Boa tarde!
No intervalo da emissão do seu programa, a repórter canadiana Leslie Horton recebeu o seguinte e-mail:
“Parabéns pela gravidez; se vai usar calças velhas de motorista de autocarro, tem de esperar e-mails como este”.
Quando voltou ao ar depois do intervalo, a repórter leu o e-mail e respondeu ao homem que lho havia mandado:
“Não, não estou grávida, na verdade perdi o meu útero devido a um cancro, no ano passado. E é assim que são as mulheres da minha idade. Por isso, se é ofensivo para si, é uma pena.”
O homem que enviou o e-mail sentiu-se no direito de comentar um corpo alheio, sabendo por defeito que a repórter não estaria grávida: fê-lo mesmo para a humilhar, para a magoar. Acima de tudo, fê-lo, porque se achou no direito de o fazer.
Acho incrível como ainda hoje se acha que o corpo, especialmente o da mulher, é público, passível de todos e quaisquer comentários. Mesmo quando se trata de uma figura pública, um corpo não é público, é privado, é pessoal. Não vou naquela lengalenga de “é figura pública, é o preço a pagar”: o preço a exigir ao público é respeito, não deveria haver preço a pagar que envolvesse ser maltratada só porque sim. Ninguém obrigou aquele homem a enviar o e-mail horrendo, foi ele que decidiu. A culpa desta situação é dele, e não dela por ter um “preço a pagar pelo seu emprego com exposição”.
Além de tudo isto, este exemplo mostra como as mulheres, quase sempre, antes de serem julgadas pelo que dizem e fazem, são julgadas pela aparência. Neste campo estético, raramente saem a ganhar com maioria: ou estão gordas, ou estão tão magras e precisam de curvas; ou têm maquilhagem a mais, ou a menos; são demasiado confiantes, ou demasiado insossas; demasiado oferecidas, ou pudicas; e por aí fora… Nunca se sai a ganhar. Nunca.
Por isso, mais vale ser-se como é, vestirmo-nos como nos apetece, e não ter medo de chamar à atenção quem merece ser chamado a atenção. Mesmo assim, entendo perfeitamente quem não se está para chatear e há aquele dia em que muda algo na sua aparência para não ser alvo de críticas: toda a gente se cansa e nem todos os dias se tem energia para combater quem nos oprime.
Neste caso, com Leslie Horton, é horrível que, para se defender, a repórter tenha de ter revisitado um momento tão difícil na sua vida, já para não falar dos vários preconceitos da parte do comentário do homem com que Leslie teve de lidar, nomeadamente machismo e idadismo.
Acabo como rematou Horton: “Pensem nos e-mails que enviam” e nos comentários que fazem.
Com votos de uma ótima semana, sem e-mails desagradáveis,
Clara