Há dias, de passagem, por Lisboa, Diana Ürge-Vorsatz, vice-presidente do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas), sublinhava, numa apresentação, a assinalável redução de custo da energia solar nos últimos anos e os desafios na aceitação local de grandes centrais fotovoltaicas e do espaço que ocupam. Na conferência internacional EUPVSEC, dedicada ao setor fotovoltaico, quando questionada sobre a viabilidade da coexistência da energia solar e da nuclear, Diana Ürge-Vorsatz admitiu que sim, mas notando, com certa diplomacia, que cada país faz o seu caminho. Esse percurso está repleto de obstáculos. A oposição a projetos incómodos para as comunidades locais, há anos bem sintetizada na expressão “Nimby” (“not in my backyard”) tem, por vezes, escalado para posições de rejeição a quase tudo o que implique artificializar o território. É a lógica “Banana”: “build absolutely nothing anywhere near anyone”.
A aceitação social da transição energética para uma matriz menos poluente é hoje um dos desafios do processo de descarbonização. Poucos serão os que desejam uma central nuclear à porta de casa ou um parque fotovoltaico do outro lado do quintal. Em Portugal existe um razoável consenso das forças políticas dominantes em torno da expansão das energias renováveis. Mas será que o crescente ruído em torno das centrais solares de larga escala, os protestos pelo abate de sobreiros para a construção de fotovoltaicas e eólicas, e a recuperação da agenda nuclear no debate das opções energéticas poderão travar o ritmo da transição?
Na próxima semana Paris acolhe a conferência “Roadmaps to new nuclear”, com 16 ministros com a pasta da energia e dezenas de líderes da indústria nuclear, defendendo a instalação de mais reatores para contribuir para a descarbonização. Em Portugal o debate nuclear é uma discussão com largas décadas. Remonta aos tempos da Junta de Energia Nuclear, criada em 1954 e extinta em 1979. Na década de 1960 chegou a estar previsto que em 1972 Portugal arrancasse com produção de energia nuclear (segundo contou António Mota Redol no jornal “O Mirante”, a localização pensada era junto ao rio Guadiana). Apesar de sucessivos estudos para que o país lançasse um programa nuclear, essa hipótese nunca saiu do papel.
Em 2009 o livro “Energia nuclear: uma opção para Portugal” reavivava o tema, que foi desaparecendo e ressurgindo no espaço público. Uma agenda intermitente, sem potência firme para convencer os decisores políticos nacionais. Um caminho controverso. A Alemanha decidiu abandonar a energia nuclear, enquanto França permanece apostada em prolongar a vida das centrais que tem hoje. Por cá, a 28 de setembro a Ordem dos Engenheiros promoverá em Viseu uma conferência justamente sobre energia nuclear, que continua a ser uma carta fora do baralho para o Governo português.
Portugal ganharia com uma maior reflexão sobre política energética. A consulta prévia no portal Participa sobre a revisão do Plano Nacional de Energia e Clima para 2030 teve somente 59 contributos. E as conferências sobre energia muitas vezes acabam por fechar-se na promoção de determinada agenda ou lóbi, evitando um verdadeiro confronto de argumentos. E não é que faltem oportunidades. Tome nota do que aí vem. Já esta sexta-feira Lisboa recebe a SolarPlaza, a 26 de setembro a CNN junta em Lisboa os presidentes executivos da EDP e da Galp, enquanto a Smart Waste Portugal promove um debate sobre energia e economia circular, dois dias depois há energia nuclear em Viseu, a 11 de outubro a Ordem dos Engenheiros debate eólica offshore, no dia seguinte a Associação Portuguesa de Energia realiza a sua conferência anual, a 2 e 3 de novembro Lisboa recebe a Wind Mission Iberia, e no final do mês acontece o encontro da Apren – Associação de Energias Renováveis.
Não faltarão conferências de energia até final do ano. Será que daí resultarão efetivamente bases mais sólidas e enriquecedoras para a tomada de decisões de política energética que condicionarão o nosso futuro, enquanto consumidores, nas próximas décadas?
À parte o desafio da aceitação social, esse futuro, pela Europa fora, está balizado pelo compromisso de emitirmos menos dióxido de carbono (CO2) nas várias formas de consumo de energia. Há dias, a Ngreen Hydrogen deu o pontapé de partida no licenciamento ambiental de um projeto de 1,5 mil milhões de euros para produzir em Sines metanol verde, combustível que poderá ser usado por navios, e que necessitará de elevados volumes de hidrogénio verde e de captura de CO2.
