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Regresso à calamidade, ponto de situação e um pedido: #healtheworld

Bom dia,

Imagino que já as conheça, mas aqui vão elas de novo: O país entrou em estado de calamidade - eis 7 regras e 12 detalhes que mudam a nossa vida (e ainda um guia que os viajantes devem guardar). Ainda tem dúvidas? Há boas razões para isso. Vamos então a um ponto de situação:

Pelo caminho, os números da pandemia voltaram a ser alarmantes: mais de 4000 infetados (o que não acontecia desde julho) e 17 mortes, números que podem duplicar até ao Natal, disse Graça Freitas ao Público. Acrescenta-se a isto a nova variante, Ómicron, que tem registados 19 casos em Portugal. António Costa aconselha, por isso, “máxima cautela” e já vai avisando: se for necessário, haverá novas medidas para o Natal.

Face a isto, vale a pena deixar-lhe pistas para os dias que se seguem:

O dia 1 das novas restrições foi, de resto, sereno q.b. Na fronteira, os espanhóis dizem "no pasa nada". E os portugueses concordam porque "passa tudo" (pelo menos entre Tui e Valença). O aeroporto de Lisboa passou com positiva no primeiro dia de testes negativos. De olho na passagem de ano, os portugueses esgotam quatro ‘charters’ e TAP reforça operação. E, se no arranque do maior centro de vacinação do país, a manhã foi de longas filas, o cenário à tarde mudou consideravelmente: “Estava muito renitente. Ainda estou. Agora já levei, já está aqui. Vamos ver no que vai dar. Tenho um bocado de medo”, dizia Ilda Cruz, de 82 anos, ao Expresso. E é aqui que lhe dizemos: vai correr bem, Ilda.

De resto, nestes dias publicámos um Exclusivo aqui no Expresso que resume bem uma preocupação maior com estas medidas: Testes, testes, testes: a vacina já não chega para a vida “normal”. E os especialistas pedem cuidado para não se minar confiança na vacinação. Isso era bom.

Seguimos em frente?

OUTRAS NOTÍCIAS

Portugal já ultrapassou os limites ecológicos em todas as categorias, diz um estudo da Fundação Gulbenkian, que analisámos em detalhe. Seja em alterações climáticas, poluição da água por azoto e fósforo, consumo de água doce, poluição do ar, pressão sobre os ecossistemas, destruição da camada de ozono e produção e deposição de resíduos, o legado é pesado para as gerações presentes e futuras.

Este ano não há relatório sobre o VIH em Portugal, alegadamente por problemas no sistema de notificação. Oficialmente, apenas 500 novos casos foram registados, mas é provável que os dados estejam subestimados por causa da pandemia, o que pode adiar por décadas. o objetivo de eliminar a doença. Ontem, aqui no Expresso, deixámos-lhe um texto Exclusivo que recomendo vivamente: “Tenho uma coisa no sangue que nem vejo, espero pela cura que me a tire aqui de dentro”: a história de Sofia, que não se chama assim.

As pensões de reforma vão ser atualizadas. A maioria dos pensionistas tem aumento máximo de 8,9 euros em 2022. Saiba aqui quanto subirão.

Marcelo quer uma decisão rápida sobre um velho problema. "Tome-se uma decisão, e em 2022", disse o Presidente sobre o novo aeroporto de Lisboa.

Um problema definitivamente adiado: “Não é uma questão menor, é uma questão de vida ou de morte.” Marcelo assumiu o veto à eutanásia e pede “clareza” aos deputados que se seguem.

Um novo problema que aparenta não ter resolução: o Tribunal Constitucional pediu explicações ao Chega sobre impugnação de lista e militantes querem repetição do Congresso.

Um movimento em Lisboa a pedir contas a Moedas: Mais de 2500 lisboetas levam petição à Assembleia Municipal para travar fim da ciclovia da Almirante Reis

Falando em contas, há um problema novo no Novo Banco: Clientes queixam-se de ser alvo de phishing, contas ficam a zero.

