostos. Mas há um ouvinte acha que não vale a pena. Será que é preciso fazer melhor as contas? Há ainda muitas pessoas a confundir duas deduções diferentes. Pedro Anderson fala sobre isso neste episódio, que conta com a sonoplastia de Filipe Cruz.
🌳 Liga dos Inovadores Aos 155 anos de idade a Corticeira Amorim procura acelerar o crescimento dos sobreiros e a extração da cortiça de forma a tornar-se mais produtiva. António Rios Amorim preside à empresa desde 2001 e veioà Liga dos Inovadores conversar com Elisabete Miranda e Pedro Lima para apresentar as inovações que a sua empresa tem desenvolvido: uma das mais recentes ajudou a cortiça a evitar o declínio com o fim do chamado ‘gosto a rolha’. A sonoplastia do episódio é de Hugo Oliveira.
O QUE ANDO A LER
“Remédio contra o Amor” (Quetzal Editores, 2024), Ovídeo
Apresenta-se como o remédio para fazer face “às dores e vicissitudes dos males de amor”, lê-se rapidamente num par de horas e deixa-nos a pensar que, talvez, mesmo há milhares de anos, a essência das relações humanas não esteja assim tão diferente.
Não deixa de ter alguma graça que, neste clássico, sejam exploradas questões como o direito da mulher ao seu corpo, ao prazer, à escolha do parceiro ou até à infidelidade mas que seja, na verdade, dirigido ao homem, que, segundo este receituário, deve acautelar-se em relação “aos malefícios do amor e da mulher, bem como ao seu poder, sortilégios e domínio”.
Tal como hoje, empoderadas e livres, mas com calma [ler com ironia].
O QUE ANDO OUVIR
“Man’s Best Friend”, Sabrina Carpenter (2025)
O álbum foi lançado há poucos dias e o falatório maior foi sobre a fotografia da capa do que as canções. Isto porque há uma leitura sexual por trás da imagem que, infelizmente, ainda é motivo de crítica e julgamento em artistas femininas - sim, porque não há cá sururus quando um grande nome do rap lança alguma nova música mega explicita sobre o que faz ou deixa fazer, isso está tudo bem, é arte.
Mas capas à parte, ou arrisco-me a fazer precisamente o que critiquei, este é o mais recente álbum da cantora pop norte-americana, e há claramente uma mensagem: ela está zangada com os homens em geral. A melhor descrição que encontrei é da revista “Rolling Stone”, que classifica o trabalho claramente como um “break up mode”, em que Carpenter se mostra “triste, mas ainda assim excitada e totalmente auto consciente”, despejando ao longo das canções algumas picardias e insinuações para homens em particular.
Termino o meu Expresso Curto por aqui. Obrigada por nos ler. Continue a acompanhar-nos no Expresso, na Tribuna e na Blitz, a ouvir-nos e a ver-nos também. Não se esqueça que também estamos sempre por aqui, ali, além e acolá.