Bom dia,
Declaração de interesses: não sou eleitor italiano, não vivo nem nunca vivi em Itália e não conheço Matteo Salvini. Sobre o líder da Liga, fico-me por aquilo que é público. E já é bastante. Bem sei que declarou que não é fascista nem comunista, que é contra um Estado centralizado ao estilo de Mussolini e que recusa a ideia de Itália necessitar de um homem forte. Ou seja, não se assume como um novo Duce. Mas tem frases sobre segurança e imigração que dificilmente nos devem deixar descansados. Se não, vejamos, apenas alguns exemplos:
“Entreguem-me o ministério do interior por três meses e vão ver a ordem e a limpeza que trago para a Itália de norte a sul”
“Não digo salame ou carne de porco porque alguns podem sentir-se ofendidos. Vida longa à salsicha! Vida longa ao salame! Vida longa à carne de porco, à coppa e à panceta”
“Amigos, importámos muito poucas pessoas boas. Mas tem havido uma vaga de delinquentes e eu quero vê-los em casa, do primeiro ao último. Estamos cheios de traficantes de droga, violadores , ladrões – e a Liga é a solução”
Salvini tem 44 anos, é de Milão, é ex-comunista e já assegurou que está pronto para formar governo. A coligação centro-direita foi teve a maior fatia dos votos e, dentro dela, foi a Liga de extrema-direita a vencer. Por isso, convém conhecer melhor o percurso do político que está a assustar a Europa.
Mas os receios sobre os resultados das eleições italianas estão longe de se esgotar no líder da extrema-direita. Longe disso. É que o partido individual com mais votos foi o movimento 5 Estrelas que, à esquerda, é igualmente populista e anti-sistema. E pior - ou quiçá melhor – ficou tudo num impasse. Para já, o Partido Democrático mantém-se no governo até haver uma solução. Renzi, entretanto, já se demitiu.
O que aconteceu para os partidos tradicionais em Itália serem destronados? O britânico Guardian encontra a explicação na economia para o voto de protesto e o Público chama a atenção para questões sociais como a pobreza ou o desemprego.
A grande questão é saber o que vai acontecer agora. Há hipóteses, cenários e conjeturas para (quase) todos os gostos. O Financial Times aponta quatro opções: a aliança populista (Liga + Irmãos de Itália + 5 estrelas); Liga + Partido Democrático; uma solução de esquerda (5 estrelas + Partido Democrático + Livres e Iguais); e uma alternativa alargada (Liga + Força Itália + Irmãos de Itália + 5 Estrelas + Partido Democrático + Livres e Iguais). A edição europeia do Político vai mais longe e avança cinco cenários ligeiramente diferentes onde se inclui, por exemplo, a possibilidade de um governo de transição de curto prazo para aprovar o orçamento e uma nova lei eleitoral.
Como dizia ontem de manhã a Bloomberg, o futuro da política italiana está nas mãos de três pessoas
Apesar de os mercados não terem vivido propriamente uma segunda-feira negra, houve alguns estragos. Principalmente em Itália: os bancos foram dos que mais perderam e os juros da dívida a 10 anos tiveram uma ligeira subida (como se pode ver no gráfico do Investing.com).
OUTRAS NOTÍCIAS
Cá dentro
O Estado chinês reforçou a posição na EDP para 28,25%, como avançou ontem o Expresso Diário. O reforço não tinha que ser comunicado ao mercado mas estava explícito no relatório anual da eléctrica que o Miguel Prado consultou.
O Público faz hoje manchete com a notícia de um embate entre os procuradores do Ministério Público que estão a investigar o “caso EDP” e o juiz de instrução, Ivo Rosa. Em causa, conta o jornal, está a recusa de Ivo Rosa de autorizar pesquisas em emails de António Mexia, João Manso Neto e Manuel Pinho.
A edição desta terça-feira do DN revela um estudo da Universidade Nova que estima que os “cuidados prestados pelo Serviço Nacional de Saúde geraram 5 mil milhões de euros para a economia no ano passado” através de faltas ao trabalho evitadas e ganhos de produtividade.
