O último livro de José Sócrates intitula-se "Só Agora Começou" (ed. Actual). Escrito em 2018, quando a instrução do processo-crime onde é arguido o ex-primeiro ministro ainda não tinha começado, foi publicado há dias, já depois de o juiz Ivo Rosa emitir a sua decisão de pronunciar Sócrates por crimes de branqueamento de dinheiro e falsificação de documentos, considerando ainda que houve outros, de corrupção, que já prescreveram. Uma decisão à luz da qual muitos leitores inevitavelmente julgarão o texto, e vice-versa.
Outra dissonância temporal que afeta a leitura é a incorporação de textos redigidos na época em que Sócrates estava preso em Évora. Esses fragmentos, intercalados com aqueles que constituem o grosso do texto, são a certa altura justificados pelo autor: "Julgo que ficam bem, com uma letra mais pequena, como citações. Fica clara a intenção da dupla voz: uma de antes e uma de depois; uma, contemporânea dos acontecimentos, outra, atual. Talvez estejam longos demais, tenho de pensar nisso, mas parece-me boa ideia incluí-los. Gosto deles: são textos de ação".