A descarbonização do transporte marítimo é um dos vetores da transição energética (a par com o transporte pesado e ligeiro, e com o setor da aviação). E o projeto da Ngreen mostra como as opções para reduzir emissões no setor dos combustíveis têm também implicações no sistema elétrico: as unidades de eletrólise projetadas irão recorrer a uma central solar de larga escala a sul de Sines, em regime de autoconsumo, bem como a produção eólica. É a pensar também nestes novos consumos de eletricidade que o PNEC projeta uma quase duplicação da procura de energia elétrica em Portugal, de 50 para quase 100 terawatt hora (TWh) em 2030. Outros países também contam com mais procura: a Suécia, por exemplo, estima que o seu consumo de eletricidade duplicará até 2050, para 300 TWh. Em agosto Estocolmo apontou para a construção de uma dezena de novos reatores nucleares nas próximas duas décadas... mas essa indicação foi entretanto eliminada do site do Governo sueco. A eletrificação de consumos energéticos obrigará a robustecer as redes. Estamos preparados?
No setor elétrico muito do debate tem passado pelo confronto da opção nuclear com a renovável. Nos sistemas de hoje as duas soluções não se excluem, complementam-se, como se vê, por exemplo, no mix elétrico de Espanha (que quer abandonar a energia nuclear até 2035). Mas, num quadro de progressivo abandono dos combustíveis fósseis, a tecnologia nuclear e as renováveis irão disputar o seu espaço no mercado, seja para suprir o consumo convencional, seja para alimentar a nova procura (como a produção de hidrogénio de baixas emissões).
Ao longo da última década a energia solar teve uma forte redução de custos, que evidenciou a competitividade das fotovoltaicas nos leilões de 2019 e 2020, já com resultados visíveis nos custos do sistema elétrico nacional este ano. Os números da ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos mostram que as eólicas continuam a ter uma remuneração aquém do preço grossista do mercado ibérico (que reflete a remuneração dos produtores em mercado, incluindo centrais hídricas e a gás e alguma produção solar), e que a produção oriunda do leilão de 2019, embora em volumes ainda diminutos, é especialmente barata.
Quer as centrais nucleares, quer as eólicas, hídricas e fotovoltaicas cumprem o requisito de descarbonização do sistema elétrico, não obstante cada uma delas ter implicações ambientais a montante, no processo extrativo das matérias-primas de que dependem, mas também no fim do ciclo de vida, com a gestão dos resíduos nucleares, num lado, e dos equipamentos eólicos e solares, por outro, a ser frequentemente objeto de discussão.
Além da dimensão ambiental, o debate sobre centrais nucleares e fontes renováveis faz-se, também no plano da sua missão central: produzir eletricidade. E é aí que surgem algumas das mais interessantes divergências, que são igualmente pontos críticos no planeamento energético.
As centrais nucleares não só têm uma vida útil mais longa (que pode chegar a 60 anos, quase o dobro do que se verifica nas eólicas e solares), como também têm um fator de capacidade ímpar, conseguindo em alguns casos produzir a plena potência mais de 90% das horas do ano. Isso confere a esta fonte um fluxo quase contínuo e estável de eletricidade ao longo do dia, contrastando com o perfil muito variável de fontes como a eólica e a solar. Em França, a EDF registou entre 2002 e 2015 um fator de capacidade em torno de 75%, que acabou por baixar nos anos seguintes, atingindo um mínimo de 52% no ano passado, período marcado pela necessidade de reparar várias centrais nucleares com problemas de corrosão. Ainda assim, um aproveitamento da frota nuclear superior ao alcançado, por exemplo, pelos parques eólicos em Portugal: segundo os dados da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), no ano passado as eólicas no país tiveram em média 2331 horas de produção, ou seja, perto de 27%. Na energia solar o aproveitamento é ainda menor. O que não significa que sejam fontes inúteis: cada MWh a mais de eletricidade solar e eólica é um MWh a menos de eletricidade produzida a partir da queima de gás natural.