O Jornal de Negócios (link para assinantes) escreve que os spreads dos empréstimos bancários para compra de casa recuaram 5% num mês e que “há quase oito anos que os juros não eram tão baixos”. Tudo por causa de uma guerra de spreads entre bancos.
O Fisco está em cima dos contratos promessa de compra e venda no imobiliário. Nomeadamente, a venda dos direitos de comprar por valor superior ao sinal pago pelo comprador inicial e que deve implicar o pagamento de Imposto Municipal sobre Transações (IMT).
António Costa esteve ontem em Elvas com Mariano Rajoy a lançar o troço ferroviário Évora-Elvas que, por sua vez, vai ligar a Espanha.
Carlos Alexandre vai ficar na Operação Marquês. O Tribunal da Relação rejeitou o afastamento do juiz pedido pelos advogados de Sócrates.
Isabel dos Santos, filha do ex-presidente de Angola, e Carlos Saturnino, atual presidente da Sonangol, estão em guerra aberta. Ontem, a empresária e ex-presidente da petrolífera deu uma entrevista ao Jornal de Negócios (veja aqui o video da entrevista completa) onde chamava “mentiroso” a Saturnino e, mais tarde, no Instagram, desafiava o gestor a provar as acusações de desvio de fundos.
Juan de Sousa, o preso político venezuelano de ascendência portuguesa, tem cancro na próstata, não tem tratamento em Caracas e pede ajuda a Portugal para poder ser salvo. Uma história dramática no país de Maduro, como conta a Raquel Moleiro no Expresso Diário de ontem.
Nos últimos três anos de programa de compra de activos, o chamado quantitative easing (QE), o Banco Central Europeu comprou 32 mil milhões de euros de dívida pública portuguesa.
O mercado de transferências na canoagem não é o mesmo que o do futebol onde se movimentam muitos milhões. Mas também pode haver transferências de peso. E de atletas de exceção, como o medalhado Fernando Pimenta que muda de Ponte de Lima para o Benfica.
A propósito de futebol, regressa hoje a Liga dos Campeões com FC Porto em Liverpool e Real Madrid em Paris. A equipa portuguesa tem uma missão praticamente impossível depois de ter perdido 0-5 em casa enquanto o clube espanhol parte com uma vantagem de 3-1 e nem sequer vai ter Neymar pela frente.
Manchetes dos jornais: ”Procuradores acusam juiz de bloquear investigação a Mexia” (Público); “SNS gerou 5000 milhões para a economia em 2017”(DN); “Tropas saem do exército por causa do combate a incêndios”(JN); “Bancário dá golpe de 6 milhões” (Correio da Manhã); “Mini tornado no Algarve. A história da massagista que foi salva pelo guarda-redes adversário”(i); “Spreads do crédito da casa descem 5% num mês” (Jornal de Negócios); “Jesus abre o livro”(Record); “Coentrão quer ficar”(A Bola); “Sérgio Conceição: «Motivação? Trazer ao peito este símbolo»”(Jogo)
Lá fora
O primeiro comboio de ajuda humanitária chegou a Ghouta, nos arredores da capital Síria, mas as tropas governamentais ficaram com uma parte substancial dos medicamentos e material médico. Além disso, a carga acabou por não ser totalmente entregue devido aos bombardeamentos.
Entretanto, o Financial Times avisa que podem estar a ser lançadas as sementes de uma nova primavera árabe no Médio Oriente porque, quase uma década depois, o descontentamento continua. Principalmente entre os jovens que enfrentam as maiores taxas de desemprego do mundo.
Um antigo espião russo que passou segredos ao Reino Unido está internado em estado grave por envenenamento através de uma substância desconhecida num centro comercial britânico.
O Produto Interno Bruto (PIB) da Grécia cresceu 1,4% em 2017.
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, nomeou Michael Bloomberg para enviado especial para as alterações climáticas.
Um surto de febre de Lassa já matou dezenas de pessoas na Nigéria. A doença em si não é nova nem desconhecida mas a velocidade a que se está a propagar neste caso é preocupante. Para saber o que é a febre de Lassa veja, por exemplo, a informação da Wikipedia.
