Bom dia.
A sempre elegante mas muitas vezes contida língua portuguesa tem algumas falhas que dificultam a análise política mais acutilante. Por exemplo: não há uma palavra que traduza a expressão anglófona underdog. O perdedor esperado de uma competição contra o favorito num embate mano a mano como, por exemplo, um combate de boxe ou uma partida de ténis.
Os brasileiros resolveram o problema com a invenção da palavra azarão mas eu tenho de escrever que, como já vai sendo hábito , Rui Rio é o menos favorito na luta pela presidência do PSD contra o eurodeputado Paulo Rangel, que se lançou na corrida com projeções de uma aparentemente inalcançável maioria absoluta.
Mas tal como aconteceu quando venceu Fernando Gomes na corrida à presidência da Câmara do Porto há 20 anos, ou quando ganhou o PSD a Santana Lopes ou mesmo quando afastou Luís Montenegro nas últimas diretas do partido, Rio pode provocar mais um upset, que é que que acontece quando o underdog vence.
Hoje, na sede nacional do PSD, Rui Rio recebe uma delegação do Comité Olímpico Português presidida por José Manuel Constantino. E, de acordo com a assessoria dos sociais-democratas, vai “prestar declarações à imprensa”. Mesmo que queira falar das medalhas de Mamona, Pichardo, Fonseca ou Pimenta, ou da crónica falta de investimento no desporto prevista em mais um Orçamento do Estado, há de confirmar que é mesmo candidato a mais um mandato à frente do maior partido da oposição.
Surpreendente? O anúncio da candidatura ainda foi mais inusitado: Salvador Malheiro, braço direito do presidente do PSD e diretor da campanha que já terá começado, enviou uma mensagem aos jornalistas através do gmail pessoal a anunciar que Rio “não é homem para desistir” e que iria à luta. Rio confirmou a notícia no twitter (publicou o comunicado de Malheiro) e hoje deverá reconfirmá-la na receção olímpica. A clássica conferência da imprensa ou declaração oficial fica para a próxima.
Mas apesar do passado vitorioso e de na história das eleições diretas no PSD o líder em exercício só ter perdido uma vez (Marques Mendes contra Luís Filipe Menezes, em 2007), há sinais pouco tranquilizadores para Rui Rio, as tais perceções que são tudo em política.
O Conselho Nacional do PSD, uma espécie de Parlamento do partido formado por cem conselheiros - elementos eleitos no congresso, representantes da JSD, antigos presidentes do partido ou da República, entre outros membros do aparelho – deu um sinal político importante quando rejeitou o pedido de Rui Rio para que as diretas do partido fossem adiadas para o início de 2022.
Pressentindo que o Orçamento do Estado pode ser chumbado o que provocará inevitáveis eleições legislativas antecipadas - e respaldado pela incrível vitória do azarão Carlos Moedas nas eleições para a Câmara de Lisboa - Rio lançou um ataque surpresa (os adversários dizem golpada) mas a bola bateu na rede (o líderes não perdem votações no Conselho Nacional) e voltou para trás com estrondo (visualizar cena do "Matchpoint", de Woody Allen).
Mas Rio, o subestimado (é a palavra mais parecida com underdog que consigo arranjar) só perdeu o primeiro set. A final está marcada para 4 de dezembro.
OUTRAS NOTÍCIAS
António Costa, o homem que derrotou Rui Rio no combate das últimas legislativas, tenta hoje o apoio do PAN e do PEV para conseguir viabilizar o Orçamento do Estado e evitar a tal crise política que todos dizem não desejar e que o Presidente Marcelo já está a precaver. Ontem, o acordo com o BE (que bastaria para resolver a pré crise) e com o PCP (que ajudaria bastante), falhou. Mas estas negociações são como uma daquelas longas séries televisivas em que acontecem coisas no princípio e no fim e pelo meio há muito engonhanço. Algumas têm um final inesperado.
Termina hoje o prazo para Maria de Jesus Rendeiro entregar à PJ as 15 obras de arte que estão em falta e que pertencem a uma coleção de 124 apreendida pelo Estado no âmbito dos processos judiciais contra João Rendeiro. A mulher do ex-banqueiro é a fiel depositária da coleção e se não devolver as obras desaparecidas pode incorrer num crime de descaminho. O marido, João Rendeiro, está desaparecido há mais de três semanas e tem – para já – uma pena de cinco anos e oito meses de cadeia para cumprir.
A PJ faz hoje 76 anos e a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, vai a Braga para presidir às cerimónias. Os operacionais da PJ realizaram uma curta metragem "A ação concreta de uma polícia íntegra e discreta” que vai ser projetada durante os festejos.
Uma comissão do senado brasileiro presidida por Renan Calheiros responsabiliza o Presidente Jair Bolsonaro pela morte de 300 mil brasileiros durante a pandemia de covid-19 e indicia-o por crimes contra a humanidade e genocídio contra a população indígena. O Ministério Público brasileiro terá de decidir se avança com uma acusação e o Senado com um processo de impeachment.
O Benfica recebe hoje o Bayern de Munique num jogo a contar para fase de grupos da Liga dos Campeões. Para aquecer, os bávaros engoliram o terceiro classificado da Bundesliga, o Bayer Leverkusen por 5-1; enquanto que o Benfica precisou de duas horas para afastar da Taça de Portugal o Trofense, 14º classificado da II liga. Mas já se sabe que não há dois jogos iguais e que a bola é redonda e que tudo pode acontecer e que a Alemanha nem sempre ganha no fim. Em oito jogos com os alemães, o Benfica empatou três e perdeu os outros cinco. Sim, nunca ganhou. Mas também não ganhava ao Barcelona há sessenta anos e conseguiu um 3-0 escandaloso na última jornada da Champions.
