A cerca de três meses das eleições regionais na Indonésia, tensões entre a justiça e o poder político levaram o povo a sair à rua para mostrar o seu descontentamento. Os manifestantes contestavam a tentativa do parlamento em reverter duas decisões tomadas esta semana pelo Tribunal Constitucional. No seguimento dos protestos, os planos dos deputados para alterarem as regras eleitorais foram postos de parte.
Quais foram, afinal, as decisões do Tribunal Constitucional? Uma reduziu a percentagem de representatividade nas assembleias regionais exigida aos partidos para apresentarem um candidato às eleições, dizendo que manter a percentagem anterior de 20% “é o mesmo que impor uma injustiça intolerável a todos os partidos políticos a participarem nas eleições”. O resultado foi visto como abrindo a possibilidade de o político da oposição Anies Baswedan concorrer ao cargo de governador de Jakarta. A outra decisão manteve o requisito de que os candidatos tenham pelo menos 30 anos, o que exclui da corrida Kaesang Pangarep, o filho mais novo do Presidente Joko Widodo, explica o ‘The Jakarta Post’.
As mudanças legais que o parlamento planeava aprovar para anular a decisão do tribunal foram vistas como uma forma de reforçar a influência do Presidente Joko Widodo, explica a Reuters. Segundo o ‘The Jakarta Post’, apenas um dos partidos se opôs à revisão da lei. Os receios de uma crise constitucional instalaram-se. Widodo termina o seu segundo mandato em outubro e está de saída do cargo – mas a sua família vai continuar próxima do poder. O sucessor para o cargo já foi eleito. Prabowo Subianto venceu as presidenciais acompanhado por Gibran Rakabuming Raka, o filho mais velho de Widodo, que vai assumir a vice-presidência.
“É crucial maior pressão por parte da sociedade civil para que esta crise constitucional não continue”, observou Ika Idris, co-directora do Monash Data & Democracy Research Hub. Idris descreveu por escrito ao Expresso que as ações da Câmara dos Deputados são vistas como “um passo no sentido de alterar as atuais declarações e cláusulas da constituição” e que medidas adicionais da Câmara ou outra entidade governamental podem gerar uma crise constitucional.
Registaram-se protestos em várias cidades e as autoridades chegaram a disparar gás lacrimogéneo, noticiou o ‘The Jakarta Post’. A revista local Tempo descreveu que as forças policiais agrediram e detiveram manifestantes que tentaram entrar à força no complexo parlamentar, em Jakarta. Entretanto, o porta-voz do parlamento da Indonésia indicou que as mudanças às regras eleitorais não serão adotadas durante o mandato do atual governo e disse à Reuters que as deliberações vão continuar no próximo período de sessões do parlamento, o que significa que não há mudanças para as eleições regionais deste ano.
O ‘The Jakarta Post’ descreveu que, para além das críticas nas ruas, se deu uma onda de críticas online com a publicação de cartazes com a expressão “alerta de emergência” acima da águia nacional.
“Apesar de não terem circulado sondagens atuais sobre a popularidade [do Presidente Joko Widodo], os utilizadores de redes sociais têm mostrado um enorme sentimento negativo em relação a ele, argumentando que é o Pinóquio de Java, que é mentiroso”, indicou Idris, acrescentando que “a democracia do país é vista como estando em crise, uma vez que a transparência do processo legislativo é brutalmente distorcida”.
Em abril, a popularidade de Widodo atingiu o seu valor mais alto, noticiou na altura o ‘The Jakarta Post’. Uma sondagem do Indikator Politik Indonesia mostrava que a sua presidência contava com a satisfação de 77% dos inquiridos.