Se ainda não se cansou de ler, ver e ouvir sobre os Óscares 2018 vale a pena gastar alguns minutos com este gráfico do FiveThirtyEight, o site do mago das estatísticas Nate Silver. Num único gráfico, a partir das nomeações para os prémios da academia entre 1958 e 2017, é possível ver as áreas onde há mais novidades e aquelas onde os nomes se repetem mais vezes em anos diferentes.
FRASES
“As criptomoedas estão a matar directamente pessoas”, Bill Gates, Fundador da Microsoft
“A pátria, chocada, vomita insultos. Meia dúzia de pessoal menor da Academia, devidamente encartada de títulos e graus, inchou de indignação. A universidade, desviada por instantes do negócio dos doutoramentos, habituada a debitar doutores como salsichas rugiu. Acham, certamente, que Passos não é um Vitorino Magalhães Godinho ou um Lindley Cintra. É certo. E dos atuais doutores encartados, quantos são?””, Sérgio Sousa Pinto, Deputado do PS a propósito das críticas ao facto de o ISCSP ter contratado Passos Coelho como Professor Catedrático Convidado
O QUE ANDO A LER
Finance and Development (F&D) é uma revista que o Fundo Monetário Internacional (FMI) publica trimestralmente desde 1964. Reúne análises a questões económicas, recensões de livros, perfis e outros artigos de perfil académico em versão light. No número de março, que saiu na semana passada, o tema são as contas públicas: “Balancing Act – Managing the Public Purse”.
Entre os vários artigos destaca-se um texto do ex-ministro das Finanças português, Vítor Gaspar, e David Amaglobeli, também do departamento de Assuntos Orçamentais do FMI, sobre um jantar em Nova Iorque no século XVIII que marcou a política e as finanças norte-americanas. Lembra-se de um célebre debate em 2014 onde Gaspar citou insistentemente Alexander Hamilton, o primeiro secretário de Estado do Tesouro dos EUA? Não se lembra, então pode recordar aqui. Na altura, Gaspar pareceu um bocadinho excêntrico. Mas um olhar sobre a forma como o federalismo financeiro norte-americano foi construído e como a política (de politics no inglês e não de policy) pode ser bastante útil para quem se interessa pelo processo de unificação monetária e de (tentativa) de integração orçamental na Europa.
O jantar do artigo “Fiscal Politics” aconteceu a 20 de junho de 1790 na casa de Thomas Jefferson em Nova Iorque e contou com a presença de James Madison e Alexander Hamilton. Foi nesse repasto “histórico”, como lhe chamam Gaspar e Amaglobeli, que ficou definido que o governo federal assumiria a dívida da guerra de independência dos Estados como defendia Hamilton e, em contrapartida, este aceitava apoiar a colocação da capital dos EUA nas margens do Potomac na Virginia (onde está hoje Washington).
Mas há outros artigos que vale a pena ler. Para concordar ou discordar, suave ou violentamente. É o caso do texto “Climbing Out of Debt” de Alberto Alesina, Carlo Favero e Francesco Giavazzi que regressa ao debate sobre os efeitos das medidas de austeridade no crescimento e ao célebre multiplicador orçamental que alimentou uma das maiores polémicas do tempo da troika. Ou não fossem Alesina e Giavazzi os ‘pais’ da ideia de austeridade expansionista, no início dos anos 90, e que a Europa adotou em 2010 na resposta à crise da dívida.
Neste artigo, voltam à carga, insistindo na ideia de que, nas condições certas, é possível haver austeridade expansionista e sublinhando que reduções de défice por via da despesa são mais eficazes – leia-se tem um menor multiplicador – do que aumentos de impostos.
Mas há mais. Desde logo, um perfil do Nobel Angus Deaton, um texto sobre os melhores instrumentos para lidar com a desigualdade ou um apelo para restaurar a ética na Economia.
Este Curto fica por aqui mas são saia daí. Temos toda a informação em tempo real no Expresso Online e, às 18 horas, trazemos-lhe os principais temas do dia no Expresso Diário. Tenha um excelente dia.