Em matéria de segurança de abastecimento, a variabilidade das renováveis é frequentemente usada como argumento de defesa da energia nuclear, cujos entusiastas apontam o dedo a uma limitação crítica de fontes como a eólica e a solar: exigem que o sistema elétrico disponha de outras fontes fiáveis e despacháveis, ou seja, que possam ser mobilizadas a cada instante, quando não há sol ou quando o vento subitamente deixa de soprar. Esse backup tem sido feito, em Portugal, pelas centrais de ciclo combinado alimentadas a gás natural, bem como pelas centrais hidroelétricas. Poderia esse papel ser cumprido por centrais nucleares?
Tradicionalmente, as centrais hidroelétricas têm uma capacidade de resposta mais rápida, alcançando toda a sua potência em poucos minutos, com as centrais de ciclo combinado a gás natural a ser um pouco mais lentas no arranque do zero, mas a revelar bastante flexibilidade para responder à variação da geração eólica. Os reatores nucleares têm vindo a ser melhorados, para conseguir tempos de resposta mais céleres, e segundo a World Nuclear Association os reatores do tipo EPR conseguirão passar dos 25% de potência aos 100% em menos de meia hora (mas o arranque continua a ser mais lento).
Por outro lado, a questão do backup não se coloca exclusivamente com as renováveis. As próprias centrais nucleares (tal como outras infraestruturas de grande porte, como as refinarias de petróleo, por exemplo) precisam de manutenções periódicas e de paragens para reabastecimento de combustível. Segundo a norte-americana EIA – Energy Information Administration, o tempo médio de paragem por ano nas centrais nucleares ronda os 25 dias. E a francesa EDF, no seu último relatório anual, indicava que este ano teria de parar sete centrais nucleares para as inspeções periódicas feitas a cada 10 anos. Ou seja, embora produzam mais eletricidade por cada megawatt instalado, também as centrais nucleares exigem ao sistema elétrico a existência de capacidade adicional de backup, para quando os reatores param (sejam paragens programadas ou imprevistas). Esse backup pode ser desempenhado por mais centrais nucleares (o que implicará que haverá sempre alguma capacidade ociosa) ou por outras fontes.
Com a proliferação de centrais fotovoltaicas de grande dimensão, tem ganho relevância no espaço público o tema da ocupação do solo. Uma central nuclear de 1,6 gigawatts (GW), por exemplo, ocupará menos espaço e menos quilómetros de linhas de ligação à rede elétrica do que 16 centrais solares ou parques eólicos de 100 MW cada. Mas também há benefícios associados à produção distribuída: será mais fácil (e mais rápido) desenvolver projetos solares e eólicos à medida das necessidades de um determinado consumidor industrial, que celebre com o promotor um contrato de aquisição de energia para absorver toda a produção, viabilizando mais rapidamente o financiamento dessa central. E eis que chegamos a um novo ponto crítico, o tempo (que é também dinheiro).
Números da World Nuclear Association indicam que em 2019 o tempo médio de construção de centrais nucleares era de 117 meses, ou quase 10 anos. Mas vários novos projetos têm apresentado derrapagens substanciais. O projeto Flamanville 3, em França, iniciou a construção em dezembro de 2007 e deveria estar operacional em 2013. Mas a EDF estima agora que a central só começará a produzir no início de 2024, ou seja, quase 17 anos após o arranque das obras. A mesma EDF está a construir no Reino Unido a central nuclear Hinkley Point C, projeto anunciado pelo Governo britânico em 2010, mas cuja construção só começou em março de 2017, com a EDF a prever que só esteja operacional no final de 2028. Na Finlândia, em abril deste ano, começou a produzir o reator Olkiluoto 3 (da finlandesa Fortum), cuja construção começou… em 2005.
Nas renováveis os tempos de construção são consideravelmente mais curtos. Muitas centrais solares demoram seis meses a um ano (ou dois nas de maior dimensão) a ser efetivamente construídas, mas a esse período soma-se o tempo de licenciamento antes de a construção arrancar. A morosidade do licenciamento tem sido uma das preocupações das empresas deste setor. Conforme o Expresso escrevia em julho, da capacidade adjudicada pelo Governo no leilão solar de 2019, só 10% estavam de facto operacionais ao fim de quatro anos. E no setor eólico por vezes os processos são ainda mais complexos. Veja-se o caso do parque eólico de Morgavel, em Sines, agora mais conhecido pela autorização de abate de 1821 sobreiros: o projeto nasceu de um dos lotes da Fase C do concurso eólico do Governo Sócrates, em 2009, o promotor não conseguiu licenciá-lo para a sua localização original, Torre de Moncorvo, e acabou por migrar para o litoral alentejano, onde será agora construído pela EDP Renováveis. Note-se, todavia, que, ao contrário de uma central nuclear, se trata de um projeto de 60 MW, sem um peso crítico para o sistema elétrico nacional (apesar da “imprescindível utilidade pública” que permitiu o abate de sobreiros).