Ontem, o Sporting conseguiu uma excelente vitória por 4-1 no campo do Besiktas, da Turquia. Mais surpreendente do que os dois golos do defesa Coates foi a façanha de Paulinho que conseguiu marcar um (grande golo) depois de mandar duas bolas ao poste pondo fim a uma seca que já durava há cinco jogos e que desesperava o mais paciente dos sportinguistas.
O FC Porto dominou o histórico AC Milan e o 1-0 (golo do cada vez mais excelente Diaz) é escasso para a forma como o jogo do Dragão decorreu.
O Parlamento Europeu anuncia hoje o vencedor do Prémio Sakharov para quem se distinguiu na luta pelos direitos humanos. Os candidatos são Alexei Navalny, opositor russo e ativista anti corrupção que já escapou a uma tentativa de envenenamento e está atualmente preso em Moscovo; um grupo de mulheres afegãs que lutam pela igualdade e pelos direitos humanos no Afeganistão dos talibãs e a ex-Presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez.
Um mês depois da erupção, o Cumbre Vieja não dá descanso aos habitantes de La Palma. Dez por cento da população da ilha já foi desalojada e apesar de viver numa ilha vulcânica há mais de setenta anos, Pepe nunca viu nada assim.
Rui Moreira toma hoje posse como presidente da Câmara do Porto, cargo que já desempenha desde setembro de 2013 e que conseguiu reconquistar apesar do caso Selminho. O julgamento deverá arrancar daqui a um mês e, no limite, poderá levar à perda do mandato do autarca.
Frases
“Devemos ter 5% de hipóteses nas casas de apostas”
Jorge Jesus, o habitualmente confiante treinador do Benfica, que desta vez se contentaria com um empate contra a “melhor equipa do mundo”
"É uma das pessoas que acompanho no futebol e estou entusiasmado por encontrá-lo"
Julian Nagelsmann, o jovem e simpático treinador do Bayern, 33 anos mais novo do que Jesus
“Confio na racionalidade das pessoas”
António Costa, sobre os parceiros à esquerda que também terão de confiar na dele para viabilizar o Orçamento do Estado
"infelizmente, a História tem demonstrado que aquilo com que Aristides de Sousa Mendes foi confrontado continua a ser uma realidade de hoje e, por isso, é muito importante que estes valores sejam lembrados"
António “racional” Costa, na cerimónia de homenagem ao cônsul de Bordéus que 67 anos depois de morrer foi finalmente imortalizado no Panteão Nacional
“Há muita gente no PSD que não compreende este desafio ao presidente”
Salvador Malheiro, diretor de campanha do PSD, a tentar compreender a história a decorrer à frente dos seus olhos
O que eu ando a ler
“À Beira do Abismo”
Raymond Chandler
Pode um homem escrever um primeiro romance aos 50 anos que se torna um clássico imediato e criar uma personagem tão, mas tão, cool que só podia ser interpretada no cinema por Humphrey Bogart? Pode. Mas não deve acontecer tão cedo outra vez: depois de uma vida bem sucedida como empresário mas complicada a nível emocional e regada a álcool e depressões, Chandler mudou a história da literatura policial, ou melhor, da literatura, com Phlip Marlowe, um detetive particular idealista que, ao contrário do que era costume, levava pancada, era enganado e sobrevivia com meia dúzia de tostões e um fato coçado num mundo meio sórdido de sexo e crime. Chandler só começou a escrever romances depois de se casar com Cissy Pascal, uma pianista 17 anos mais velha do ele, e deixou de escrever quando enviuvou, tendo morrido pouco depois, de alcoolismo. Marlowe viveria em seis romances, quase todos adaptados ao cinema, devido à linguagem extremamente visual, o humor, e, claro, à qualidade. Só um exemplo: .
- Estás falido?
- Bem, ando a chocalhar duas moedas de um níquel há um mês para ver se acasalam.
Nesta primeira obra, Marlowe é contratado por um velho deficiente milionário para descobrir quem é que anda a chantagear a filha indomável.
O resto é história.
PODCASTS A NÃO PERDER
️ O Governo num berbicacho Será que vem aí crise política? Esta pergunta repete-se à exaustão até à votação do Orçamento do Estado na generalidade. Que opções tem o Governo? Que cenário teríamos com eleições antecipadas? A direita está organizada? Vitor Matos, Liliana Valente e João Diogo Correia comentam estes e outros temas desta Comissão Política moderada por David Dinis.
Os preços dos combustíveis vão continuar a aumentar? Já não há 'memes' e trocadilhos novos, a questão dos combustíveis está na ordem do dia e não vai melhorar. Neste episódio do Expresso da Manhã, Paulo Baldaia conversa com o jornalista do Expresso Miguel Prado sobre a situação e o futuro, que se avizinha cinzento para quem tem que abastecer regularmente.
Um shot de Cinema Rui Pedro Tendinha fala-nos do festival FEST, em Espinho, e dá conta de estreias e ante-estreias, ‘Lamb’, de Valdimar Johánsson, 'Tudo Parece Perfeito' de Gonçalo Almeida, sobre 9 DJ portugueses e 'O Meu Ano Com Salinger', com Sigourney Weaver. Para conferir tudo em mais um episódio do Cinetendinha em podcast.
Ontem à noite a lua cheia estava linda. Hoje não se sabe. Vai ser um dia de calor tardio para acompanhar em expresso.pt.