Novidades da Operação Cartão Azul: Casemiro, Brahimi, Óliver, Quaresma e Felipe (e outros): os nomes e todas as suspeitas do MP sobre Pinto da Costa. E mais este: Ministério Público levanta suspeitas sobre manipulação de resultados em jogos do FC Porto - ou estará a falar de uma bruxa?

Há migrantes marroquinos a chegar clandestinamente ao Algarve pelo mesmo mar de onde migrantes portugueses saíram outrora clandestinamente rumo a Marrocos. A História dá tantas voltas mas ninguém sabe exatamente que voltas dão no mar os marroquinos que estão agora a chegar a Portugal. Como o mar que ia dar a Marrocos veio dar a Portugal é uma reportagem Expresso sobre um tema sensível que não deve ficar esquecido.

Mau tempo no Canal. O Reino Unido culpa França que culpa o Reino Unido pelo que se passa no Canal da Mancha - e enquanto isso morrem pessoas.

Uma prova de maus tratos a migrantes na fronteira da UE: Um homem afegão, com residência legal num país europeu, diz ter sido agredido pelas autoridades gregas enquanto trabalhava como intérprete para a Frontex e depois reenviado para a Turquia. A queixa já chegou à UE, a Frontex e a própria Grécia também estão a investigar, e o intérprete garante ter vídeos e fotografias que comprovam os métodos de expulsão violenta de migrantes que a Grécia é acusada de praticar há anos. Ana França reporta.

A Associação de Ténis Feminino deu cartão amarelo a Pequim: suspendeu torneios na China na sequência do caso da tenista Peng Shuai.

Dancemos com a Diferença: aqui fala-se de um trabalho de vinte anos para mostrar que os bailarinos também podem ser surdos, cegos, ou exibir corpos desviantes do padrão, um projeto de inclusão para pessoas com deficiência.

Qual é a palavra do ano? Apagão, bazuca, criptomoeda, mobilidade, resiliência, teletrabalho, vacina? Há estas e mais quatro para escolher, entrando por aqui.

Antes de fechar, permita-me que lhe recomende este texto: “Não sei fazer outra coisa a não ser pensar”. É Eduardo Lourenço na sua última entrevista. Foi há um ano que foi para longe, mas nunca sairá de dentro de nós.


O QUE ELES DIZEM

"Napoleão terá dito que preferia um general com sorte do que outro que seja competente. Como qualquer político com sucesso, António Costa é um homem com muita sorte. Mais um exemplo? O aparecimento da variante Ómicron". José Miguel Júdice, comentador da SIC-Notícias

"As previsões apresentam-se como factos, sem a elementar prudência de dizer ‘posso estar errado". Henrique Monteiro, ex-diretor do Expresso

"Rui Rio tem, indiscutivelmente, uma renovada legitimidade (...). Para ter sucesso, muito dependerá dele próprio". José Matos Correia, ex-vice presidente do PSD


TRÊS PODCASTS SOBRE O PÊ-PÊ-DÊ

👑 A “rionificação” e a “limpeza ética” do PSD. E o que vale Rio nas legislativas? Rui Rio ganhou, outra vez. Ponto final, parágrafo? Ainda não, agora tem pela frente uma luta com o aparelho e uma campanha em que precisa dele. E aí virá a disputa com António Costa. Afinal, quem ganha com este anunciado Bloco Central? Aqui está a Comissão Política do Expresso, desta vez ao som dos Beatles.

💌Manuel Serrão adivinhou a vitória de Rui Rio e torna-se no vidente mais famoso do país. Rui Zink confessa: a primeira é no Ibis e a segunda no Ritz; Rita Blanco pergunta se pode levar animais. Enquanto Júlia Pinheiro invoca a Ómicron, o nojo invade as cadeiras da Noite da Má Língua. Quem irá sair por detrás do biombo esta semana

🎯Eutanásia interrompida, sobrevivência de Rio garantida De líder "imprestável" a candidato "invencível" a primeiro-ministro, Rio soma e segue. No 'Sem Moderação' com Daniel Oliveira, José Eduardo Martins, Pedro Delgado Alves e Francisco Mendes da Silva, há sorrisos e tristezas, mas algumas interrogações também.