Nas hídricas os prazos de construção são também desafiantes. O complexo hidroelétrico do Tâmega, com mais de 1,1 GW de potência (aqui sim, com uma escala considerável para o sistema elétrico nacional), nasceu do concurso de aproveitamentos hídricos do Governo Sócrates, em 2008, e a construção arrancou no final de 2014. No início de 2022 ficou pronto o primeiro grupo gerador. No próximo ano o complexo estará totalmente operacional, segundo a Iberdrola.
Apesar de uma boa parte dos projetos de energias renováveis em Portugal também terem derrapagens, o facto é que nos últimos três anos o país aumentou a sua capacidade instalada de fontes limpas em 3,2 gigawatts (GW), o equivalente à potência que terá a central nuclear Hinkley Point C e o dobro da capacidade que terá Flamanville 3. Dessa nova capacidade adicionada em Portugal, dois terços foram fotovoltaicas e um terço hídrica (Tâmega).
As derrapagens dos tempos de construção quase sempre se refletem num avolumar dos custos dos projetos. E esse é outro ponto crítico para a aposta nuclear: Flamanville 3 foi projetada com um custo de 3,3 mil milhões de euros, e a mais recente estimativa da EDF é de que acabe por custar 13,2 mil milhões de euros. Já o projeto Hinkley Point C deve ficar por 37 mil milhões de euros (quase 80% mais do que a projeção feita no arranque da construção).
O mais recente relatório do banco de investimento Lazard sobre os custos médios de diversas tecnologias indica que a energia nuclear é particularmente sensível ao custo do capital, sendo, entre várias soluções analisadas, a que vê o custo nivelado da eletricidade subir mais caso o custo de capital suba (que é precisamente o que está a acontecer na Europa desde o ano passado).
De acordo com o Lazard, considerando um custo médio ponderado de capital (WACC) de 7,7%, a tecnologia nuclear apresenta um custo nivelado de eletricidade (LCOE) de 180 dólares por megawatt hora (MWh), já bem acima dos 106 dólares da eólica offshore, dos 70 dólares das centrais de ciclo combinado a gás, dos 60 dólares das centrais solares e dos 50 dólares da eólica em terra. Mas se o WACC subir para os 10%, o LCOE da nuclear dispara 222 dólares por MWh (as restantes tecnologias também aumentam, mas de forma menos acentuada).
A agência governamental norte-americana EIA também analisou, no ano passado, o LCOE de diversas tecnologias nos Estados Unidos, com resultados diferentes. A energia nuclear surge com um custo nivelado de 88 dólares por MWh, abaixo da eólica offshore, mas claramente acima da eólica em terra e da energia solar fotovoltaica.
Um outro levantamento, da Bloomberg New Energy Finance, aponta uma banda de custos bastante ampla para novos investimentos em energia nuclear, que começa com um LCOE mínimo de 60 dólares por MWh na China, subindo para 109 dólares no Egipto, 194 na Finlândia e mais de 200 em França e no Reino Unido. Os números contrastam com os de um relatório de julho do regulador francês da energia, divulgado recentemente pelo portal Contexte, que aponta para o atual parque nuclear do país um custo na faixa dos 50 a 60 euros por MWh (embora a análise incida sobre centrais já fortemente amortizadas).
A metodologia LCOE é usada há anos como referência para comparar o preço a que um determinado projeto precisará de vender a sua eletricidade para conseguir gerar retorno para o investidor. Mas tem vindo a ser posta em causa pelos mais críticos da aposta nas renováveis, por não espelhar todos os custos que estas fontes acarretam, devido à sua intermitência e variabilidade, obrigando os sistemas elétricos a serem dotados de outras soluções para corrigir os desvios de produção renovável e responder aos desafios técnicos inerentes a uma maior penetração renovável na rede.
