Há quem diga que José Sócrates está de volta. Mas como é que pode estar de volta quem nunca daqui saiu.
Há uma eternidade que Sócrates e a sua sombra pairam sobre nós. E, depois de conhecida a decisão instrutória da Operação Marquês, ficamos com uma garantia - a procissão ainda só vai no adro.
Ontem, o antigo Primeiro-ministro foi à TVI dizer a sua verdade. O animal feroz gosta de palco, das câmaras de televisão.
Muitas vezes, é mais fácil responder às perguntas de um jornalista do que de um juiz. De um procurador.
Sócrates chegou ao estúdio com a narrativa bem estudada. Sabia que só ficava a ganhar se não deixasse pedra sobre pedra. Por isso, acusou tudo e todos.
O juíz Carlos Alexandre “cuja escolha foi manipulada”. O juíz Ivo Rosa por o ter considerado corrupto – crime que entretanto já prescreveu.
Mas os maiores mimos reservou-os para os seus antigos companheiros de partido. Não poupou Fernando Medina e sobretudo o seu “mandante”, António Costa, que acusou de cobardia.
A líder parlamentar do PS, Ana Catarina Martins, já veio entretanto a terreiro defender o Primeiro Ministro: “É uma profunda injustiça. Costa não é um traidor” disse ela no programa "A Circulatura do Círculo”.
Quem ontem, vindo de Marte, tivesse aterrado no planeta Terra, não teria qualquer dúvida - Sócrates está inocente. Mais grave: está a ser vítima de uma enorme injustiça.
Mas nem todos vieram ontem de Marte. Esta história tem outras palavras. Palavras ditas ao longo dos anos e que nos colaram ao pensamento. E ao ouvi-las o antigo Primeiro-Ministro nem sempre fica bem na fotografia
Um homem é a sua palavra.Quanta verdade cabe na palavra de Sócrates?
OUTRAS NOTÍCIAS
COVID 19. Todos os dias, a Direção Geral de Saúde atualiza o número de mortes e infetados em Portugal.
O ritual dura há mais de um ano, já faz parte do nosso dia a dia.
Mas convém nunca esquecer que, por trás de cada número, há uma pessoa. Uma família e muitos amigos.
O boletim de ontem dá conta de mais oito mortos e quase 700 infetados nas últimas vinte e quatro horas.
Estes números surgem num momento em que a confusão à volta das vacinas é mais do que muita.
Depois dos avanços e recuos da vacina da AstraZeneca, eis que surge a suspensão da vacina da Johnson&Johnson.
No ar pairam várias perguntas. Tantas que a Comissão Europeia estuda a possibilidade de não renovar os respectivos contratos.
No meio de tantos ses, uma boa notícia: a UE garantiu a antecipação da entrega de 50 milhões de vacinas da Pfeizer em Abril. E outra: os testes à Covid vão ser gratuitos em Lisboa.
Mas, enquanto não se atingir a tão desejada imunidade de grupo, todos os cuidados são poucos.
É por isso que, ontem à tarde, o parlamento deu luz verde à renovação do estado de emergência até ao final do mês.
À noite, Marcelo Rebelo de Sousa falou ao país. Como diz a Ângela Silva, o presidente despediu-se do estado de emergência e passou a bola ao governo. “2021 terá de ser o ano da reconstrução social justa”, preveniu o presidente.
MORTE. Desde 2008 que a palavra de Bernie Madoff não valia um cêntimo.
Deixou de contar quando se descobriu que era o autor do maior esquema em pirâmide de que há memória.
Naquele dia, a sua reputação de mais de quatro décadas como gestor de fortunas caíu na lama.
O esquema fraudulento desenhado por Madoff prejudicou dezenas de milhares de investidores.
Por sua causa, muitas pessoas ficaram arruinadas, muitas famílias foram destruídas.
Morreu na prisão aos 82 anos de causas naturais.
EGIPTO. O porta- contentores Ever Given foi desencalhado há mais de duas semanas, mas ainda não conseguiu guia de marcha para prosseguir caminho.
Vai continuar retido no grande Lago Amargo, enquanto não abrir os cordões à bolsa e ressarcir a Autoridade do Canal do Suez pelo prejuízo causado pelo encalhamento.
E a fatura é pesada – nada mais nada menos, do que 916 milhões de dólares.
POLÉMICA. Sabe-se desde terça-feira que o Governo japonês decidiu que a água processada e armazenada na central nuclear de Fukushima será descarregada no Oceano Pacífico.
Apesar dos níveis de radiatividade, as autoridades japonesas consideram que o derrame não irá gerar qualquer risco para a saúde humana.
O argumento não convenceu a China que encontrou uma forma original de tirar a prova dos nove. "O vice Primeiro-ministro japonês disse que não faz mal bebermos essa água. Ele que a beba", desafiou o porta-voz do MNE de Pequim.
VERGONHA. Ontem, a SIC transmitiu a última parte de “A Grande Ilusão”, uma excelente série de cinco grandes reportagens, com assinatura de Pedro Coelho.
