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Naufrágio na Sicília: a causa foi realmente a tempestade? Pode a tripulação ter tomado decisões erradas?

O diretor-geral do grupo a que pertence a construtora do iate não poupou críticas à tripulação após afirmar que o barco era “inafundável”, desde que não se enchesse de água. Um comandante naval entrevistado pelo Expresso indica que várias decisões da tripulação, como a colocação da âncora ou, até, a hora a que ocorreu a tempestade, podem ter ditado o naufrágio que provocou seis mortes e um desaparecimento

EPA/ IGOR PETYX

Uma tempestade violenta e inesperada é apontada como a principal causa do naufrágio do iate ‘Bayesian’ na ilha italiana da Sicília, mas ao quarto dia de buscas surgem detalhes sobre como estaria o navio no dia do acidente e começam a surgir dúvidas sobre se foi feito tudo para evitar o afundamento de “um dos barcos mais seguros do mundo”.

James Catfield, capitão neozelandês do navio, já foi ouvido durante duas horas pela procuradoria de Termini Imerese na tentativa de reconstituir o que aconteceu antes e após o acidente, avança a agência italiana ANSA. A questão estará em apurar se o afundamento foi fruto de um erro humano ou da tempestade.

O iate de 56 metros de comprimento e dotado de um mastro com mais de 70 metros de altura afundou-se em poucos minutos, enquanto outros barcos mais pequenos que estavam nas imediações resistiram com poucos ou nenhuns danos. Após sair do hospital, o capitão disse apenas que não a tempestade não era esperada.

O patilhão móvel do barco, um apêndice do casco, em forma de barbatana, que lhe confere estabilidade, estava parcialmente levantado a quatro metros, em vez dos sete metros e meio máximos, indicaram as primeiras observações feitas pelos mergulhadores, bombeiros e guarda costeira. Este mecanismo age como um “contrapeso para contrariar o centro de gravidade”, explica ao Expresso João Ciriaco, comandante do histórico veleiro Santa Maria Manuela. O mastro era extremamente alto, explica. Se estivesse com as velas abertas, a situação seria mais grave, porque o centro de gravidade ficaria mais elevado, o que “tornaria o navio mais instável e fácil de adornar ou ser virado por uma força externa”.

É provável que o patilhão estivesse parcialmente levantado por o iate estar numa zona com pouca profundidade, admite o antigo docente da Escola Superior Náutica Infante D. Henrique. Quanto mais fundo estiver este mecanismo, mais o barco se tornaria um “sempre em pé”, ou seja, apesar de inclinar regressaria rapidamente ao seu estado normal.

Como o navio estava fundeado seria mais improvável a sua submersão, mas o comandante ressalva que um dos aspetos mais importantes nestas situações é o comprimento da amarra, ou seja, o cabo que segura a âncora. “Se estavam com pouco comprimento de amarra, estariam para uma ondulação ou um vento fraco. Se o vento repentinamente sopra com muita intensidade, a amarra não tem capacidade para segurar o navio” e a âncora começa a arrastar-se “até parar o vento ou até bater numas pedras, por exemplo”, explica. A 800 metros da costa, há a probabilidade de que, nesta eventualidade, o iate tenha batido no fundo, o que compromete totalmente a estabilidade e provoca o afundamento.

A altura do mastro também não terá ajudado, por modificar os pesos da embarcação, ou seja, coloca mais pressão no topo. “A embarcação está a flutuar e, se eu colocar peso em cima, tem tendência a virar até bater com o mastro na água”, descreve João Ciriaco. Além disso, como referido, o patilhão não estava totalmente ativado para gerar mais equilíbrio.