Há semanas, a Deutsche Welle lançou o documentário “Power failure in Germany: horror scenario or genuine possibility?”. Arranca com um testemunho sobre o disparo na venda de geradores para uso doméstico e pequenos negócios, devido aos receios de parte da população de que a transição energética possa levar a apagões na Alemanha, país que em poucos anos decidiu abandonar a energia nuclear e os combustíveis fósseis, apostando mais nas renováveis, para alcançar a neutralidade carbónica em 2045.
O documentário sublinha a incerteza que o sistema elétrico alemão enfrenta sobre a continuidade de abastecimento num contexto de maior penetração renovável, e menor disponibilidade de potência firme (como as centrais a gás e carvão e as nucleares). De facto, o crescimento da capacidade eólica e solar tornou mais complexa a gestão das redes elétricas, e a manutenção do equilíbrio perfeito entre oferta e procura a cada milissegundo.
O apagão que parte da Península Ibérica teve em julho de 2021 deveu-se a uma falha na rede elétrica francesa, provocando um desvio de frequência, e testando a capacidade dos operadores da rede (em Portugal a REN e a E-Redes) para rapidamente atuar e evitar um colapso generalizado da rede. O problema de então não foi culpa das renováveis, mas a variabilidade destas fontes tornará cada vez mais exigente a gestão da rede, e aumentará a urgência de dotar o sistema elétrico de respostas robustas (os vários países europeus são obrigados a ter planos de gestão de crise, como aqui contámos no ano passado). Esse planeamento futuro será ainda mais crítico à luz da decisão espanhola de até 2035 fechar as suas centrais nucleares, o que retirará da base diária de produção de eletricidade um volume relevante de energia. Conseguirá Espanha cobrir esses encerramentos com mais energia limpa, sem disrupções?
Esta quinta-feira, num artigo de opinião no “Jornal de Negócios”, Luís Todo Bom escreve em defesa da opção nuclear. “Precisamos que a comunidade técnica e científica, a única capaz de dar resposta a este enorme desafio da humanidade, desenvolva, rapidamente, centrais nucleares mais pequenas, mais seguras, mais baratas e mais rápidas de montar e pôr em funcionamento”, afirma o gestor e engenheiro. Juntar as expressões “rapidamente” e “centrais nucleares” numa mesma frase é de um otimismo assinalável.
As más experiências das novas centrais nucleares na Europa, com acentuadas derrapagens de prazos e de custos, tornam difícil acreditar que construir novos reatores seja a resposta de que o Velho Continente precisa no curto prazo, para responder ao rápido crescimento da nova capacidade solar e eólica em vários mercados. Mas o abandono do carvão e a intenção de, dentro de umas décadas, deixar também de queimar gás, obrigarão os decisores políticos a desenhar, atempadamente, uma estratégia para gerir, com razoável margem de segurança, a rede elétrica.
Olhando para Portugal e para a crónica rejeição da energia nuclear, tudo indica que nessa estratégia, além de mais centrais solares e parques eólicos no mar, poderão entrar baterias, centrais de ciclo combinado alimentadas a hidrogénio verde e já não a gás natural, reforços da capacidade de armazenamento hídrico, com barragens com bombagem reversível, e incentivos a uma gestão flexível da procura. Mas o tempo corre. E, especialmente no setor elétrico, a próxima década é já amanhã. Não é só o quintal de cada um que está em questão. E com cascas de banana pelo caminho o exercício é ainda mais desafiante.
DESCODIFICANDO:
BTN. A rede em “baixa tensão normal” designa a parte da rede elétrica que abastece os clientes com potências mais reduzidas, até 41,4 kVA, o que inclui os consumidores domésticos e uma parte de pequenos negócios e escritórios. A rede é concessionada e operada em Portugal Continental pela E-Redes (excepto em alguns municípios, com concessões locais), que tem também as concessões em média e alta tensão. A rede de muito alta tensão, que abrange as linhas de 150 kV para cima e outras infraestruturas associadas, é operada pela REN.
E VALE A PENA LER:
A Eurelectric, associação europeia do setor elétrico, acaba de lançar a edição deste ano do “Power Barometer”, onde reitera a necessidade de reforço das redes, para que a Europa aumente o nível de eletrificação do consumo energético. O diagnóstico e a análise da Eurelectric podem ser consultados aqui.
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