Para o final, o jornalista guardou uma verdadeira bomba: César do Paço, um conhecido financiador do Chega, fez transferências para o CDS/Madeira, nas vésperas das últimas eleições regionais.
Os centristas detêm a pasta da Economia no Executivo de Miguel Albuquerque.
SIRESP. Foi preciso uma tragédia para ficarmos a conhecer a Operadora da Rede Nacional de Emergência e Segurança. Foi durante os incêndios de Pedrogão e pelas más razões- foram as suas falhas que a tornaram famosa.
Agora ficamos a saber que “o SIRESP vai acabar a 30 de Junho”. Pelo menos foi o que Alexandre Fonseca, CEO da Altice, disse em entrevista ao DN.
PATRIMÓNIO. O claustro do Mosteiro dos Jerónimos vai ficar de cara lavada. A limpeza ecológica - a primeria em Portugal - consiste em borrifar álcool sobre o véu negro que cobre as paredes de maneira a eliminar algas, líquines e musgos.
Esta técnica importada dos museus do Vaticano fica completa com uma limpeza com óleos essenciais. Como resume a Christiana Martins, tal técnica não agride nem a história nem o ambiente.
FUTEBOL. Depois do Chelsea e do Paris Saint Germain mais duas equipas carimbaram a passagem às meias finais da Champions. O Manchester City seguiu em frente depois de vencer, na Alemanha, o Borussia de Dortmund por duas bolas a uma.
O mesmo aconteceu ao Real Madrid que trazia uma vantagem confortavel da primeira mão e apostou num empate sem golos no terreno do Liverpool.
PRESIDÊNCIA PORTUGUESA UE
Jansen. Regulador mantém confiança na vacina
A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) continua a considerar que os benefícios da vacina da Janssen superam os riscos de efeitos secundários.
Pelo menos até serem conhecidos os resultados da investigação sobre os casos de formação de coágulos relatados nos Estados Unidos após a administração da vacina.
A decisão deve ser conhecida na próxima semana.
Maiores de 80 anos desenvolvem anticorpos contra a doença
Entretanto, Investigadores do Consórcio de Imunologia do Coronavírus do Reino Unido concluíram que uma única dose da vacina da Pfizer é suficiente para desenvolver, num prazo de cinco a seis semanas, anticorpos em 93% das pessoas com 80 anos ou mais.
O mesmo estudo revela que uma só toma do fármaco da AstraZeneca confere igual proteção em 87% dos vacinados pertencentes à mesma faixa etária.
O QUE EU ANDO A LER
O escritor norte americano David Foster Wallace enforcou-se a 12 de Setembro de 2008, poucos dias depois de eu assumir a editoria da revista Atual.
A primeira vez ouvi falar dele foi num blogue de um colaborador deste suplemento literário do Expresso. Era uma crítica ao seu livro "Infinite Jest". Na opinião do jornalista, era o livro dos anos noventa, o livro de uma geração.
Já não me lembro ao certo, mas é bem possível que tenha sido o que me empurrou para a compra do livro. Mas confesso que ainda não o retirei da casa de repouso.É um dos muitos livros que guardo para ler no momento certo .
A prosa de D.F.W. acabou por me chegar de outra forma. Neste momento, tenho na minha mesa de cabeceira o livro “Teoria das Cordas”, que reúne cinco ensaios geniais, dedicados ao desporto favorito do escritor, o ténis.
Ainda vou no princípio, mas já posso colocar as mãos no fogo – este livro vale mesmo a pena. E já me avisaram que a cereja em cima do bolo é o último ensaio, onde o escritor faz “o genial retrato de Roger Federer”.
O QUE EU ANDO A VER
Um dia destes, ao fazer zapping a altas horas da noite, tropecei num dos filmes da minha vida.
Fui então confrontado com um dilema: ir dormir o sono dos justos ou mergulhar numa sessão que, inevitavelmente, iria entrar madrugada adentro. Não resisti, foi mais forte do que eu.
“Pulp Fiction”, de Quentin Tarantino, é um daqueles filmes que marca uma geração.
Quando o vi pela primeira vez, numa das salas do cinema Amoreiras, nem queria acreditar no que os meus olhos viam. Aquele filme era uma pedrada no charco, não deixava ninguém indiferente.
Passados todos estes anos, a minha grande dúvida era se o filme conservava a audácia que tanto me encantara.
Não só não ganhou uma única ruga como continua a impressionar pela beleza dos diálogos, pela banda sonora, pela memorável interpretação dos atores.
Se ainda não viu, não sei do que está à espera.
O QUE EU ANDO A OUVIR
É das vozes mais bonitas que ouvi. Uma voz suave. Uma voz que marca a música de Cabo Verde.
Arlinda Santos teve uma vida cheia – era assistente social e combateu nas matas da Guiné pela independência de Cabo Verde.
Arlinda Santos teve uma carreira musical longa - começou no ínicio dos anos sessenta, quando gravou o disco “Folclore de Nós Terra”, ganhou um novo impulso nos anos noventa com o grupo Simentera, e desaguou em dois discos a solo já neste milénio.
Arlinda Santos despediu-se de nós na semana passada. Eu despeço-me dela agora.
Tenha um resto de bom dia.