O QUE ANDO A LER: #healtheworld

Não sei como nem porquê, lá em casa tínhamos já assimilado aquela utopia de um regresso à normalidade: os fins de semana voltaram a ser pelas ruas, voltámos a estar com os amigos, a jantar fora, a beber da cultura que temos à mão, a fazer vida. Sendo Portugal um dos países com maiores taxas de vacinação, a pandemia parecia uma página virada. Talvez tenha sido o nosso interregno negacionista. Por isso, o anúncio deste regresso a um novo inverno pandémico tem sido - como imagino que para si também -, um balde de água fria.

Tenho por isso passado algum tempo a voltar às páginas da imprensa internacional. É a ler que questionamos, que racionalizamos, que metemos os pés na terra. O que mais me ajudou a ler o momento atual é um texto do Washington Post, que mostra bem como a desigualdade é a origem e consequência mais dramática desta pandemia. Siga comigo:

  • Como saberá, a Organização Mundial de Saúde criou um programa para fazer chegar a vacina aos países menos desenvolvidos. A Covax tinha o objetivo de distribuir 2 mil milhões de doses até ao fim deste ano, mas reduziu esse objetivo para 1.425 milhões em setembro. Até agora, apenas 537 milhões foram entregues e utilizadas.
  • As taxas de vacinação nos EUA, França e China estão nos 60%, 70% e 77%, respetivamente. Compare isto com os 6% de vacinados entre os 1,2 mil milhões que habitam o continente africano.
  • As razões são variadas. Passam pelo travão de entregas pela Índia, devastada pelo impacto da Covid-19 dentro de portas, também pela entrega de doses muito próximas do prazo de validade das doses, mas sobretudo pela prioridade dada pelos países mais ricos à vacinação das suas populações com terceiras doses. O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse-o com frieza: “A cada dia que passa, há seis vezes mais terceiras doses aplicadas do que primeiras doses em países com poucos rendimentos. Isto é um escândalo que tem de parar agora".

Não é preciso ser o Papa, nem sequer cientista, para perceber que se temos 6% de vacinados em África, temos ali o ambiente certo para gerar novas mutações do vírus. E chegando elas, como chegou agora uma, a reação instintiva dos países mais ricos (e vacinados) é a de fechar fronteiras. O Presidente de África do Sul, país que identificou a variante, que rapidamente partilhou informação com o mundo, que disponibilizou todos os dados para o mundo científico a estudar e poder reagir, ficou - justamente - chocado com a reação do mundo que se diz desenvolvido:

"A proibição de viajar não está baseada na ciência, nem vai ser eficaz em prevenir a disseminação desta variante". Só vai conseguir prejudicar ainda mais as economias dos países mais afetados e minar a sua capacidade de responder e recuperar desta pandemia".

Nem por acaso, a OMS disse ontem que que proibir viagens internacionais não impede a propagação da Ómicron (e pode ser um empecilho à partilha de informação). Um dia antes, um dos principais investigadores de África do Sul queixou-se que a proibição de viagens para o país estava a impedir a investigação da nova variante, porque impedia a chegada de material fundamental para essa investigação. É um "apartheid de viagens", disse o secretário-geral da ONU. E disse bem.

Neste artigo do Washington Post li, talvez, o contributo mais sólido para resolver esta tremenda e injusta desigualdade entre povos - uma desigualdade que agora voltou para nos assombrar: "Os países mais ricos devem dar recursos às companhias que produzem vacinas para aumentar a vacinação", em vez de apenas enviarem doses que têm a mais para estes países; devem "suspender os direitos de propriedade intelectual das vacinas e investir na produção regional", neste países, sugeriu Wafaa El-Sadr, professora na Universidade de Columbia.

Lendo isto, ficou-me uma dúvida: Portugal, neste contexto, está exatamente a fazer o quê, a defender o quê, a promover o quê? E a ouvir António Guterres, estará?

Fico por aqui, com uma breve sugestão de leitura, que vem a propósito: chama-se Aftershocks: Pandemic Politics and the End of the Old International Order, foi aconselhado por Gideon Rachman no Financial Times como um dos livros do ano, e explica como a pandemia está a acabar com a era de cooperação internacional. Eu já o tenho na minha lista para o Pai Natal.

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