Essas eleições tinham muitas novidades. Quantas querem?
1) Pela primeira vez, Mário Soares não era candidato a primeiro-ministro, embora fosse o cabeça de lista do PS por Lisboa;
2) O candidato do PPD/PSD a primeiro-ministro era um quase desconhecido, algarvio, que dizia (mas não era verdade) ter ido fazer a rodagem do carro a um congresso do seu partido, saindo de lá eleito presidente do mesmo – Aníbal Cavaco Silva; era o número um por Lisboa, à frente de Francisco Balsemão e de Rui Machete;
3) O candidato a primeiro-ministro do PS não era secretário-geral do PS, mas tinha sido designado para essa contenda pela Comissão Política socialista. Aliás, era o número três pelo círculo do Porto, depois de históricos como António Macedo e Mário Cal Brandão;
4) Havia um partido novo, que fora inspirado pelo então presidente da República, general Ramalho Eanes, o qual era presidido por um então desconhecido Hermínio Martinho, primeiro candidato por Santarém;
5) O CDS era liderado não por Freitas do Amaral, como o fora até 1983, mas por Lucas Pires que, pela segunda vez, puxava pelos centristas (elegeu 22 deputados e na eleição seguinte, já com o partido liderado por Adriano Moreira, passou para quatro – de onde lhe ficou a designação de partido-táxi).
Penso que já chega de novidades. Mas falta aquela que aqui me trouxe: o PS pedia 43% para Governar. E quase os ia tendo… se cada voto valesse por um pouco mais do que dois. O PS arrecadou o pior resultado da história (vinha do ‘Bloco Central’, aliança com o PSD) e ficou-se pelos 20,77%. O PRD, o tal de Hermínio Martinho, patrocínio presidencial e de dissidentes do PS, alcançou 17,92% e o vencedor foi o tal algarvio, Cavaco Silva, que formou um governo minoritário depois de ter 29,87% dos votos. O único Governo até agora com menos de 30%, com pouco mais de um terço dos deputados e representando apenas 1,7 milhões de eleitores.
Mas isto é história. História tão antiga que, para terem uma ideia, dos deputados do PS eleitos por Lisboa, metade já faleceu (e alguns eram bem mais novos que o número um, Mário Soares) ou, visto de outra perspetiva, o PPD/PSD elegeu Duarte Lima por Bragança, António Capucho por Faro e Rui Oliveira e Costa por Lisboa… Outros tempos!
Mas desloquemo-nos para Braga e para uma campanha que andava a correr mal – a do PS. Em Braga o cabeça de lista era o já falecido jornalista Raul Rego, antigo diretor do jornal ‘A República’ e o número dois, nada mais, nada menos, do que António Vitorino. Sim é o mesmo!
Comício, com um Almeida Santos (o candidato a primeiro-ministro) a arengar no seu tom de Coimbra (não é por acaso que canta bem o fado da terra), seguindo-se um fogoso e impetuoso Vitorino, no fulgor dos seus 28 anos que arranca aplausos apoteóticos.
Almeida Santos, entusiasmado, pega no microfone e diz:
“Que grande político vai ser António Vitorino!”
A risada – por motivos que se imaginam e têm a ver com a estatura impressionante do então candidato por Braga, foi geral.
E o que é mais é que Almeida Santos se enganou. Apesar da reconhecida inteligência e brilhantismo (que estão longe de ser lenda, diz aqui quem o conhece bem), Vitorino nunca se dedicou assim tanto à política. Foi ministro de Guterres, tendo abandonado o posto por uma questão de impostos em que era ele próprio quem tinha razão; foi Comissário Europeu e depois retirou-se para a advocacia, onde ficou até hoje, recusando mais andanças e lideranças no PS do que aquelas que hoje tem.
Citando um seu camarada, que por me ter dito a frase em privado não posso dizer quem é, Vitorino é daqueles políticos cujo passado fazia, de facto, augurar um grande futuro!